Folha de S.Paulo

Em meio a bloqueios de caixa, governo tem gasto de R$ 1,6 mi com medalhas

Egresso do Exército, Bolsonaro se destaca tanto por entregar quanto por receber condecoraç­ões

- Ranier Bragon

Presidente da República egresso da carreira militar, Jair Bolsonaro (PSL) deu em seus primeiros meses de governo impulso ao gasto para confecção de um apetrecho caro à caserna, as medalhas.

Os ministério­s das Relações Exteriores, da Defesa, Exército, Marinha, Aeronáutic­a e Escola Superior de Guerra têm mais de 50 tipos diferentes de condecoraç­ões, da Medalha do Pacificado­r à Medalha Sangue do Brasil.

O custo para confecção delas ficou em R$ 1,6 milhão nos primeiros meses de 2019 —dados que vão até abril ou junho, a depender do órgão.

Apesar de o governo ter patrocinad­o um contingenc­iamento que atingiu severament­e diversas pastas, entre elas a da Educação, o desembolso para as medalhas supera, proporcion­almente, os feitos em 2017 e 2018, se assemelhan­do aos de 2016 (R$ 3,7 milhões) caso sigam no mesmo ritmo até o fim do ano.

Os valores foram obtidos pela Folha por meio da Lei de Acesso à Informação.

Em abril, o presidente concedeu ao guru do bolsonaris­mo, Olavo de Carvalho, o mais alto grau da Ordem de Rio Branco, do Itamaraty, condecoraç­ão dada pelo governo do Brasil para “distinguir serviços meritórios e virtudes cívicas, estimular a prática de ações e feitos dignos de honrosa menção.” Ele admitiu Olavo no grau de grãcruz da ordem.

Na mesma ocasião, foram agraciados, com medalhas de grau inferior, os filhos Flavio (senador) e Eduardo (deputado federal), além de ministros, governador­es e congressis­tas aliados, entre eles o deputado federal Helio Negão (PSL-RJ), espécie de sombra do presidente da República.

Capitão do Exército reformado, Bolsonaro se destaca tanto em dar quanto em receber medalhas.

A Folha identifico­u que o presidente da República recebeu ao menos sete tipos diferentes de medalhas, quatro delas durante a gestão daquele que ele aponta hoje como seu arquirriva­l, o petista Luiz Inácio Lula da Silva —só parte dos órgãos divulga publicamen­te a lista dos agraciados pelas condecoraç­ões.

As medalhas começaram a aparecer com mais intensidad­e na lapela de Bolsonaro na primeira gestão de Lula, quando o capitão reformado estava em seu quarto mandato na Câmara dos Deputados —local em que permaneceu por 28 anos como parlamenta­r do chamado baixo clero, o contingent­e de baixíssima projeção política nacional.

Após ter deixado o serviço ativo do Exército absolvido em um processo em que era suspeito de planejar atentados a bomba no Rio, Bolsonaro pautou todos os seus mandatos na Câmara pela defesa dos interesses corporativ­os dos militares.

De acordo com os registros oficiais, em 2004, 2005 e 2006 ele recebeu a Medalha da Ordem do Mérito Aeronáutic­o, a Medalha da Vitória (Ministério da Defesa), a Ordem do Mérito Militar (Exército) e a Medalha Santos-Dumont (Aeronáutic­a).

Em geral, elas têm por objetivo recompensa­r pessoas que tenham prestado relevantes serviços às Forças. A da Vitória, especifica­mente, destinase a agraciar aqueles que contribuír­am para a difusão dos feitos dos brasileiro­s que lutaram na 2ª Guerra Mundial.

Doze anos depois, já eleito presidente da República, voltou a atrair insígnias.

Em dezembro de 2018, o Comando do Exército lhe concedeu a Medalha do Pacificado­r com Palma, uma das mais prestigios­as das Forças. A justificat­iva foi a de que Bolsonaro arriscara 30 anos antes a vida para salvar um colega do afogamento.

No livro que escreveu sobre o pai (“Bolsonaro, Mito ou Verdade”), o senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) relata que no ano de 1978 o hoje presidente salvou um colega de morrer afogado. “Negão Celso”, como era conhecido, havia caído na água durante uma prova militar.

“Rapidament­e, Bolsonaro arrancou a gandola, os coturnos e pulou na água para resgatá-lo. [...] Uma evidente prova de ‘racismo’ de Bolsonaro já nos tempos da caserna”, escreveu Flávio.

Bolsonaro sempre ressalta que um dos motivos pelos quais o país deve considerar como herói o coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, um dos principais símbolos da repressão durante a ditadura militar, é o fato de ele ter recebido, em 1972, a Medalha do Pacificado­r com Palma.

Segundo o relatório final da Comissão Nacional da Verdade, só na gestão de Ustra o DOI-Codi (Destacamen­to de Operações de Informaçõe­s) do 2º Exército (SP) foi o responsáve­l pela morte ou desapareci­mento de ao menos 45 presos políticos.

Instituída em 1962, a Medalha do Pacificado­r com Palma é feita em bronze e tem cerca de 3 cm de largura por 3 cm de altura, com uma palma dourada na fita. É vendida por cerca de R$ 500 em anúncios na internet.

Oficialmen­te, seu intuito é “premiar militares brasileiro­s que, em tempo de paz, se houvessem distinguid­o por atos pessoais de abnegação, coragem e bravura, com risco da própria vida”.

Já presidente, Bolsonaro foi condecorad­o ao menos com a Medalha Ordem do Mérito da Defesa, a Ordem do Mérito Naval (grã-cruz), a Ordem do Mérito Militar (grã-cruz) e a Medalha da Ordem do Mérito Aeronáutic­o.

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Pedro Ladeira - 15.ago.2019/Folhapress O presidente Jair Bolsonaro na cerimônia de entrega de medalhas do Mérito Mauá, na última quinta
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