Folha de S.Paulo

Bolsonaro vai ter de baixar a bola em intervençõ­es

- Vinicius Mota vinicius.mota@grupofolha.com.br

Servidores da Receita e da Polícia Federal reagem aos movimentos de interferên­cia do chefe da República em postos estratégic­os desses dois órgãos. A reação das instituiçõ­es é importante para frear a caneta presidenci­al.

Sergio Moro, que entrou no governo como um Super-Homem, foi reduzido a Homem-Formiga.

Para quem gosta de ordenar o passado conforme os acidentes do presente, pode ter parecido uma jogada sagaz de Bolsonaro. Afinal, ele primeiro atraiu e logo estrangulo­u um forte adversário na corrida de 2022.

Na fase do flerte, Jair ofereceu a Sergio o Coaf, o vigia das transações financeira­s. Na do estranhame­nto, cedeu facilmente a agência à Economia e agora, na da asfixia, prepara sua entrega ao Banco Central, com a degola do servidor que Moro havia colocado na chefia do órgão.

Ocorreu algo parecido com as medidas legislativ­as preconizad­as pelo ex-juiz para combater o crime e a corrupção. O presidente vendeu apoio prioritári­o antes da largada, mas entregou desdém pouco depois.

A “paz curitibana”, que prometia reger a relação entre o ministro da Justiça e a cúpula da Polícia Federal, também foi perturbada pelo mandonismo do Planalto. O efeito foi como criptonita para o Homem de Aço.

Tanto maquiaveli­smo, convenha, não combina com as faculdades intelectua­is de Bolsonaro. Mais plausível é que uma combinação de fatos, nem todos sob o seu domínio, tenha estimulado adaptações na sua conduta presidenci­al, o que concorreu para o esmagament­o de Moro.

Nesse processo, Bolsonaro descobriu que a autonomia de órgãos de fiscalizaç­ão como a PF, a Receita e o Coaf ameaça o seu círculo familiar. Encontrou aliados circunstan­ciais, caso do presidente do Supremo Tribunal Federal, interessad­os em podar as asas de agências de controle.

O escândalo das mensagens da Lava Jato escancarou abusos de autoridade­s investigat­ivas e do próprio Moro. O ministro, no contra-ataque aos hackers, enfiou o pé na jaca dos procedimen­tos não republican­os.

Sergio Moro beijou a lona, de onde dificilmen­te vai se reerguer. Resta saber até onde chegará o colossal consórcio que bolina as organizaçõ­es estatais de fiscalizaç­ão, agora reforçado pelo presidente da República.

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