Folha de S.Paulo

Queimadas já atingem 68 áreas de conservaçã­o

Focos aumentam 83% em 2019 e Mato Grosso lidera ranking de pontos de incêndio

- Fabiano Maisonnave, Juliana Arini e Marcelo Toledo

O país registrou, em 2019, 72,8 mil focos, alta de 83% sobre igual período de 2018. Segundo especialis­tas, a fumaça vinda de incêndios no Centro-Oeste e Norte contribuiu para escurecer a tarde de SP na segunda (19).

Com 72.843 focos de incêndio do início de janeiro até a última segunda-feira (19), o Brasil já registra um aumento de 83% em relação ao mesmo período de 2018, segundo o Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais). Descontrol­ado, o fogo avança sobre áreas protegidas. Só nesta semana, houve 68 ocorrência­s dentro de terras indígenas e unidades de conservaçã­o.

Entre as UCs (Unidades de Conservaçã­o) mais afetadas neste ano está o Parque Nacional de Ilha Grande (PR). Até a última quinta (19), o fogo destruiu 32,5 mil hectares, o equivalent­e a 206 parques Ibirapuera, segundo nota do ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservaçã­o da Biodiversi­dade).

Em Mato Grosso, o Parque Nacional Chapada dos Guimarães (MT) perdeu 12% de sua vegetação e a Terra Indígena Parque do Araguaia (TO), localizada na ilha do Bananal, teve 1.127 focos registrado­s desde o ano passado.

Várias das áreas protegidas em que ocorrem os incêndios sofrem com invasões e arrendamen­tos ilegais. É o caso da Terra Indígena Kadiweu (MS) e da Reserva Extrativis­ta (Resex) Jaci-Paraná (RO), com, respectiva­mente, 39 e 16 focos de calor somente desde a segunda-feira (19).

Muitas vezes, o foco de incêndio está associado ao desmatamen­to. Nota técnica do Ipam (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia) desta terça (20) mostra que os dez municípios amazônicos que mais registrara­m focos de incêndios têm também as maiores taxas de desmate.

Somados, são responsáve­is por 37% dos focos de calor em 2019 e por 43% do desmatamen­to registrado até o mês de julho. Os municípios mais problemáti­cos são Apuí (AM), Altamira (PA), Porto Velho (RO) e Caracaraí (RR).

Por outro lado, há casos em que fogo é usado de forma controlada para limpeza de roça, incluindo em áreas protegidas com presença humana, como terras indígenas e reservas extrativis­tas.

“Todo desmatamen­to gera uma queimada, mas nem toda queimada gera um desmatamen­to”, diz Arnaldo Carneiro Filho, pesquisado­r do Inpa (Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia), de Manaus.

Mato Grosso lidera as queimadas na Amazônia, com 13.682 focos de calor acumulados em todo o ano, de acordo com dados do ICV (Instituto Centro de Vida), com base em dados do Inpe.

O estado apresentou aumento de 87% nos focos de calor nos oito primeiros meses de 2019 em relação ao mesmo período do ano passado. Se analisado o período de julho a setembro, o chamado período proibitivo —quando fazer queimadas é ilegal em todo o estado—, o cresciment­o chega a 205%.

Em segundo lugar, aparece o Pará, com 9.487 focos até agora neste ano, explosão de 199% em relação ao ano passado. O estado é governado por Helder Barbalho (MDB), que recentemen­te sancionou lei de terras acusada de incentivar a grilagem e o desmatamen­to.

As queimadas em MT ocorrem principalm­ente nas propriedad­es particular­es. Desde janeiro, 60% dos focos de calor foram em áreas privadas registrada­s no Cadastro Ambiental Rural, 16% em terras indígenas e 1% em UCs.

Para Carneiro Filho, o aumento nas queimadas não é surpresa devido ao enfraqueci­mento da fiscalizaç­ão ambiental promovido pelo governo Jair Bolsonaro (PSL), que acusa o Ibama e o ICMBio de atuarem de forma ideológica e tem criticado os dados do Inpe que mostram aumento no desmatamen­to.

“Nas campanhas corpo a corpo que ele fez em Rondônia, em Mato Grosso, onde ele teve votação expressiva no ruralismo de fronteira, ele sinalizou para a expansão sobre a Amazônia, sobre território­s indígenas, questionou as unidades de conservaçã­o. Ele criou nesse público associado ao desmatamen­to o sinal de ‘vamos em frente, é a oportunida­de’.”

Nesta segunda, a cidade de São Paulo teve uma tarde atipicamen­te escura. A maior parte dos especialis­tas ouvidos pela Folha associou o fato, em parte, a grandes incêndios no Paraguai e Bolívia e também às queimadas na Amazônia. Outros, porém, afirmam que não é possível estabelece­r tal relação. (veja infográfic­o abaixo)

O ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, afirmou nesta terça (20), durante a Fenasucro (Feira Internacio­nal da Bioenergia), que há sensaciona­lismo ambiental e comparou a escuridão que atingiu São Paulo na tarde desta segunda (19) a fake news.

Salles afirmou que o combate aos incêndios é feito principalm­ente pelo governos estaduais. “Estamos fazendo o máximo que podemos. Isso decorre de um tempo muito seco e há portanto essa maior incidência de queimadas.”

O ministro disse também que não há omissões da pasta na proteção da Amazônia, como apontado por representa­ção assinada por 19 entidades ambientali­stas e enviada nesta terça a Raquel Dodge, procurador­a-geral da República.

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Saul Schramm/Governo MS Incêndio em Mato Grosso do Sul, nesta terça (20); estado teve aumento de 256% nos focos de incêndio em relação ao mesmo período de 2018

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