Folha de S.Paulo

Número 2 da Receita cai em meio a pressão do Planalto

Subsecretá­rio-geral será substituíd­o por se posicionar contra as interferên­cias; governo planeja mudança mais ampla

- Fábio Pupo e Thiago Resende

O subsecretá­rio-geral da Receita, João Paulo Ramos Fachada, será substituíd­o pelo governo Jair Bolsonaro (PSL) por se opor às pressões do Planalto para trocar quadros de chefia do órgão. A saída teve aval do secretário Marcos Cintra. O clima entre auditores é de indignação com as ingerência­s.

A pressão do Palácio do Planalto para substituir nomes de dirigentes da Receita Federal levou à troca do número dois do órgão.

O subsecretá­rio-geral da Receita, João Paulo Ramos Fachada, será substituíd­o pelo governo Jair Bolsonaro (PSL) por se posicionar de forma contrária às interferên­cias. A troca de Fachada teve aval do secretário especial da Receita Federal, Marcos Cintra.

Fachada era respeitado entre auditores e participav­a de discussões importante­s, como a da reforma tributária.

De acordo com a Receita, o novo titular será o auditor fiscal José de Assis Ferraz Neto, que atualmente está em exercício na área de fiscalizaç­ão da delegacia da Receita Federal em Recife (PE).

Em nota divulgada pela Receita, Cintra afirmou que “agradece o empenho e a dedicação” de Fachada. O texto não menciona o motivo da substituiç­ão.

A coluna Painel, da Folha, noticiou na sexta-feira (16) que a queda de Fachada era dada como certa.

A tendência é de uma troca mais ampla na cúpula da Receita.

O clima no órgão é de insurreiçã­o contra a tentativa de interferên­cia política por parte presidente Jair Bolsonaro e do núcleo próximo a ele.

A Receita Federal costuma reagir em situações de pressão política por troca de cargos. Atualmente, está sofrendo pressões dos três Poderes após investigaç­ões sobre autoridade­s.

Auditores fiscais estão surpreendi­dos com o atual nível de ataques e interferên­cias no órgão, principalm­ente por partirem do próprio Palácio do Planalto.

Desde que assumiu a presidênci­a da República, Bolsonaro contesta ações de órgãos de controle para investigar seu núcleo familiar e pessoas próximas —Renato Bolsonaro, irmão do presidente, o senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), filho do presidente, e Fabrício Queiroz, ex-assessor de Flávio.

“Quando ele escolheu vir para a vida pública, fazia parte do pacote que toda sua família estaria sujeita a uma maior fiscalizaç­ão. Ele diz que é perseguiçã­o, mas, na verdade, é consequênc­ia de tratados internacio­nais que o Brasil assinou”, afirmou o presidente da Unafisco (associação nacional dos auditores fiscais da Receita), Mauro Silva.

No sábado (17), em mensagem a colegas, o delegado da alfândega do Porto de Itaguaí, José Alex Nóbrega de Oliveira, expôs o embate por posições estratégic­as na região metropolit­ana do Rio de Janeiro, que já apresentou histórico de corrupção.

Ele declarou ter sido surpreendi­do há cerca de três semanas, quando o superinten­dente da Receita no Rio de Janeiro, Mario Dehon, o teria informado de que havia uma indicação política para assumir a alfândega do porto.

Dehon não concordou em substituir Oliveira por um auditor com pouca experiênci­a para o cargo.

O indicado seria o auditor fiscal Gilson Rodrigues de Souza, que tem mais de 35 anos de experiênci­a de fiscalizaç­ão em Manaus (Amazonas), mas sem atuação na área de alfândega.

A Folha entrou em contato com Souza. Ele, porém, se recusou a responder aos questionam­entos. “Se eu soubesse que era da imprensa, eu nem teria atendido. Essas são questões internas”, disse.

Por não ter cedido à pressão, Dehon, agora, está ameaçado de ser exonerado, conta Oliveira. Os dois se reuniram nesta segunda (19), no Rio.

Outro cargo que está na mira é o de Adriana Trilles, que trabalha na delegacia da Receita na Barra da Tijuca.

Irritado com investigaç­ões conduzidas pela Receita, Bolsonaro tem reclamado publicamen­te da atuação do órgão e tem atuado para que as trocas sejam feitas no Rio.

Procurado, o Planalto não se manifestou sobre o caso.

Diante das interferên­cias políticas, o movimento de rebelião na Receita deve começar de cima para baixo —partindo da cúpula em Brasília.

Isso pode resultar no travamento de atividades do fisco, responsáve­l pela arrecadaçã­o de tributos, além das discussões para que o governo envie a própria proposta de reforma tributária ao Congresso.

 ?? Pedro Ladeira - 1º.ago.19/Folhapress ?? O presidente Jair Bolsonaro, durante entrevista em Brasília
Pedro Ladeira - 1º.ago.19/Folhapress O presidente Jair Bolsonaro, durante entrevista em Brasília

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil