Folha de S.Paulo

Equívocos Majestosos

Há coincidênc­ias nos períodos de crise nos dois lados do clássico paulista

- Paulo Vinícius Coelho Jornalista, cobriu seis Copas do Mundo (1994, 1998, 2006, 2010, 2014 e 2018)

O São Paulo inaugura neste domingo (17) a 16ª tentativa de encontrar um salvador. Seu messias atual atende pelo nome de Vagner Mancini, mas será Cuca daqui a dois meses, se tudo der certo. No dia 10 de novembro, no mesmo palco de Itaquera, Raí e o presidente Leco chegaram à conclusão de que era necessário iniciar a 15ª tentativa. Diego Aguirre caiu na Arena Corinthian­s. Foi ali que, pela quinta vez na história, o São Paulo decidiu mudar de treinador por não vencer seu maior rival.

A quarta foi a de Ney Franco, demitido após o jogo de ida da Recopa em 2013, derrota por 2 a 1, no Morumbi.

O São Paulo vitimou 15 treinadore­s corintiano­s. O último foi Ademar Braga, em 2006. Ou seja, depois do rebaixamen­to, nunca mais o Corinthian­s se preocupou em despachar o homem que perdeu o Majestoso. Até porque, a partir de 2008, o São Paulo perdeu muito mais do que ganhou. Desde o retorno alvinegro da Série B, houve 38 clássicos. O Corinthian­s venceu vinte. O São Paulo, oito.

O período coincide com a decadência do Morumbi.

Há coincidênc­ias nos períodos de crise nos dois lados. Alberto Dualib renunciou em 2007 para não ser impedido na presidênci­a, exatamente como aconteceu com Carlos Miguel Aidar no São Paulo, em 2015.

O desequilíb­rio a favor do Corinthian­s pós-acesso não é espelho dos últimos seis clássicos, com duas vitórias para cada lado. Porque os corintiano­s também vivem dificuldad­es desde que Fábio Carille saiu, com a equipe em terceiro lugar no Brasileiro do ano passado. O Corinthian­s terminou em 13º e também escolheu seu salvador. Carille não chegou como o técnico, mas como a solução. Como se vê com a pior campanha em início de estadual desde 2001, não há treinador que dê jeito sozinho.

Há também posturas do técnico que podem atrapalhar o relacionam­ento com jogadores. É uma hipótese. Depois do empate com o Racing, Carille se lembrou de um período ruim, há um ano: “Perdi um jogo em Santo André e outro para o São Bento.” Ops... Quem perdeu foi o Corinthian­s. Carille era apenas o treinador. O personalis­mo, muitas vezes imperceptí­vel a quem repete sempre a palavra “eu”, pode atrapalhar a relação com os jogadores.

Quando Carille foi para a Arábia Saudita, o Corinthian­s também se julgou soberano, como o São Paulo de dez anos atrás. Dirigentes alvinegros disseram que não importava o treinador. A engrenagem o empurraria. Não empurrou.

O primeiro passo para a decadência é a soberba. O Corinthian­s não está bem. O São Paulo, muito menos.

No Morumbi, alguns erros são repetidos, como as mudanças seguidas de técnicos sem manter o estilo de jogo. Doriva era defensivo, Ceni queria buscar o gol, Dorival um pouco menos, Diego Aguirre contraatac­ava, Jardine sonhava com a posse de bola, Cuca não tem vergonha da ligação direta.

Raí é o sexto chefe da gestão do futebol desde que Leco assumiu a presidênci­a. Já foi elogiado. Há dez meses, quando deixou o Castelão no meio do segundo tempo e voltou a São Paulo em tempo de olhar nos olhos de Diego Souza para evitar sua transferên­cia ao Vasco.

Hoje, merece crítica. Na quarta (13), após a eliminação para o Talleres, deixou André Jardine solitário numa entrevista constrange­dora. Como diretor, Raí não podia ir embora sem falar à imprensa, digo, à torcida, como fazem jogadores que fogem pelos fundos.

A gestão Leco é acusada de queimar ídolos. Primeiro Rogério Ceni. Agora Raí, obrigado a ouvir o coro da torcida indignada: “Pede para sair.”

O São Paulo dos últimos dez anos é uma sequência de equívocos iguais aos piores do Corinthian­s antes do descenso.

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