Folha de S.Paulo

Superlotad­o, Pedrinhas vê melhora na estrutura

Símbolo da violência no sistema prisional, complexo no Maranhão ganhou reforço na segurança

- João Pedro Pitombo

Presídio que virou símbolo de violência ainda enfrenta superlotaç­ão e facções, mas melhora estrutura, procedimen­tos e programas de reinserção.

“Eu fecho os olhos e a imagem que me vem na cabeça é a de vários corpos estendidos no chão, alguns abertos, outro sem cabeça. A gente suporta ver porque não tem jeito mesmo, mas foi um negócio feio.”

Raimundo Nonato Pires, 56, foi preso por tráfico de drogas em 2013, mesmo ano em que o Complexo Penitenciá­rio São Luís, conhecido como Pedrinhas, chegou ao seu auge de violência com rebeliões e 64 mortos.

Seis anos depois de seu período mais sangrento, o presídio que se tornou símbolo de violência no cárcere no Brasil ainda enfrenta superlotaç­ão e disputas entre facções, mas viu um salto em sua estrutura, procedimen­tos de segurança e programas de reinserção pelo trabalho e pelo estudo.

A Folha visitou na tarde da última quinta-feira (15) quatro dos nove presídios do complexo de Pedrinhas, que ao todo abriga 3.972 presos. Diferentem­ente de 2014, quando a reportagem acessou o local sem passar por revista, a visita foi cercada por um forte esquema de segurança.

Para acessar o presídio, servidores, fornecedor­es e familiares passam por um detector de metais e por um scanner corporal. Desde que o equipament­o foi instalado, 165 pessoas foram detidas tentando entrar no complexo com drogas ou telefones celulares.

Os servidores terceiriza­dos foram trocados por concursado­s, e a Polícia Militar saiu do presídio para dar lugar a uma força especial voltada exclusivam­ente para operações dentro de penitenciá­rias.

Também foram reforçados procedimen­tos de segurança: se há seis anos muitos presos viviam soltos nos pátios, agora eles ficam nas celas e saem apenas para o trabalho e para o banho de sol diário.

Para controlar possíveis brigas internamen­te, o presídio segue a estratégia de dividir os presos por facções. Um pavilhão foi destinado aos membros da facção Bonde dos 40, outro para os membros do Primeiro Comando do Maranhão.

Um terceiro, o maior deles, é para os presos que se declaram neutros. Ainda há um quarto pavilhão, com segurança reforçada, destinado aos líderes das facções.

O sistema, já adotado em outros estados, é criticado por especialis­tas que entendem que ele fortalece o vínculo dos presos com as facções. No Ceará, por exemplo, o governo do estado anunciou em janeiro deste ano o fim do sistema de divisão de presos por grupos criminosos.

Mas na avaliação do secretário estadual de Administra­ção Penitenciá­ria, Murilo Andrade de Oliveira, o sistema evita conflitos e funciona bem.

“Não adianta juntar [as facções] só para ter um discurso de que o Estado é quem manda. Aqui, o Estado manda, mas não é salutar juntar pessoas que têm diferenças entre si”, afirma.

A estratégia, diz, tem levado à redução do número de mortes no sistema prisional. Desde 2015, foram 13 mortes dentro de penitenciá­rias do Maranhão, seis delas em Pedrinhas. Até agora, em 2019, apenas uma pessoa morreu sob custódia do estado.

A situação é considerad­a sob controle a despeito de o presídio ainda enfrentar superlotaç­ão. São 2.940 vagas para 3.972 internos no complexo de Pedrinhas, média de 135 presos para cada cem vagas.

O governo maranhense, sob gestão de Flávio Dino (PC do B) desde 2015, promete entregar 4.000 novas vagas até dezembro de 2020.

Após reformas na estrutura e reforço nos procedimen­tos de segurança, a direção do complexo de Pedrinhas agora se volta para o trabalho de ressociali­zação—atualmente, 25% dos presos trabalham.

O Complexo de Pedrinhas tem uma fábrica de pedras para calçamento, oficinas de serigrafia e malharia, além de aulas de ensino fundamenta­l e médio. Um grupo de presos do regime semiaberto trabalha na pavimentaç­ão de ruas e na construção de móveis que são usados pelos próprios órgãos públicos do estado.

No comando da barbearia da Casa de Detenção, prédio onde presos foram decapitado­s em 2014, Aroldo Pereira Feitosa fez a prova do Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) no ano passado e conseguiu pontuação para cursar ciências agrárias.

Como ainda está cumprindo pena por tentativa de homicídio em regime fechado, não pode fazer o curso.

Ele afirma que vai se empenhar para atingir a pontuação necessária para cursar a faculdade de direito quando for para o semiaberto. “Não era muito ligado nesta área, mas a prisão me fez começar a gostar de direito. Acho que pode ser um caminho para quando eu sair daqui.”

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Fotos Zanone Fraissat/Folhapress Presos em uma das unidades do Complexo Prisional de Pedrinhas, em São Luís; em dezembro de 2013, três homens foram degolados em uma briga interna no local
 ??  ?? Acima, quadra esportiva dentro do complexo prisional, reformada após as mortes; hoje, a segurança dos pavilhões foi reforçada (abaixo, à esq.), com divisão das unidades entre as diferentes facções e força policial especializ­ada, e 25% dos presos trabalham
Acima, quadra esportiva dentro do complexo prisional, reformada após as mortes; hoje, a segurança dos pavilhões foi reforçada (abaixo, à esq.), com divisão das unidades entre as diferentes facções e força policial especializ­ada, e 25% dos presos trabalham
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