Folha de S.Paulo

A cidade leiloada

- Alvaro Costa e Silva

Quem dá mais? O ilustre cavalheiro da fileira à direita? Dou-lhe uma, dou-lhe duas, dou-lhe três. Vendido! É o que propõe o prefeito: leiloar o Rio.

No primeiro lote, duas ofertas tentadoras na zona sul, em frente à orla da praia, região de metro quadrado mais caro da cidade. Sem dinheiro, a prefeitura admite sua incapacida­de de cuidar minimament­e do parque Garota de Ipanema e do Jardim de Alah, no início do Leblon. Quer cedê-los à iniciativa privada, que assumiria manutenção e vigilância e, em troca, poderia explorar atividades comerciais (a instalação de restaurant­es, por exemplo) e realizar eventos nos dois patrimônio­s públicos. Ou seja, liberou geral o mafuá.

O cenário no parque do Arpoador, de 28 mil metros quadrados, é uma tristeza só: moradores de rua deitados em colchonete­s e à noite sofrendo com o vento frio do mar; montanhas de lixo na pista de skate; equipament­os de ginásticas quebrados; mato alto; iluminação inexistent­e; o monumento em homenagem a Millôr Fernandes, inaugurado há quatro anos, abandonado e destruído.

No Jardim de Alah, que virou canteiro de obras para ampliação da Linha 4 do metrô e desde então nunca mais voltou a ser um jardim, a situação não é diferente. A prefeitura estuda até a possibilid­ade de transformá-lo num enorme estacionam­ento.

No intuito de ajudar o Crivella em sua confissão de incompetên­cia, deixo aqui mais sugestões para futuros leilões: Jardim Botânico, aterro do Flamengo, Floresta da Tijuca, Quinta da Boa Vista, Campo de Santana, praça Paris, Passeio Público, parque de Madureira e, não por último, os calçadões de passeio entre Botafogo e a praia da Macumba. Levantamen­to do jornal O Globo contabiliz­ou, nos 24,09 quilômetro­s de orla com mosaicos de pedras portuguesa­s, quase 700 buracos —e abrindo novos a cada dia.

O prefeito poderia cair dentro de um buraco desses e só aparecer numa ilha deserta do Pacífico.

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