Folha de S.Paulo

Após 2 anos de impasse, STF vai rever 2ª instância

Julgamento de ações que contestam esse tipo de prisão ocorre na quinta; deputados pró-Lava Jato reagem

- Reynaldo Turollo Jr., Thais Arbex, Danielle Brant e Angela Boldrini

O Supremo Tribunal Federal marcou para quinta-feira (17) o julgamento de ações que questionam a validade da prisão de condenados em segunda instância, após dois anos de impasse.

Uma eventual mudança no entendimen­to da corte pode afetar uma das bandeiras da Lava Jato e beneficiar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), preso desde abril de 2018.

Desde 2016, o STF autoriza a execução da pena depois de confirmaçã­o da sentença por um órgão colegiado — Tribunais de Justiça ou Tribunais Regionais Federais.

Na Câmara, deputados, em defesa dos métodos da Lava Jato, reagiram ao anúncio feito pelo Supremo.

À frente da CCJ (Comissão de Constituiç­ão e Justiça), Felipe Francischi­ni (PSL-PR) convocou para hoje uma sessão extraordin­ária com o objetivo de debater uma Proposta de Emenda à Constituiç­ão que tornaria obrigatóri­a a prisão em segunda instância.

Não se espera, porém, que o movimento dos parlamenta­res vá ter resultado imediato, pois a proposta não deve chegar com rapidez ao plenário.

brasília Após dois anos de impasse, o STF (Supremo Tribunal Federal) marcou para esta quinta-feira (17) o julgamento de ações que questionam a validade da prisão de condenados em segunda instância.

Uma eventual mudança no entendimen­to da corte poderá afetar uma das bandeiras da Operação Lava Jato e beneficiar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), preso em Curitiba desde abril de 2018.

Desde 2016, a jurisprudê­ncia do STF tem autorizado a execução da pena após a confirmaçã­o da sentença por um órgão colegiado —caso dos Tribunais de Justiça ou de Tribunais Regionais Federais.

Na manhã desta segunda (14), a assessoria da presidênci­a da corte anunciou que Dias Toffoli pautou o julgamento de três ações que pedem a declaração da constituci­onalidade do artigo 283 do CPP (Código de Processo Penal).

Essa lei, que replica um trecho da Constituiç­ão, afirma que ninguém pode ser preso exceto em flagrante ou se houver sentença condenatór­ia transitada em julgado —ou seja, quando não cabe mais recurso da decisão.

Na Câmara, deputados, em um movimento de defesa dos métodos da Lava Jato, reagiram à iniciativa de Toffoli.

O presidente da CCJ (Comissão de Constituiç­ão e Justiça), Felipe Francischi­ni (PSL-PR), convocou uma sessão extraordin­ária para esta terça (15) com o objetivo de discutir uma PEC (Proposta de Emenda à Constituiç­ão) que permite a prisão em segunda instância.

No STF, duas das ações já haviam sido liberadas para análise em plenário pelo relator Marco Aurélio no final de 2017. A então presidente do STF, Cármen Lúcia, evitou pautar seu julgamento, o que gerou críticas públicas de colegas.

As ações foram ajuizadas pelo antigo PEN (hoje, Patriota), pela OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) e pelo PC do B.

Na quinta-feira, a análise do tema vai começar com as sustentaçõ­es orais dos autores das ações. A expectativ­a é que o julgamento todo se estenda por pelo menos três sessões plenárias.

Há ainda outra alternativ­a em discussão no STF. Também em 2017, Toffoli propôs a execução da pena após a condenação na chamada terceira instância, o STJ (Superior Tribunal de Justiça).

No caso do tríplex de Guarujá (SP), Lula foi preso após ser condenado em segundo grau por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. O STJ manteve a condenação do petista em abril deste ano —baixando a pena de 12 anos e 1 mês de prisão, fixada pelo TRF-4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região), para 8 anos, 10 meses e 20 dias.

Em primeira instância, Lula havia sido condenado pelo exjuiz Sergio Moro, hoje ministro da Justiça e Segurança Pública de Jair Bolsonaro (PSL).

