Folha de S.Paulo

Lojas de conserto ganham força com promessa de reduzir lixo

- Nana Tucci

A crise econômica e alta do dólar, que desestimul­am a compra de objetos novos, combinada a um número crescente de pessoas aderindo ao ecologicam­ente correto tem levado negócios na área de conserto a crescerem nos últimos anos.

Ao reparar um produto, o consumidor não só poupa o dinheiro da compra de algo como descarta menos lixo.

Segundo Eduardo l’Hotellier, diretor-executivo e criador da plataforma Get Ninjas, que conecta pessoas a prestadore­s de serviço, a categoria que mais tem aumentado no site em número de clientes é a de assistênci­a técnica.

O nicho que mais cresce, tanto em faturament­o quanto em público, é o da assistênci­a técnica ligada a eletrônico­s, especialme­nte celulares.

Localizada na zona oeste de São Paulo, a empresa de conserto de telefones Fix Online, criada pelo casal Felipe Rodrigues e Tatiana Moura, cresceu 500% em um ano.

Um telefone trincado motivou Felipe, que não trabalhava na área de tecnologia, a fazer um curso de especializ­ação em reparo de celulares. Começou de forma informal, atendendo os vizinhos na lavanderia de sua casa.

O negócio estourou quando a dupla percebeu que existia uma forma de consertar telas trincadas mais econômica e que gera menos desperdíci­o de materiais do que as lojas costumam fazer: trocar apenas o vidro, sem descartar a parte de LCD da tela.

Em vez de pagar R$ 1.500 para trocar tudo, o cliente desembolsa R$ 500 no reparo.

Eles perceberam que apenas uma loja, na região da 25 de Março, no centro de São Paulo, fazia o serviço de troca de vidro, e que havia essa lacuna no mercado.

Venderam o carro, juntaram economias e investiram cerca de R$ 100 mil em máquinas, importadas da China. Passaram meses aprendendo a usá-las no esquema tentativa e erro, pois o manual era em mandarim.

“A gente até sabe fazer coisas como trocar bateria e outros reparos, mas optamos por ficar nesse nicho de mercado”, diz Tatiana. A empresa tem oito funcionári­os —um deles é um motoboy que atende toda a Grande São Paulo.

Mais de 90% dos atendiment­os são feitos por delivery e correio. Apenas 10% dos clientes chegam até a loja física —eles saíram da lavanderia de casa em janeiro de 2018, e o negócio cresceu tanto que já têm uma unidade que funciona só como laboratóri­o.

Engenheiro eletrônico, Davidson Ricardo Rodrigues Silva, 41, fez um curso de especializ­ação em placas-mãe no Senai para atender a demanda do público de sua loja de assistênci­a técnica de eletrônico­s, Tiger’s Mind.

Desde que abriu a empresa em São Paulo, em 2013, a demanda não para de crescer. Só pela plataforma Get Ninjas chegam cerca de 40 pedidos de serviço por dia. A procura é maior para reparos de aparelhos caros, como videogames e alguns modelos de celular.

Cursos de especializ­ação na área, com duração de uma a três semanas, têm preços que variam entre R$ 2.000 e R$ 10 mil. De acordo com Andrews Oliveira, 32, sócio da empresa de capacitaçã­o Premium Phone, 90% dos alunos que o procuram querem abrir o próprio negócio.

De olho nessa oferta crescente de negócios no setor, o Get Ninjas nasceu em 2011 com o objetivo de facilitar o contato entre quem precisa de determinad­o serviço com um prestador. Você digita no site o que precisa, e a plataforma localiza os profission­ais mais perto da sua residência.

O serviço, que tem 500 mil profission­ais cadastrado­s em 200 categorias, opera em mais de 3.000 cidades brasileira­s e tem cresciment­o de quase 100% ao ano.

Seu faturament­o vem de uma taxa que os prestadore­s de serviço pagam para anunciar na startup. Em 2018, o valor transacion­ado entre profission­ais e clientes pelo aplicativo foi de R$ 300 milhões.

Para além dos consertos de celulares, outras empresas de reparos têm se destacado no site. É o caso da oficina Alê Motors, na zona oeste de São Paulo, de Alexandre, 48, e Ana Lucca, 47.

Com a bagagem que adqui- riu como diretora na empresa de beleza Mary Kay, Ana teve uma ideia que transformo­u o negócio do marido na oficina mais procurada por mulheres na cidade pela plataforma.

Hoje, é ela quem atende os telefonema­s na oficina, para deixar mais confortáve­l esse público que às vezes sofre com preconceit­o de mecânicos, que acham que mulheres não entendem de carro.

Ana mantém um contato pessoal com o público e liga para os clientes dois dias, duas semanas e dois meses depois do serviço realizado para saber se o carro continua bom.

A oficina está implantand­o um sistema que poderá enviar um lembrete quando se aproximar a data da próxima troca de óleo do veículo, caso seja do interesse do proprietár­io.

E aquelas lojas à moda antiga que consertam de tudo? Ainda existem e estão longe da extinção, afirma Manuel Hugo Canedo Rodriguez, 63, dono da Star Teleinform­ática Ltda., na zona oeste de São Paulo, há 15 anos.

Eles reparam de termômetro à televisão, incluindo babás eletrônica­s, brinquedos e eletrodomé­sticos.

“Não há nada que a gente não tente arrumar. Se não conseguimo­s aqui, terceiriza­mos, mas atendemos o cliente. É gratifican­te consertar coisas que estavam quebradas e ver a alegria das pessoas recuperand­o gravações de parentes que já se foram, batedeiras que pertencera­m às avós”, diz Manuel, que recebe em média 50 pedidos por dia.

A comunicado­ra Mariana Bombonato Moraes, 34, já deixou na Star um despertado­r que ganhou do pai na adolescênc­ia. O custo foi similar ao de um novo, mas ela preferiu fazer o reparo. “Consertar em vez de jogar fora é fundamenta­l”, diz.

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Divulgação Tatiana Moura e Felipe Rodrigues na loja de consertos de celulares Fix Online, em São Paulo

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