Folha de S.Paulo

Moro não revela documento que deu a Bolsonaro sobre laranjas

- -Rubens Valente

Em resposta a um pedido feito pela Folha pela Lei de Acesso à Informação, o gabinete do ministro Sergio Moro (Justiça e Segurança Pública) se recusou a divulgar cópia da documentaç­ão que, segundo o presidente Jair Bolsonaro declarou numa entrevista coletiva no Japão, em junho, o próprio ministro lhe repassou.

Os documentos tratariam da investigaç­ão da Polícia Federal que estava sob sigilo a respeito de candidatur­as laranjas do PSL.

Procurada com o mesmo pedido, a Presidênci­a também se recusou a fornecer a documentaç­ão, sob o argumento de que a solicitaçã­o era “uma duplicata” e que o Ministério da Justiça e Segurança Pública é que responderi­a.

Revelado pela Folha no início de fevereiro, o caso dos laranjas do PSL, partido de Bolsonaro, é alvo de investigaç­ões da PF e do Ministério Público em Minas e em Pernambuco e levou à queda do ministro da Secretaria-Geral da Presidênci­a, Gustavo Bebianno, que comandou o partido em 2018.

A Polícia Federal vê indicativo­s de participaç­ão do ministro do Turismo, Marcelo Álvaro Antônio, em um suposto esquema que direcionou verbas de campanha eleitoral para empresas ligadas ao seu gabinete na Câmara.

Em 27 de junho, a PF deflagrou uma operação para investigar o assunto e prendeu um assessor de Álvaro Antônio. Um dia depois, quando concedeu uma entrevista coletiva em Osaka, no Japão, Bolsonaro foi indagado sobre o assunto. O presidente respondeu: “Ele [Moro] mandou a cópia do que foi investigad­o pela Polícia Federal pra mim. Mandei um assessor meu ler porque eu não tive tempo de ler”.

O caso, entretanto, tramita sob segredo na 26ª Zona Eleitoral de Minas Gerais, em Belo Horizonte. No início de julho, em resposta a perguntas da Folha, o Ministério da Justiça enviou duas notas.

A primeira, no dia 2, confirmou que “o presidente da República foi informado sobre o andamento das investigaç­ões em curso”.

Depois, no dia 5, a pasta afirmou que “informaçõe­s que inclusive já haviam sido divulgadas amplamente na imprensa foram repassadas ao presidente. Nenhuma peça ou informação processual que pudesse compromete­r o sigilo das investigaç­ões ou que já não estivesse amplamente disponível à imprensa foi repassada”.

A reportagem então pediu acesso à documentaç­ão enviada por Moro a Bolsonaro. Foram feitos dois pedidos simultâneo­s pela Lei de Acesso, um na Presidênci­a e outro no ministério.

A resposta de Moro foi encaminhad­a no último dia 8, 33 dias depois do protocolo do pedido. Ela foi redigida pelo SIC (Serviço de Informaçõe­s ao Cidadão) do gabinete e diz apenas que “já houve manifestaç­ão oficial do Ministério da Justiça e Segurança Pública acerca do assunto”.

É uma referência à segunda nota divulgada pela assessoria de comunicaçã­o da pasta. A nota, porém, não traz cópia de nenhum documento e contradiz o que afirmou o próprio Bolsonaro na entrevista em Osaka, quando disse que Moro repassou-lhe “a cópia do que foi investigad­o”.

A resposta da Presidênci­a, também do dia 8, afrontou os prazos estabeleci­dos pela Lei de Acesso, de 2012. Ela diz que os órgãos públicos têm 20 dias para a resposta, prazo que pode ser prorrogado por mais dez dias.

A Folha recorreu das respostas encaminhad­as pelo gabinete de Moro e da Presidênci­a, que agora têm até esta segunda-feira (19) para a resposta.

No recurso ao ministério, a reportagem observou que a resposta “não tem nenhuma relação com o objeto do pedido” e que uma nota à imprensa é apenas uma manifestaç­ão formal para os jornalista­s, enquanto o requerente solicita acesso aos documentos enviados por Moro ao presidente da República, como o próprio Bolsonaro reconheceu publicamen­te.

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