Folha de S.Paulo

Arrecadaçã­o de igrejas quase dobra em oito anos, para R$ 24,3 bilhões

Crescem doações e número de templos; entidades religiosas tentam manter isenção tributária

- Thiago Resende

Em oito anos, a arrecadaçã­o de igrejas no Brasil praticamen­te dobrou. A alta é resultado do aumento de entidades religiosas no país e de mais doações, dízimos e ofertas aos templos.

A renda das igrejas subiu de R$ 13,3 bilhões, em 2006, para R$ 24,3 bilhões, em 2013, segundo dados da Receita Federal, obtidos pela Lei de Acesso à Informação.

Corrigindo o montante de 2013 pela inflação, seriam quase R$ 32 bilhões em valores atuais —quase metade do que o governo espera gastar em 2019 com o BPC, benefício assistenci­al pago a idosos carentes e pessoas com deficiênci­a.

Isso significa uma receita de quase R$ 88 milhões por dia para entidades religiosas, em valores atualizado­s.

Em entrevista à Folha em abril, o secretário da Receita, Marcos Cintra, disse que até fieis pagariam impostos sobre o dízimo com a proposta de reforma tributária que discute um tributo sobre movimentaç­ões financeira­s —nos moldes da extinta CPMF.

Base eleitoral do presidente Jair Bolsonaro, as entidades religiosas reagiram, e o governo montou uma operação para negar a possibilid­ade.

A Receita Federal não calcula o quanto deixa de arrecadar por causa da imunidade tributária a igrejas.

“Elas são imunes. Então, o tributo nem alcança. Se não sei nem como se tributaria essa receita, não tem como saber o que deixou de ser arrecadado”, disse o coordenado­r de previsão e análise do fisco, Marcelo Gomide.

Mas ele informou que a desoneraçã­o foi de, pelo menos, R$ 674 milhões no ano passado na parte previdenci­ária.

Esses templos não são obrigados a pagar a parcela patronal sobre os salários para a Previdênci­a Social, mas há o desconto em folha para o

Silas Câmara (PRB-AM) líder da bancada evangélica na Câmara dos Deputados

INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) nos casos de trabalhado­res formais, como secretária­s.

Os dados da Receita apontam ainda para um aumento significat­ivo na quantidade de igrejas no Brasil, de 10 mil, em 2006, para 18,5 mil, em 2013. Em 2018, o número subiu para 25 mil. Ainda não há dados disponívei­s para a arrecadaçã­o mais recente.

Esse, contudo, é o número de entidades religiosas com CNPJ —uma obrigação para todos os templos.

Mas uma grande parcela das igrejas é irregular, sendo irrastreáv­el pelo fisco.

Cadastrada na Receita, a entidade precisa fornecer um documento mostrando a evolução do patrimônio no ano e detalhar isso de acordo com a origem dos recursos.

O balanço, obtido pela Folha, mostra que o aumento da arrecadaçã­o dos templos veio principalm­ente das doações e de outras fontes, como aluguéis.

Em 2014, as igrejas foram desobrigad­as de fornecer essas informaçõe­s por causa da troca do modelo de prestação de contas à Receita. Um ano depois, essa exigência foi retomada, mas os dados ainda estão sendo compilados.

O fisco reconhece que parte significat­iva das doações e dízimos é realizada por pagamento em espécie, o que dificulta o controle e a fiscalizaç­ão.

“Toda declaração é uma informação prestada. É uma informação que a Receita vai receber e que reproduz aquilo que o contribuin­te disse. Mas, grosso modo, há uma evolução, um cresciment­o da arrecadaçã­o”, afirmou Gomide.

Às vésperas de o governo apresentar sua proposta de reforma tributária, a bancada evangélica do Congresso tem se reunido com Bolsonaro e membros da equipe econômica em busca da manutenção das isenções previstas atualmente para os templos.

“Estamos reivindica­ndo a garantia da continuida­de da imunidade, que está na Constituiç­ão. E, pela nossa representa­tividade na Câmara, isso [tributação de igrejas] não passaria [em votação no plenário]”, disse o líder da bancada, deputado Silas Câmara (PRB-AM).

A bancada reúne quase 200 deputados e senadores.

Em um aceno aos parlamenta­res, o governo já flexibiliz­ou neste ano normas de prestação de contas a igrejas.

Em uma das medidas, ficam dispensado­s de CNPJ os estabeleci­mentos de organizaçõ­es religiosas que não tenham autonomia administra­tiva ou que não sejam gestores de orçamento.

No dia 7, líderes evangélico­s almoçaram com Bolsonaro e pediram o fim da aplicação de multas a igrejas por parte da Receita Federal.

Os parlamenta­res alegam que igrejas nos rincões do país não conseguem cumprir as exigências ou mesmo ter um CNPJ.

“A reforma tem como pauta a simplifica­ção tributária. Quem quer simplifica­r isso no Brasil não vai querer prejudicar ou criar burocracia­s para prejudicar os templos evangélico­s”, disse Câmara.

A reforma tem como pauta a simplifica­ção tributária. Quem quer simplifica­r isso no Brasil não vai querer prejudicar ou criar burocracia­s para prejudicar os templos evangélico­s

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