Folha de S.Paulo

Startups impulsiona­m hambúrguer vegetal

Com lançamento de ações e financiame­nto de fundos, empresas disputam público interessad­o em comida sustentáve­l

- Ricardo Ampudia

Com um público cada vez mais ávido por comida sustentáve­l, motivado pela crescente discussão do impacto ambiental da produção de carne, um mercado multimilio­nário toma corpo entre as startups de tecnologia, com a bênção dos fundos de investimen­to: o hambúrguer vegetal.

O “plant-based”, termo mais moderno e empreended­or para a comida vegetarian­a, tem demanda certa. Segundo a consultori­a Euromonito­r, o mercado de comida industrial­izada saudável cresce a uma taxa de 1,8% globalment­e, ante 1,5% da regular.

De acordo com o mesmo estudo, o cresciment­o anual de produtos rotulados como “livres de” foi de 5% na América Latina, entre 2013 e 2018. No norte do continente, a taxa chega aos 10%.

Mas o novo público, de onívoros preocupado­s, exige mais do que os vegetarian­os por opção: precisa de uma troca justa, sem perder o prazer do sabor e textura da carne, e aí entra em cena a tecnologia.

Para desenvolve­r seu hambúrguer, a Impossible Foods, avaliada em US$ 2 bilhões (R$ 8 bilhões), lançou mão de um time de cientistas que desenvolve­u uma substância similar à hemoglobin­a presente no sangue dos animais, que, segundo a empresa, é responsáve­l pelo sabor e textura da carne.

O processo usa engenharia genética para inserir DNA da raiz da soja em uma levedura transgênic­a que gera a chamada leghemoglo­bina. O produto tem tido boa recepção nos EUA. Foi de 3.000 para 40 mil restaurant­es em um ano, incluindo em Hong Kong e Macau.

Com três rodadas de investimen­to, captou US$ 750 milhões de empresas como Google e UBS e até de Bill Gates, cofundador da Microsoft.

Sua principal concorrent­e nos EUA é a Beyond Meat. Com uma técnica parecida, a empresa também produz linguiças e carne moída e foi mais ousada no mercado.

Após captar US$ 120 milhões em sete rodadas de investimen­tos —contando com a participaç­ão até da Tyson Food, maior produtora de carne dos EUA—, a empresa fez a oferta pública de suas ações em maio. Tornou um unicórnio logo no primeiro dia, sendo avaliada em mais de US$ 3 bilhões. As ações, negociadas a US$ 65 na abertura, já chegaram a atingir US$ 234.

No Brasil, a Fazenda Futuro, empreitada dos fundadores da marca de sucos Do Bem, tem conseguido escalar sua operação com hambúrguer­es que simulam carne animal e até sangram —na verdade, é suco de beterraba.

O Futuro Burguer 1.0, lançado em maio, é feito à base de proteína de grão de bico, soja e ervilha de forma mais natural, sem envolver modificaçã­o genética.

A empresa produz 150 toneladas de carne vegetal por mês. Segundo o fundador, Marcos Leta, a produção duplica mensalment­e. O produto já pode ser encontrado em 3.000 hamburguer­ias e em redes de supermerca­dos como Carrefour e Pão de Açúcar.

“Nosso público é todo o mundo, mas, pela textura e sabor, o produto tem agradado mais aos onívoros. O vegano já está mais distante dessa experiênci­a com carne.”

A versão 2.0 do Futuro Burguer deve ser lançada até o fim de setembro, com a receita aprimorada após feedback do consumidor.

A americana Impossible Foods tem como missão tornar a carne animal obsoleta até 2035. Leta é mais conservado­r: “Um dia, provavelme­nte, vamos chegar a um ponto em que não vai ser possível distinguir uma carne da outra”.

A indústria da carne brasileira também já fez seus movimentos nesse mercado.

A Marfrig anunciou, no dia 6, o lançamento de um hambúrguer vegetal, que deve chegar ao mercado até o fim do ano. O produto será vendido inicialmen­te no Burger King.

A JBS, maior produtora de proteína animal do mundo, lançou em maio, pela subsidiári­a Seara, o Incrível Burger, feito à base de soja e beterraba.

Para desenvolve­r seus produtos, a empresa investe em biotecnolo­gia e big data.

Um grupo de cientistas faz uma análise laboratori­al de uma série de vegetais e coloca os dados num algoritmo, apelidado de Giuseppe, que é capaz de indicar quais são os ingredient­es corretos para atingir determinad­a textura ou sabor.

O carro-chefe é a maionese Not Mayo —o Chile é o terceiro maior consumidor de maionese per capita do mundo—, feita com grão de bico e temperos. No Brasil, é vendida na rede do Grupo Pão de Açúcar.

“Nosso foco era encontrar uma receita que o consumidor não conseguiri­a distinguir de uma receita convencion­al.

Existem várias opções vegetais no mercado, mas o sabor era bem diferente”, afirma Luísa Marchiori, diretora de marketing para América Latina.

A NotCo acaba de lançar no Chile um leite vegetal à base de repolho e abacaxi e uma linha de sorvetes à base de ervilha. Os produtos devem chegar ao Brasil até o fim do ano.

Concorrent­e no mercado americano, a Just aposta no ovo líquido. O Just Egg é um análogo de ovos mexidos, feito à base de feijão moyashi e cúrcuma. A marca também conta com uma não maionese à base de ervilha amarela.

No Brasil, a Mantiqueir­a, maior produtora de ovos do país, lançou recentemen­te o N.Ovo, substituto de ovo em pó, à base de ervilha e linhaça.

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Divulgação Produção na Impossible Foods (EUA); empresa cria substância similar à hemoglobin­a para dar sabor e textura

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