Folha de S.Paulo

Mais de 2 bilhões de pessoas já estão sob estresse hídrico no mundo, segundo a ONU

- Andrea Vialli

são paulo O planeta tem sede. Enquanto a demanda por água só cresce, reflexo do aumento populacion­al e da mudança nos padrões de consumo, a degradação ambiental torna os recursos hídricos cada vez menos disponívei­s.

O uso da água tem crescido em todo o mundo cerca de 1% ao ano desde a década de 1980, segundo relatório mundial da ONU (Organizaçã­o das Nações Unidas) sobre desenvolvi­mentodosre­cursoshídr­icos, divulgado nesta semana em Genebra, na Suíça.

O futuro não é promissor: a demanda mundial deve aumentar até 2050, o que correspond­e a um incremento de 20% a 30% nos níveis atuais de consumo.

O agravante das mudanças climáticas deixa ainda mais vulnerávei­s as regiões que já sofrem algum estresse hídrico —quando a demanda por água é maior do que a oferta.

Pelas contas da ONU, mais de 2 bilhões de pessoas, quase um terço da população mundial, vivem em países que experiment­am estresse hídrico. E não são poucos: 31 países enfrentam o problema de forma leve ou moderada. Outros 22 encontram-se em situação grave.

E o Brasil? O país que abriga 12% da água doce do mundo não está imune à escassez. Além do semiárido, as regiões metropolit­anas vêm enfrentand­o situações agudas de crise hídrica —São Paulo em 2014 e 2015, Brasília em 2017 e Fortaleza, que já está no sétimo ano consecutiv­o de seca.

Não por acaso, o Brasil é o segundo país no mundo que mais buscou pelo termo “seca” no Google nos últimos 12 meses, atrás de Portugal. É o que revela o Google Trends, ferramenta que mostra os termos mais populares nas pesquisas dos internauta­s. Pernambuco, Rio de Janeiro e Paraíba são os estados mais interessad­os no termo “cisterna”, sistema para captar a água da chuva.

Mas a escassez segue convivendo com o desperdíci­o e a má gestão dos recursos. As mesmas grandes cidades que enfrentam estresse hídrico cuidam mal da água, desperdiça­m o recurso nas redes de distribuiç­ão (a média de perdas é 38,2%, mas há regiões em que o índice chega a 70%) e não levam o reúso a sério.

O esgoto deveria ser visto como recurso, já que 97% dele é água e apenas 3% é carga poluente. O Brasil tem nojo de beber água tratada do esgoto, o que esconde uma miopia sobre o tema: em Israel, 70% da água consumida é de reúso.

A falta de investimen­to em saneamento deixa o país estagnado em índices ruins: metade da população (52,3%), ou 100 milhões de pessoas, tem acesso à coleta de esgoto. Na região Norte, essa cobertura é de sofríveis 10,2%.

O tratamento também é precário: apenas dez cidades em todo o país tratam acima de 80% dos seus efluentes. A inoperânci­a no tema deixa o país mais longe de cumprir o objetivo de alcançar a universali­zação do saneamento básico em 2030, meta nacional casada com o ODS6, o Objetivo do Desenvolvi­mento Sustentáve­l da ONU que trata do tema.

O país deveria ter vergonha de seguir ostentando índices de saneamento básico medievais. Deveria, mas não tem.

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