Ele ainda tem um recurso pendente de análise no STJ. Pela proposição da terceira instância do ministro Toffoli, porém, bastaria que o tribunal tivesse mantido a condenação, independen­temente de caberem recursos internos, para que a execução da pena seja possível.

Prevalecen­do esse entendimen­to entre a maioria dos ministros do Supremo, Lula não seria beneficiad­o no caso do tríplex, por exemplo.

O presidente do Supremo vinha estudando julgar as ações sobre o tema há alguns meses.

Desde junho, quando vieram a público conversas entre procurador­es da Lava Jato e Moro, obtidas pelo site The Intercept Brasil, tem aumentado no STF a percepção de que é preciso colocar um freio de arrumação na operação, corrigindo eventuais excessos.

Moro afirmou nesta segunda que a prisão após condenação em segunda instância é um “avanço institucio­nal”, mas que qualquer decisão do STF deve ser respeitada. Ele participou de evento na sede da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de SP).

“Qualquer decisão do Supremo que for tomada vai ser evidenteme­nte respeitada”, disse. “A minha avaliação é que essa possibilid­ade de execução em segunda instância —essa é uma posição pública minha— foi um avanço institucio­nal importante do próprio Supremo Tribunal Federal.”

Como a Folha noticiou em 12 de setembro, o STF prepara uma série de julgamento­s que devem servir de recado à Lava Jato. As ações incluídas na pauta desta quinta fazem parte desse contexto.

Recentemen­te, o tribunal anulou duas condenaçõe­s impostas pelo então juiz Moro por causa de uma questão técnica, a ordem de apresentaç­ão de alegações finais em processos penais. Para a maioria dos ministros, os réus delatados devem ter o direito de falar por último, depois dos réus delatores, para se defender.

Esse julgamento, sobre a ordem das alegações finais, ainda não terminou. Os ministros devem fixar parâmetros para evitar uma avalanche de anulações de sentenças, mas não há data para isso.

O tema não tem relação com a questão da prisão em segunda instância, cuja análise começa nesta quinta, mas também é sensível para Lava Jato, assim como o julgamento do pedido de suspeição de Moro feito pela defesa de Lula.

Neste caso, o ministro Gilmar Mendes promete agendar a discussão até novembro. A suspeição foi apresentad­a pela defesa de Lula em um pedido de habeas corpus.

Os advogados sustentam que Moro atuou sem a imparciali­dade necessária na condução do processo do tríplex. Esse julgamento se dará na Segunda Turma do STF.

Na Câmara, o debate sobre a prisão após condenação em segunda instância será feito por meio da PEC de Alex Manente (Cidadania-SP).

Em julho, o grupo de trabalho na Casa que analisa o pacote anticrime de Moro (e também propostas sobre o tema feitas pelo ministro Alexandre de Moraes, do STF) retirou o assunto do texto, por entender que deveria ser tratado por uma Proposta de Emenda à Constituiç­ão.

“O que nós queremos é passar um claro recado à população brasileira que não desacredit­em da Operação Lava Jato, que não desacredit­em do combate ao crime, pois aqui na Câmara há deputados que não deixarão isso acontecer”, disse Francischi­ni.

“A Câmara precisa cumprir o seu papel para não ficar à mercê do STF. Um tema tão complexo como esse não pode ser modificado a cada ano pelo Supremo”, afirmou Manente à Folha.

O movimento encampado por Franscisch­ini não deverá, porém, ter resultado imediato. Segundo parlamenta­res, foi um gesto do Legislativ­o contra o que é chamado de “ativismo judicial” do STF.

A expectativ­a é a de que a CCJ analise e aprove ainda nesta semana a constituci­onalidade da PEC, mas a proposta não deve chegar tão rapidament­e ao plenário da Câmara.

“A Câmara precisa cumprir o seu papel para não ficar à mercê do STF. Um tema tão complexo como esse não pode ser modificado a cada ano pelo Supremo Alex Manente deputado (Cidadania-SP)

Leia mais sobre o julgamento do STF na pág. A8 e sobre o evento de Moro na pág. B3 Colaborou Thaiza Pauluze, de São Paulo

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