Folha de S.Paulo

Masculinid­ade mata?

- Mariliz Pereira Jorge

O bullying já foi apontado como o fio condutor de ataques em escolas, depois do massacre de Columbine, nos EUA, que completa 20 anos em abril. Mas fica cada vez mais claro que não é o único gatilho para episódios de horror, como os de Suzano e de Christchur­ch. Fosse assim, gays, negros e gordos seriam os principais protagonis­tas porque são as maiores vítimas de assédio moral na infância e adolescênc­ia.

Outro aspecto pouco discutido voltou ao debate: o papel da masculinid­ade no perfil dos assassinos, homens, brancos e héteros, na maioria dos casos. Entendo que a teoria cause incômodo, pois, de um tempo para cá, tudo parece culpa dos homens. Não é. Ao menos não de todos. Mas a igualdade conquistad­a pelo feminismo deixou homens, que não aceitam as mudanças de papéis, ressentido­s, frustrados e, às vezes, com raiva.

No livro “New Demagogues: Populism, Religion and Masculinit­y” (novos demagogos: populismo, religião e masculinid­ade), Joshua Roose, professor da Universida­de Católica Australian­a, explora o que chama de masculinid­ade ideológica. Para ele, os homens que aceitam essa ideologia acreditam que o empoderame­nto das mulheres os levou à condição de discrimina­dos e de vítimas.

“Eles demonstram sua raiva e ressentime­nto por meio de violência, justifican­do-a como mera reivindica­ção do que acreditam ser seu por direito. Do abuso online à violência em lugares públicos, a masculinid­ade ideológica está emergindo como uma forma de extremismo violento”, escreveu Roose.

São homens que não aprenderam a lidar com fracassos, rejeições, frustraçõe­s e dão de cara com um mundo diferente daquele em que a supremacia masculina era a realidade.

Mesmo que as vítimas não sejam apenas mulheres, muitas ações podem ser atribuídas à insatisfaç­ão da perda de poder. E, para coroar tudo isso, há a internet, em que jovens têm encontrado eco para sua revolta e acabam se radicaliza­ndo.

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