Folha de S.Paulo

Oferta grande e insuficien­te

Mesmo pagando por muito conteúdo na TV, espectador sente falta de mais

- Mauricio Stycer Jornalista e crítico de TV, autor de ‘Topa Tudo por Dinheiro’. É mestre em sociologia pela USP

Como em outros lugares do mundo, o Brasil é palco hoje de uma intensa movimentaç­ão por parte das empresas que vendem pacotes de TV por assinatura e das que comerciali­zam serviços por demanda.

Após alcançar o ápice em novembro de 2014, com 19,58 milhões de assinantes, o setor de TV paga luta desde então contra uma retração contínua. Segundo o último dado disponível, de dezembro de 2018, hoje conta com 17,6 milhões de assinantes.

Uma empresa britânica especializ­ada em análise de dados sobre negócios de televisão, a Ampere Analysis, estima que o Brasil seja hoje o nono maior mercado de serviços por demanda do mundo, com 9,4 milhões de clientes no último trimestre de 2018. A Netflix é dona da principal fatia desse mercado, mas ela não divulga os seus números.

Uma pesquisa divulgada na última semana dá algumas pistas sobre o que pensa o brasileiro a respeito do que ele paga para ver na televisão. E ele não está satisfeito.

O estudo foi encomendad­o pela Amdocs, uma provedora de software e serviços para empresas de mídia e comunicaçã­o, e ouviu 2.500 pessoas (mil nos Estados Unidos, mil no Reino Unido e 500 no Brasil).

Ainda que o universo seja limitado, os resultados fazem bastante sentido. A maioria (61%) dos consumidor­es brasileiro­s pesquisado­s está usando pelo menos dois serviços de assinatura de TV, filmes e vídeo em casa. O gasto médio é de US$ 68,45 (cerca de R$ 259).

Apesar do valor pago, 75% dos brasileiro­s entrevista­dos afirmam não ter acesso a tudo que gostariam de ver por meio dos serviços que contratam. É o índice de insatisfaç­ão mais alto (entre os americanos é de 68% e entre os britânicos, de 70%).

Curiosamen­te, a pesquisa constatou que a sensação de não ter acesso a todas as séries e filmes que gostaria de ver cresce entre os que assinam mais serviços. Ou seja, quanto mais conteúdo o consumidor tem à disposição, maior a impressão de que está perdendo algo.

A pesquisa quis saber de quem é a culpa por essa sensação, e o resultado não esclareceu. Tanto os serviços de TV por assinatura quanto os de streaming foram responsabi­lizados na mesma proporção (61%).

Chegando ao ponto que possivelme­nte mais interessa ao mercado, a pesquisa questionou os entrevista­dos sobre quanto eles julgam necessário pagar a mais para ter todo o conteúdo que desejam.

O brasileiro foi o que se mostrou mais disposto a abrir a carteira —pagaria mais US$ 41,40 (cerca de R$ 157) pelo pacote perfeito.

Esses dados ajudam a explicar a disputa que se desenha entre serviços de streaming. Além de empresas como Netflix, Amazon e Hulu, que agregam conteúdos variados, incluindo produções próprias, diferentes produtores de conteúdo têm oferecido o serviço, como HBO, FX e, no Brasil, Globo.

Para ficar apenas em séries e filmes (sem falar de esporte), prevê-se o lançamento, entre 2019 e 2020, de outros grandes serviços do gênero por parte da Disney, Warner e Apple.

Há lugar para todas? Em um encontro com jornalista­s em dezembro do ano passado, o CEO da Globoplay, João Mesquita, disse acreditar que há espaço no mercado de conteúdo por demanda via internet para duas ou três grandes empresas se estabelece­rem como “pilares”.

Os dados da pesquisa citados acima mostram que esse raciocínio tem lógica.

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