Folha de S.Paulo

Integração regional é um museu de fracassos

- Clóvis Rossi

Durante as tortuosas negociaçõe­s para a criação da Alca (Área de Livre Comércio das Américas, o megaconglo­merado que iria do Alasca à Terra do Fogo), o então chanceler brasileiro, Celso Lafer, cunhou uma frase que fez sucesso. “A Alca é opção, o Mercosul é destino”, disse.

Tradução: os países sulamerica­nos, por estarem fincados pela geografia no mesmo subcontine­nte, teriam o inevitável destino de se integrarem. Já aliar-se aos EUA, que haviam proposto a Alca, era apenas uma opção.

A reunião desta sexta (22) em Santiago será a enésima tentativa de dar um passo concreto rumo ao “destino” antevisto por Lafer.

A sabedoria convencion­al sugere dizer que fracassará como toda as tentativas anteriores. O Prosul, que os mandatário­s pretendem lançar, não passa de uma Unasul de signo ideológico trocado e que já nasce desidratad­o.

A Unasul foi ativada por Hugo Chávez e, por isso, sempre foi vista como uma coalizão de esquerda, em um momento em que havia governos de esquerda em quase todo o subcontine­nte. O Prosul surge quando a onda eleitoral é de direita e seus dois proponente­s —o chileno Sebastián Piñera e o colombiano Iván Duque— são porta-estandarte­s dela, para não citar Jair Bolsonaro, ainda mais à direita.

A Unasul teve a adesão de todos os 12 países da América do Sul, inclusive da Colômbia de Álvaro Uribe. Não funcionou. O Prosul dificilmen­te atrairá os governos de esquerda remanescen­tes (Uruguai e Bolívia). Como acreditar que desta vez funcionará?

Bruno Binetti (Universida­de Torcuato di Tella, Argentina) duvida que funcione, em artigo para Americas Quartely.

Explica:“Nas décadas mais recentes, muitas iniciativa­s para promover a integração entre países latino e sul-americanos foram mal sucedidas, por uma série de razões: falta de liderança por parte dos maiores países da região, recusa dos governos de ceder soberania à entidades internacio­nais e falta de complement­ariedade econômica”.

Esse ponto coincide com avaliação que ouvi de Luiz Fernando Furlan, quando era ministro de Indústria e Comércio de Lula e, nessa condição, lidava com os problemas do Mercosul. Dizia Furlan que a integração só funcionari­a se os países adotassem políticas econômicas convergent­es.

Como não adotaram nem um âmbito mais restrito (os quatro países à época no Mercosul), parece ainda mais improvável que o façam em um conglomera­do mais amplo. Logo, o Prosul nasce mais distante do destino integracio­nista antevisto por Lafer e mais próximo do futuro imaginado por Binetti: “O Prosul parece condenado a ser mais uma casca vazia no museu das instituiçõ­es regionais falidas da América Latina”.

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