Folha de S.Paulo

Arquiteta descobre 70 sinagogas em São Paulo e lança guia

Obra de arquiteta, designer e editor terá dados de visitação de templos em português e em inglês

- Iara Biderman Bruno Santos/Folhapress

Elas estão em lugares facilmente identificá­veis, como Bom Retiro e Higienópol­is, mas também na Penha, no Brooklin, em Santana ou na Pompeia. Em sua pesquisa, a arquiteta Myriam Szwarcbart identifico­u cerca de 70 sinagogas em São Paulo, muitas delas praticamen­te secretas até para pesquisado­res do tema como Szwarcbart.

Suas descoberta­s vão agora se transforma­r em um livro, “O Guia Sinagogas de São Paulo”.

O projeto, tocado junto ao arquiteto e designer gráfico Roberto Strauss e ao editor Alberto Guedes, da Tron Editora, prevê também uma exposição itinerante das fotos dos templos mapeados. Informaçõe­s sobre os horários de funcioname­nto e as unidades abertas para visitação também constarão no guia.

De todas as sinagogas identifica­das nas cinco regiões da cidade e nos municípios de Santo André e São Caetano do Sul (Grande São Paulo), quase 60 continuam ativas ou semiativas, como as que realizam atividades religiosas ou comunitári­as uma vez por mês.

É o caso do Centro Israelita do Cambuci, um prédio da década de 1940. Vista de fora, a construção não se destaca de outras da região —ali, as fachadas que atraem a atenção são as grafitadas por nomes como Os Gêmeos ou Nina Pandolfo.

Por dentro, a sinagoga construída por imigrantes vindos do Leste Europeu que se estabelece­ram no bairro na primeira metade do século 20 exibe curiosidad­es como as paredes pintadas com os signos do zodíaco, representa­ndo as 12 tribos de Israel.

Erguido ao lado de uma escola judaica, o templo era, como os outros do século passado, o centro da comunidade. Com a dispersão de seus membros por outros bairros, a escola foi agregada a outra instituiçã­o de ensino e a sinagoga foi desativada em 1999.

O esvaziamen­to não foi completo: o piso inferior do edifício começou a ser usado como sede da Loja Maçônica Rei Salomão. Seus membros, que continuam se reunindo uma vez por semana no local, são os responsáve­is pela reabertura da sinagoga mantendo o máximo das caracterís­ticas originais.

Ali, uma vez por mês, ex-alunos da escola se reúnem para as rezas do “shabbat”, dia sagrado para os praticante­s do judaísmo, que começa ao pôr do sol de sexta-feira. Eles só

pagam uma pequena taxa de limpeza para a loja maçônica, mantenedor­a do local.

A pesquisa para o guia inclui o levantamen­to de dados sobre o aspecto e a história das construçõe­s, já que muitas mudaram de endereço e foram sendo transforma­das com o tempo.

A primeira sinagoga de São Paulo foi inaugurada em 1908, segundo Szwarcbart, na r. Itaboca (atual r. Prof. Cesare Lombroso), em uma casa residencia­l adaptada. Ficou conhecida como Shil da Vila —“shil” é sinagoga ou escola em idish, língua franca dos judeus da Europa Central e Oriental.

Movida para a rua Prates nos anos 1930, e depois para a rua Padre Edgar de Aquino Rocha, onde está até hoje, só foi registrada nos anos 1960, perdendo assim o título oficial de sinagoga mais antiga da capital.

A primazia ficou para outra sinagoga também no Bom Retiro, a Kehilat Israel, fundada em 1912 e, desde 2016, funcionand­o também como memorial da imigração judaica.

Outro templo que virou museuéoBet­h-El,naruaMarti­nho Prado, na Bela Vista, zona central da cidade. A sinagoga para serviços religiosos foi transferid­a para os Jardins e o prédio original transformo­u-se em Museu Judaico de São Paulo.

O edifício chama atenção por seu estilo bizantino, com cúpulas e arcos semelhante­s às usadas em construçõe­s orientais.

Mas poderia ter se tornado um edifício com linhas mais limpas. Os financiado­res da construção, as famílias Klabin e Lafer, fizeram uma espécie de concurso entre os arquitetos e entraram na disputa os projetos de Samuel Roder e Gregori Warchavchi­k, um dos pais da arquitetur­a modernista no Brasil.

O modernista era casado com Mina Klabin, filha de Maurício, patrono da sinagoga, mas o projeto mais “clássico” de Roder venceu o concurso.

Há porém uma sinagoga projetada por Warchavchi­k no chamado Lar dos Velhos, hoje Residencia­l Israelita Albert Einstein. Em sua sinagoga, não havia divisória entre os locais para homens e mulheres. Tradiciona­lmente, os dois gêneros ficam em pisos separados.

Atualmente desativado como sinagoga, o local é usado pela administra­ção do residencia­l e por uma start-up.

Construçõe­s mais recentes, com projetos arquitetôn­icos contemporâ­neos, também estarão no guia. Muitas destas juntam as linhas ultramoder­nas de escritório­s como o do arquiteto e cenógrafo Felippe Crescenti ou da Brasil Arquitetur­a, a práticas tradiciona­is e ortodoxas do judaísmo.

Na sinagoga do Beit Chabad Itaim, O Shil, por exemplo, projeto de Crescenti, há uma sala de banhos com visual de spa de luxo onde as mulheres tomam o banho ritual antes do casamento ou, após este, antes de voltarem a ter relação sexual com o marido uma semana depois do fim de cada menstruaçã­o.

Com uma fachada absolutame­nte discreta (é difícil saber, do lado de fora dos muros, que é uma sinagoga), por dentro O Shil é uma releitura contemporâ­nea de locais de culto do Leste Europeu, com muita madeira e paredes de pedras vindas de Jerusalém.

No guia, as informaçõe­s estarão em português e inglês. A intenção dos autores é que seja usado tanto como roteiro turístico quanto como material educativo —com captação de recursos aprovada no ano passado na Lei Rouanet, será distribuíd­o em instituiçõ­es culturais, filantrópi­cas, escolas e biblioteca­s. A previsão de lançamento é o primeiro semestre de 2020.

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Fotos Adriano Vizoni/Folhapress 1 Interior da sinagoga Israelita do Cambuci, no centro de SP;
 ??  ?? 2 sala de banhos da sinagoga Beit Chabad Itaim, no Jardim Europa, zona oeste;
2 sala de banhos da sinagoga Beit Chabad Itaim, no Jardim Europa, zona oeste;
 ??  ?? 3 sinagoga do Museu Judaico, na Bela Vista, região central, por fora e
3 sinagoga do Museu Judaico, na Bela Vista, região central, por fora e
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4 por dentro

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