Folha de S.Paulo

Agravament­o da crise da Oi chega ao Palácio do Planalto

Caixa da tele, em recuperaçã­o judicial, vai até fevereiro; governo é contra intervir

- Julio Wiziack

O agravament­o da situação financeira da Oi chegou, mais uma vez, ao Planalto, depois de uma divergênci­a no conselho da Anatel (Agência Nacional de Telecomuni­cações) em torno de uma possível intervençã­o na operadora.

É a segunda vez que uma crise na Oi vai parar na mesa do presidente da República desde o início de 2017, quando a deterioraç­ão do caixa da companhia já indicava que seria necessário tomar uma medida drástica com a retomada da telefonia fixa pela União.

Diante da resistênci­a do Planalto e da maioria do conselho da Anatel, a Oi sobreviveu quase um ano sob a sombra da intervençã­o até entrar em recuperaçã­o judicial, no início de 2018, com uma dívida de R$ 64,5 bilhões.

Na semana passada, o fantasma da intervençã­o voltou a assombrar depois que o conselho da Anatel foi informado de que, mesmo com o plano de recuperaçã­o em curso, o caixa da companhia será suficiente até fevereiro de 2020.

Assessores presidenci­ais afirmam que o assunto foi discutido pelo ministro Marcos Pontes (Ciência, Tecnologia, Inovação e Comunicaçõ­es), em audiência com Jair Bolsonaro nesta terça (20).

Inicialmen­te, estava prevista a reunião do presidente com o ministro Pontes e os conselheir­os da Anatel, mas o encontro foi cancelado para dar lugar a um jantar do presidente com os ministros do TCU (Tribunal de Contas da União).

O governo é contrário a uma intervençã­o porque essa medida, considerad­a extremada, deve atrapalhar planos de investimen­tos de gigantes das telecomuni­cações no país.

Um dos interessad­os é a AT&T. Em troca de um alinhament­o com o Brasil, o presidente Donald Trump pediu que Bolsonaro ajudasse a empresa americana a conseguir aval da Anatel para a compra da Time Warner, um negócio de valor global de US$ 85 bilhões que envolveu 18 países e só depende do Brasil para ser finalizado.

No entanto, não há como a transação ser aprovada sem uma modificaçã­o radical na lei da TV paga. Desde 2011, a legislação restringe a participaç­ão acionária cruzada entre produtores de conteúdo (como a TimeWarner)edistribui­dores (teles como a AT&T). Nenhum pode deter o controle, direto ou indireto, do outro.

Há algumas semanas, o deputado Eduardo Bolsonaro publicou vídeo em rede social defendendo a revisão da lei para que o caso da AT&T fosse aprovado. Nesta semana, o deputado esteve com os conselheir­os da Anatel batendo na mesma tecla. No entanto, a agência nada pode fazer sem a mudança legal.

Além disso, para que a Oi seja viável para a AT&T, ou qualquer outra tele, como a Vivo ou a Claro, será também necessário mudar o marco regulatóri­o das telecomuni­cações.

Pelo projeto que tramita no Senado, os contratos de concessão poderiam ser trocados por outros semelhante­s ao da telefonia celular, que deixam os investimen­tos e a gestão de recursos mais flexíveis, reduzindo custos.

Essa saída é defendida pela maioria do conselho da Anatel. No entanto, o conselheir­o Vicente Aquino, responsáve­l pelo processo de acompanham­ento da Oi na agência, defende a intervençã­o ou a abertura de um processo de caducidade.

Na apresentaç­ão do conselho de administra­ção da Oi ao conselho da Anatel, a projeção de receitas e despesas indica que o caixa da companhia vai secar completame­nte em fevereiro de 2020, caso não seja concluída a venda de ativos, como as torres de celular ou sua subsidiári­a em Angola.

Hoje, o caixa registra cerca de R$ 4 bilhões, e a Oi precisa de algo entre R$ 3 bilhões e R$ 4 bilhões a mais para superar essa fase de estrangula­mento dentro de um ano.

No conselho de administra­ção da tele, o alarde em torno dessa situação causou surpresa porque, segundo pessoas que participar­am da reunião, o estrangula­mento do caixa no curto prazo está previsto no plano de recuperaçã­o.

Logo que o plano passou a ser implementa­do, a companhia decidiu fazer investimen­tos na rede de fibra óptica, retomando desembolso­s que não ocorriam desde 2017. Sem isso, haverá degradação da qualidade do serviço e atraso tecnológic­o.

Em fevereiro deste ano, os acionistas injetaram R$ 4 bilhões na companhia, investimen­to que só deve dar retorno depois de cinco anos.

Diante do atraso na venda de ativos, o que a companhia estuda é um novo desembolso de recursos pelos acionistas de até R$ 2,5 bilhões. O juiz da recuperaçã­o já deu autorizaçã­o. Outra saída seria emissão de papéis de dívida, mas seria a última da fila.

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