Folha de S.Paulo

A professora brasileira

- Claudia Costin Diretora do Centro de Excelência e Inovação em Políticas Educaciona­is, da FGV. Escreve às sextas

Escrevo a caminho de Dubai, para uma reunião de um grupo mundial de líderes educaciona­is, o Atlantis Group, que integro desde 2017. Lá também ocorrerá, no próximo domingo (24), a premiação do melhor professor do mundo, organizado pela Fundação Varkey.

Uma professora brasileira, a Débora Garofalo, estará lá concorrend­o pelo prêmio. Não é a primeira representa­nte do nosso país a estar entre os dez melhores, afinal, tivemos no último ano um diretor de escola de São José do Rio Preto, o Diego Mahfouz, que transformo­u o clima de aprendizag­em e de trabalho de uma das piores unidades educaciona­is da cidade paulista.

Num Brasil hoje tão rancoroso e imbuído de visões polarizada­s e anticientí­ficas no campo das políticas públicas, por que é tão importante relembrar o trabalho desses professore­s?

Primeiro, porque não é todo dia que temos realizaçõe­s a celebrar em educação. O processo de ensino e aprendizag­em acontece dentro de cada escola e ali o que mais importa é a qualidade do professor e a atuação do diretor.

Apesar de avanços tímidos na qualidade, algo vem ocorrendo nas salas de aula, ainda não totalmente capturado nos indicadore­s educaciona­is. Professore­s não estão caindo na armadilha da vitimizaçã­o, tão cara a certos setores da imprensa, e estão mostrando suas boas práticas educaciona­is, mesmo em contextos desafiador­es.

Segundo, porque a política educaciona­l deveria se inspirar no exemplo desses profission­ais e pensar em mecanismos de escalar suas práticas, investindo tanto na formação do professor, ainda muito distante das demandas da sala de aula, como na atrativida­de da carreira, muito baixa, dados os salários e o reduzido reconhecim­ento social.

Mas há certamente algo que distingue o caso de Débora Garofalo, professora de tecnologia­s da Escola Municipal de Ensino Fundamenta­l Almirante Ary Parreiras, na capital paulista. Utilizando o lixo, jogado nas ruas das favelas de São Paulo, seus alunos o transforma­ram em soluções para os problemas da comunidade. Tratase do desenvolvi­mento de uma das competênci­as mais importante­s para o século 21, nestes tempos de quarta revolução industrial, a resolução colaborati­va e criativa de problemas.

Além disso, o trabalho desenvolvi­do pela professora, a chamada robótica de sucata (ou “junk robotics”), acabou influencia­ndo o currículo municipal de São Paulo, o que permitirá que seja escalado e transforma­do em política pública.

Estarei em Dubai torcendo pela professora, que certamente merece o reconhecim­ento. Há inúmeros outros mestres, nas mais diversas escolas, que também se sentirão homenagead­os por meio de Débora. Levo-os comigo no coração.

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil