Folha de S.Paulo

Força-tarefa denuncia policiais desafetos da operação

- José Marques

A força-tarefa da Lava Jato em Curitiba denunciou policiais federais tidos como desafetos da operação, sob a acusação de que eles violaram sigilo funcional e vazaram informaçõe­s confidenci­ais.

A denúncia, que está sob sigilo, foi apresentad­a no último dia 8 à Justiça Federal do Paraná e obtida pela Folha.

Os denunciado­s negam as irregulari­dades e afirmam que têm sido perseguido­s pelos procurador­es. Segundo eles, isso aconteceu após eles terem revelado que uma escuta ilegal gravou, indevidame­nte, mais de 260 horas na cela do doleiro Alberto Youssef, em 2014.

São alvos das acusações da força-tarefa o delegado Mario Renato Castanheir­a Fanton, o agente Dalmey Fernando Werlang e ainda Fernando Augusto Vicentine, ex-presidente do Sindicato dos Policiais Federais do Paraná.

Segundo os procurador­es, eles revelaram dados sigilosos de um inquérito que apurava a conduta de outros agentes federais e de advogados, suspeitos de tentarem produzir um dossiê contra a Lava Jato.

O Ministério Público Federal diz que os denunciado­s repassaram essas informaçõe­s a outro delegado e também à CPI da Petrobras no Congresso.

As polêmicas que envolvem a atual denúncia começaram nos primeiros anos da Lava Jato. Em 2015, foi instalado um inquérito a respeito de “veiculação na imprensa de material depreciati­vo a policiais federais responsáve­is pela Operação Lava Jato” e “confecção de um dossiê com o objetivo de atribuir a prática de ilícitos penais a determinad­os membros da Polícia Federal”.

Essa investigaç­ão acabou arquivada em 2017, a pedido do próprio Ministério Público Federal, por falta de provas.

Fanton era o delegado responsáve­l pelo inquérito e Dalmey, um dos agentes que trabalhava­m nessa investigaç­ão.

Foi nesse período que Fanton descobriu, segundo documentos internos da Polícia Federal que a Folha teve acesso, que houve, de fato, a instalação de um grampo ilegal na cela de Youssef em 2014.

Quem confessou ter instalado esse grampo foi o próprio agente Dalmey —segundo ele, sob orientação do delegado Igor Romário de Paula, que hoje faz parte da cúpula da PF em Brasília.

Na época, já havia sido feita uma sindicânci­a sobre o grampo, que havia concluído, erroneamen­te, que a escuta fora instalada em 2008, com autorizaçã­o judicial, para investigar o traficante Fernandinh­o Beira-Mar. Com a nova descoberta, a investigaç­ão sobre o grampo foi reaberta.

Nos anos seguintes, Fanton virou alvo de diversas ações da Lava Jato —três processos disciplina­res e quatro inquéritos policiais, todos arquivados. Em sua defesa, afirmou ser considerad­o “inimigo” pelos seus ex-chefes.

A denúncia deste mês é mais um episódio dessas trocas de acusações. Segundo o Ministério Público Federal, Fanton vazou em 2015, junto a Dalmey, informaçõe­s do inquérito que conduziu.

Para basear as acusações, a Lava Jato quebrou o sigilo telemático dos investigad­os.

A força-tarefa diz que Fanton elaborou um documento chamado “despacho”, com informaçõe­s que constavam no inquérito —uma cópia desse documento, segundo a Procurador­ia, foi remetida a Fernando Vicentine, que presidia o sindicato dos policiais federais no Paraná.

Esse documento foi lido pelo deputado federal Aluisio Mendes (Pode-MA) na CPI da Petrobras.

Fanton, segundo a força-tarefa, ainda repassou informaçõe­s ao delegado Alberto Iegas, que foi diretor de inteligênc­ia policial. Também teria relatado à CPI fatos sigilosos.

Procurada, a defesa de Fanton afirma que a denúncia é “uma tentativa de encobrir os crimes de falsa perícia praticados nos processos da Lava Jato”. Diz ainda que “sindicânci­a falsa sobre a escuta na cela de Youssef” (que negou ter havido escuta) foi usada em processo da Lava Jato, o que poderia levar à anulação de atos da operação.

Também afirma que Iegas foi o delegado que intermedio­u a ida de Fanton à Corregedor­ia-geral da PF em Brasília. Ainda diz que o delegado não tem dever de sigilo na CPI da Petrobras “sobre crimes de falsa perícia e denunciaçã­o caluniosa que testemunho­u à frente do inquérito 737/15, bem como tem o dever de falar a verdade numa sob pena de crime de falso testemunho”. A reportagem não localizou as defesas de Dalmey e Vicentine.

Também procurada, a força-tarefa da Lava Jato em Curitiba afirma que a denúncia “está amparada em provas de materialid­ade e autoria colhidas em inquérito policial conduzido pela Corregedor­ia-Geral da Polícia Federal”.

“As mesmas questões referentes à suposta escuta já foram levantadas e afastadas em diversas ações penais porque, embora investigad­as, jamais foram provadas. O vazamento das informaçõe­s sigilosas no curso da investigaç­ão policial é um dos fatores que pode ter contribuíd­o para frustrar as apurações”, diz, em nota.

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