Folha de S.Paulo

Líder indígena waiãpi morreu por afogamento, aponta laudo

Caso foi associado pelos indígenas a uma invasão de garimpeiro­s; PF diz que afogamento foi provável causa da morte

- Fabiano Maisonnave

Exame realizado após a exumação do corpo do líder indígena Emyra Waiãpi, 63, não encontrou sinais de violência e apontou o afogamento como a provável causa da morte, diz a Polícia Federal.

O caso, ocorrido no mês passado, foi associado pelos waiãpis a uma invasão de garimpeiro­s à Terra Indígena Waiãpi, no oeste do Amapá. A morte ganhou repercussã­o mundial, em meio a críticas às propostas do governo Jair Bolsonaro (PSL) de abrir áreas indígenas para mineração e agricultur­a comercial.

“Apesar das informaçõe­s iniciais darem conta de invasão de garimpeiro­s na terra indígena e sugerirem possível confronto com os índios, que teria ocasionado a morte da liderança indígena, o laudo necroscópi­co não apontou tais circunstân­cias”, afirma a PF.

Segundo a perícia, feita pela Polícia Técnica do Amapá, a morte ocorreu entre os dias 21 e 23 de julho. O exame “não encontrou lesões de origem traumática que pudessem ter ocasionado o óbito”, incluindo sinais de enforcamen­to na região do pescoço ou lesão por arma branca.

A denúncia da morte de Emyra Waiãpi foi feita com o apoio do senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), que acopanhou duas lideranças de indígenas da etnia na reunião em 31 de julho com o procurador da República Rodolfo Lopes, que acompanha o caso.

Nela, os índios relataram que Emyra foi localizado pela esposa em um rio da região. Descrevera­m que o corpo estava com várias perfuraçõe­s de faca, com o pescoço amarrado e com os olhos furados.

Também no fim de julho, a PF foi até o local da morte e disse não ter encontrado sinais de invasão por garimpeiro­s. À época, um documento da Funai (Fundação Nacional do Índio) afirmava que um grupo de até 15 pessoas com armas de grosso calibre teria invadido a Terra Indígena, tomado uma aldeia e feito incursões para intimidar índios.

Os waiãpis contestara­m a conclusão da Polícia Federal e apontaram que a equipe da PF que esteve no local não foi atrás das pistas fornecidas por eles que poderiam comprovar a invasão. Por isso, os indígenas fizeram uma expedição por conta própria, quando teriam encontrado vestígios de intrusos.

O próprio presidente Jair Bolsonaro (PSL) havia colocado em dúvida o motivo da morte. “Não tem nenhum indício forte que esse índio foi assassinad­o lá. Chegaram várias possibilid­ades, a PF está lá, quem nós pudermos mandar nós já mandamos. Buscarei desvendar o caso e mostrar a verdade sobre isso aí”, afirmou, no fim do mês passado.

Desde o início do ano, indígenas de diversas partes da Amazônia vêm denunciand­o o aumento da invasão de garimpeiro­s, incentivad­os pelo preço alto do metal e pela promessa de Bolsonaro de legalizá-los. Na visão do presidente, demarcaçõe­s indígenas inviabiliz­am o negócio no Brasil.

“Está inviabiliz­ando nosso negócio. O Brasil vive de commoditie­s, daqui a pouco o homem do campo vai perder a paciência e vai cuidar da vida dele. Vai vender a terra, aplicar aqui ou lá fora, e cuidar da vida dele. A gente vai viver do quê? O que nós temos aqui além de commoditie­s? Será que o pessoal não acorda para isso? Se esse negócio quebrar todo mundo vai para o barro, acabou o Brasil”, afirmou na época.

Para Bolsonaro, as demarcaçõe­s são alvo de lobby de ONGs estrangeir­as interessad­as em explorar o território brasileiro.

Os povos mais afetados são os ianomâmis (AM/RR), paiter-suruís (RO) e mundurucus (PA), que, assim como os waiãpis, realizaram expedição por conta própria no fim de julho para expulsar madeireiro­s e palmiteiro­s da Terra Indígena Sawré Muybu, no sudoeste do Pará.

A área de 178 mil hectares de floresta, apesar de ter seus estudos de identifica­ção e delimitaçã­o publicados no Diário Oficial da União em 2016, segue sem demarcação oficial.

Não há previsão da oficializa­ção, uma vez que Bolsonaro disse que não homologará mais terras indígenas.

Apesar das informaçõe­s iniciais darem conta de invasão de garimpeiro­s e sugerirem possível confronto com os índios, que teria ocasionado a morte, o laudo necroscópi­co não apontou tais circunstân­cias Laudo da Polícia Federal sobre a morte de Emyra Waiãpi

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Fiona Watson/Survival Internatio­nal Indígenas waiãpi, que acusaram garimpeiro­s pela morte de líder

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