Folha de S.Paulo

Scolari revive hoje à noite a rivalidade que ajudou a criar

Técnico comandou Grêmio em jogos históricos contra seu atual time pelas quartas da Libertador­es de 1995

- Luciano Trindade e Toni Assis

Há 24 anos, Luiz Felipe Scolari, 70, precisou convencer um jovem time do Grêmio de que era possível superar o badalado Palmeiras, formado por jogadores como Cafu, Müller e Rivaldo, contratado­s a preços altos pela Parmalat. A empresa italiana participav­a da gestão da equipe alviverde à época.

Em dois jogos históricos pela Copa Libertador­es de 1995, o treinador alcançou seu objetivo e eliminou o time paulista nas quartas de final.

Hoje, é Felipão quem comanda o Palmeiras, dono de um dos elencos mais caros do país, estruturad­o com alto investimen­to feito pela Crefisa.

As duas equipes vão se encontrar novamente no matamata continenta­l a partir desta terça-feira (20), às 21h30, pelo jogo de ida das quartas de final, em Porto Alegre.

Quem esteve ao lado do técnico quando ele dirigiu o Grêmio lembra que o poder financeiro do Palmeiras era usado para motivar seus jogadores.

Assim como dirigentes gremistas da época, Felipão protestava contra o que classifica­va como “esquema Parmalat”, uma teoria segundo a qual a empresa manipulava resultados a favor do rival.

Esse expediente foi usado, inclusive, na véspera do primeiro confronto entre gaúchos e paulistas pela Libertador­es de 1995. Tanto que foi criado um clima de guerra entre os jogadores.

“Já tinha de sair ganhando no olho no olho. Para nós, tudo isso era uma questão de honra”, relembra o ex-goleiro gremista Danrlei, 46. “Tinha um ambiente hostil”, acrescenta Vagner Mancini, 52, exmeia-atacante daquele Grêmio e atual coordenado­r técnico do São Paulo.

Quando a bola rolou, bastou uma fagulha para que houvesse o incêndio. No primeiro tempo, houve três expulsões: Rivaldo e Válber, do Palmeiras, e Dinho, do Grêmio.

A confusão generaliza­da durou 14 minutos. O volante Dinho agrediu o meia Válber, e o palmeirens­e reagiu com um soco no nariz do rival. Fora de campo, Dinho correu atrás do meia e deu um chute na cabeça dele, que, pelas costas, ainda foi agredido por Danrlei. A violência também foi vista nas arquibanca­das do Olímpico.

Apesar de ter continuado em campo naquele jogo, o goleiro do Grêmio foi punido mais tarde e não atuou na partida de volta, em São Paulo.

O clima tenso que Felipão ajudou a criar beneficiou sua equipe. Um minuto após a bola voltar a rolar, o time gaúcho fez o primeiro dos cinco gols que marcaria na goleada por 5 a 0. Uma grande vantagem para a volta. “A gente veio para o jogo no Parque Antárctica com o intuito de não entrar em confusão”, diz Mancini.

Já o Palmeiras precisava dar uma resposta à sua torcida depois do vexame no jogo de ida. Após levar novo susto, ao sair perdendo por 1 a 0, virou e goleou por 5 a 1. Mas o placar não foi suficiente para classifica­r.

Também não foi o bastante para por um ponto final nas brigas ocorridas no jogo de ida. Dez anos depois daquele duelo, Dinho e Válber se encontrara­m por acaso em uma boate, em Porto Alegre, e voltaram a trocar agressões.

“Mas dois anos depois, por meio de um amigo nosso, em uma praia do Recife, nós resolvemos parar com isso e ficou tudo tranquilo”, contou Dinho ao UOL em 2013.

Quem evitou carregar as marcas daquela confusão foi Scolari. Ele deixou o Grêmio no final de 1996 e, após rápida passagem pelo Júbilo Iwata, do Japão, assumiu a equipe palmeirens­e, ainda bancada pela empresa italiana.

À frente do time alviverde, ele foi questionad­o várias vezes sobre o “esquema Parmalat” que acusava. Em uma entrevista à revista Istoé, em 1999, não negou suas declaraçõe­s, mas as minimizou.

“Vejo que em muitas situações o Palmeiras é prejudicad­o, como o Grêmio era. Erros acontecem a favor e contra. Quem diz isso quer é se defender: ‘Perdemos por isso.’ Até eu me justificav­a assim.”

O que não mudou no treinador foi a forma como ele busca mexer com os sentimento­s dos jogadores para motiválos. Em 2000, depois de uma derrota para o Corinthian­s

por 4 a 3, na primeira semifinal da Libertador­es, os atletas palmeirens­es foram questionad­os pelo comandante por uma suposta falta de malandrage­m diante do rival.

Felipão chegou a pedir aos jogadores que demonstras­sem raiva do adversário no jogo de volta. “Vocês têm que ter na cabeça isso tudo que eu estou falando para vocês. Raiva dessa p... de Corinthian­s.”

Os métodos do treinador lhe acompanhar­am em uma série de títulos em sua carreira. Pelo Grêmio, ganhou sete troféus, incluindo Copa

do Brasil (1994), Libertador­es (1995) e Brasileiro (1996).

Campeão do mundo com a seleção brasileira em 2002, ele também levantou seis troféus pelo Palmeiras, sendo os principais a Libertador­es (1999), o Campeonato Brasileiro (2018) e a Copa do Brasil (1998 e 2012). A sua terceira passagem pelo clube foi iniciada na temporada passada.

Na último sábado (17), Grêmio e Palmeiras empataram em 1 a 1 em Porto Alegre, pelo Brasileiro. Por causa do jogo pela Libertador­es, ambos atuaram com equipes mistas.

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