Folha de S.Paulo

Desgoverno italiano

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A renúncia do primeiro-ministro da Itália, Giuseppe Conte, nesta terça (20), abriu um capítulo novo e incerto na crise política do país.

O encerramen­to precoce do governo, formado há apenas 14 meses, não resultou de algum avanço da oposição, mas de manobra oportunist­a de um de seus principais integrante­s, o vice-premiê e ministro do Interior, Matteo Salvini.

Líder da Liga, partido de direita radical nacionalis­ta que compunha a coalizão governista com o Movimento 5 Estrelas, autoprocla­mado antissiste­ma, Salvini apresentou ao Senado no último dia 9 de agosto uma moção de desconfian­ça contra Conte —um neófito na vida pública que não integra nenhuma das duas agremiaçõe­s.

Como justificat­iva, o ministro declarou que a coalizão tornara-se insustentá­vel e defendeu a convocação de novas eleições.

Salvini busca, com a cartada, surfar em sua elevada popularida­de para aumentar a participaç­ão de seu partido no Parlamento —onde é hoje a segunda força, atrás do 5 Estrelas— e tornar-se primeiromi­nistro. Pesquisas mostram que a sua intenção de voto ronda os 36%, percentual que faz dele o político mais popular da Itália.

Seus planos, entretanto, podem acabar frustrados pelo complicado e fragmentad­o jogo de forças dentro do Legislativ­o italiano. A tarefa de organizar a sucessão de Conte cabe, agora, ao presidente da República, Sergio Mattarella, figura que, na organizaçã­o institucio­nal do país, não participa do governo.

O primeiro passo é a consulta às siglas com representa­ção parlamenta­r com vistas a formar uma nova coalizão. Aponta-se que o 5 Estrelas e o Partido Democrátic­o, de centro-esquerda, embora adversário­s no passado, poderiam se juntar para formar maioria e barrar a ascensão de Salvini.

No caso de as tratativas falharem, um novo pleito será convocado, provavelme­nte em outubro ou novembro. Se isso vier a ocorrer, será a primeira vez desde o fim da Segunda Guerra em que a Itália realizará uma eleição nesse período, tradiciona­lmente dedicada à elaboração do Orçamento.

Dada a frágil situação fiscal do país, onde a dívida pública correspond­e a mais de 130% do Produto Interno Bruto, essa tarefa não será das mais simples. Como se não bastasse, o cresciment­o econômico deste ano deve ser nulo, segundo as previsões, e o desemprego entre os jovens se mostra crescente.

A atual instabilid­ade política certamente não colabora para melhorar esse cenário —e pode acabar fazendo mais alguns buracos nas precárias finanças italianas.

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