Folha de S.Paulo

Ex-OAS delatou propina de R$ 1 milhão a Rodrigo Garcia

Léo Pinheiro afirmou, ao negociar acordo, que autorizou repasse a Rodrigo Garcia em 2007 vinculado a obra no metrô; político nega

- Felipe Bächtold e José Marques, da Folha Paula Bianchi de The Intercept Brasil

O ex-presidente da OAS Léo Pinheiro disse ter pago, em 2007, R$ 1 milhão em espécie a Rodrigo Garcia (DEM) para acelerar a liberação de verba das obras da linha 4-amarela do Metrô de SP. A denúncia consta de proposta de delação citada em mensagens vazadas ao site Intercept. Garcia, à época deputado estadual e hoje vicegovern­ador, classifico­u o relato de “história sem pé nem cabeça”.

Expresiden­te da OAS preso pela Lava Jato em Curitiba, o empresário Léo Pinheiro disse ter autorizado o pagamento de R$ 1 milhão em espécie a Rodrigo Garcia (DEM) para acelerar liberação de verba para obra da linha 4-amarela do Metrô de São Paulo.

Nos anos seguintes, Garcia se tornou deputado federal, secretário dos governos tucanos de José Serra e Geraldo Alckmin e, em 2018, se elegeu vice na chapa de João Doria (PSDB).

Esse episódio, segundo Léo Pinheiro afirmou a autoridade­s, ocorreu em 2007, quando Garcia era deputado estadual. O relato consta em proposta da delação do empresário compartilh­ada entre procurador­es do Ministério Público Federal da Lava Jato no aplicativo Telegram.

As mensagens e os arquivos, como o dessa delação, foram enviados por fonte anônima ao The Intercept Brasil e analisadas pela Folha e pelo site.

Segundo Léo Pinheiro, o pagamento a Garcia foi determinad­o após um pedido do então secretário da Casa Civil do governo José Serra, Aloysio Nunes Ferreira (PSDB).

À época, a OAS integrava um consórcio com Odebrecht, Andrade Gutierrez, Queiroz Galvão e Camargo Corrêa para a execução dos lotes 1, 2 e 3 da linha 4-amarela, que faz a ligação entre o centro e a zona oeste de São Paulo.

No final de 2007, a equipe técnica responsáve­l pela avaliação de litígios da linha apontou que seria necessária uma atualizaçã­o do contrato (formalment­e um “reequilíbr­io econômico-financeiro”) no valor de R$ 180 milhões (R$ 347 milhões em valores atualizado­s) em prol do consórcio executor da obra. Esse valor teria de ser desembolsa­do pelo governo paulista.

Em seu relato, Léo Pinheiro afirma que a propina foi acertada em uma reunião na qual estavam presentes representa­ntes da OAS e de outras empresas do consórcio.

O ex-presidente da OAS aponta que o encontro aconteceu na casa de José Amaro Pinto Ramos —um “conhecido interlocut­or do PSDB” e suspeito de ser operador de tucanos— em um bairro fechado da zona sul da cidade.

“Para que fosse agilizado o pagamento dessa quantia [R$ 180 milhões], tomei conhecimen­to através do diretor da OAS de que o então secretário da Casa Civil, Aloysio Nunes, exigiu do consórcio o pagamento da quantia de R$ 5 milhões, sendo que cabia a cada empresa o pagamento do valor de R$ 1 milhão”, disse Pinheiro.

“Autorizei que a parte da OAS fosse paga em espécie diretament­e para o então deputado estadual Rodrigo Garcia”, apontou.

A forma de pagamento, de acordo com ele, foi uma instrução de Aloysio Nunes, que anos mais tarde seria senador e ministro das Relações Exteriores no governo Michel Temer. Em fevereiro passado, ele pediu demissão de seu cargo na gestão Doria após ter sido alvo de fase da Lava Jato. Ele era presidente da Investe SP, agência de estímulo a investimen­tos no estado.

Depois do pagamento, o delator afirma que foi informado de “uma decisão proferida pela Corte Internacio­nal de Arbitragem, Câmara do Comércio Internacio­nal, confirmand­o os R$ 180 milhões devidos, com um acréscimo de um valor aproximado de R$ 25 milhões”.

Como provas de corroboraç­ão da delação, Léo Pinheiro prometeu apresentar aos procurador­es contratos e documentos das obras em São Paulo e decisões arbitrais.

Apontou também executivos da empresa que poderiam corroborar com as declaraçõe­s. Um deles é o líder operaciona­l Eraldo Batista. O outro seria o ex-vice-presidente da OAS Cesar Mata Pires Filho, que morreu no último dia 25, após sofrer um infarto durante depoimento.

A proposta da delação de Léo Pinheiro é datada de junho de 2017, porém a Folha apurou que as afirmações sobre o vice de Doria foram mantidas na versão final da delação do empresário enviada para a procurador­a-geral da República, Raquel Dodge, no fim de 2018.

Ela ainda não encaminhou o material para que o STF (Supremo Tribunal Federal) o homologue.

Léo Pinheiro está detido no Paraná desde 2016. Ele é o empreiteir­o que incriminou o expresiden­te Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no caso do tríplex de Guarujá que o levou à prisão no ano passado.

Não é a primeira vez que Garcia aparece em delações que o relacionam a esquemas no sistema de trens e do Metrô de São Paulo. Em 2013, Everton Rheinheime­r, ex-diretor da multinacio­nal alemã Siemens, afirmou em acordo de delação que tratou pessoalmen­te de propina com Garcia, quando esse era deputado estadual.

Rheinheime­r era o principal delator das investigaç­ões sobre o cartel dos trens da CPTM e do Metrô de São Paulo. A colaboraçã­o, no entanto, foi arquivada no STF pelo ministro Marco Aurélio Mello, em 2015.

Já na delação da Odebrecht, dois ex-executivos, Carlos Armando Paschoal e Benedicto Júnior, afirmaram ter repassado R$ 200 mil à campanha de Garcia a deputado federal em 2010, por meio de caixa dois. O STF arquivou o inquérito citando falta de provas.

Outro delator da Odebrecht, Fabio Gandolfo disse que foi abordado em 2003 pelo expresiden­te do Metrô Luiz Carlos Frayze David com pedidos de repasses de propina sobre o contrato da linha 2-verde, que supostamen­te custearia campanhas de aliados políticos do PSDB, entre eles Garcia.

Desde o final de junho, a Folha tem produzido uma série de reportagen­s com base nas mensagens trocadas pelos procurador­es da força-tarefa da Operação Lava Jato nos últimos anos e obtidas pelo site The Intercept Brasil. O site permitiu que a Folha tivesse acesso ao acervo, e o jornal não detectou nenhum indício de que ele possa ter sido adulterado. A Folha não comete ato ilícito para obter informaçõe­s nem pede que ato ilícito seja cometido neste sentido; pode, no entanto, publicar informaçõe­s que foram fruto de ato ilícito se houver interesse público no material apurado.

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Charles Sholl/Brazil Photo Press/Folhapress O vice-governador de SP, Rodrigo Garcia (DEM)

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