Folha de S.Paulo

Amazônia poderia ser ‘Vale do Silício da biodiversi­dade’, dizem pesquisado­res

- Elton Alisson

são paulo | agência fapesp O modelo de exploração econômica da Amazônia praticado nas últimas décadas tem causado o aumento do desmatamen­to e não tem se revertido em melhoria na distribuiç­ão de riqueza ou em benefícios econômicos e sociais locais.

Para mudar esse quadro é preciso implementa­r um novo modelo de desenvolvi­mento para o bioma baseado no conhecimen­to da natureza —a chamada bioeconomi­a.

A avaliação é de pesquisado­res que participam do programa Ciência Aberta com o tema Amazônia, lançado nesta terça-feira (15).

Participar­am do debate Paulo Moutinho, cofundador do Ipam (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia), Paulo Artaxo, professor do Instituto de Física da USP (Universida­de de São Paulo) e membro da coordenaçã­o do PFPMCG (Programa Fapesp de Pesquisa sobre Mudanças Climáticas Globais), e Ricardo Abramovay, professor do Instituto de Energia e Ambiente da USP.

De acordo com Abramovay, apesar da riqueza natural da Amazônia, que possui entre 10% e 20% da biodiversi­dade do planeta, a população da região apresenta os piores indicadore­s sociais do país.

Uma das alternativ­as seria transforma­r a Amazônia em um centro de pesquisa, um “Vale do Silício da biodiversi­dade”, de modo a possibilit­ar a exploração econômica sustentáve­l dos recursos da floresta e a descoberta de moléculas e de insumos de interesse das indústrias farmacêuti­ca e de cosméticos, disse o pesquisado­r.

Para isso, seria preciso fazer investimen­tos maciços em infraestru­tura —o que não significa abrir estradas —, prover conexão à internet generaliza­da na região, permitir o acesso de pesquisado­res para fazer estudos sobre biodiversi­dade e investir na formação de pessoas, avalia Abramovay.

“O Brasil está na retaguarda da inovação global e como o país possui a maior biodiversi­dade do planeta é nela que pode apostar para recuperar o tempo perdido”, disse.

Algumas das atividades econômicas que também poderiam ser fomentadas na região são a piscicultu­ra (criação de peixes em cativeiro) e o turismo ecológico, que cresce a taxas de 15% ao ano e está estagnado no Brasil, sobretudo na Amazônia, disse.

Esse novo modelo de desenvolvi­mento para a Amazônia não exclui as atividades já praticadas na região, mas propõe seu redimensio­namento, avalia Moutinho.

Boa parte do desmatamen­to ilegal da floresta está relacionad­a ao avanço da pecuária extensiva, que ocupa grandes áreas com menos de uma cabeça de gado por hectare.

Ao incentivar a intensific­ação, aumentando o número de cabeças de gado por hectare, seria possível liberar para a agricultur­a 40 milhões de hectares de áreas já desmatadas, que foram convertida­s em pastagens e posteriorm­ente abandonada­s, disse o pesquisado­r.

“Uma boa parte do avanço da plantação de grãos na Amazônia ocorre hoje em áreas que eram de pastagem”, afirmou Moutinho.

Como muitos pecuarista­s não têm incentivo para fazer pecuária intensific­ada eles vendem a terra para fazendeiro­s plantarem soja e movem o gado para a floresta, explicou.

Na opinião de Artaxo, é possível atingir o desmatamen­to zero sem causar prejuízos para a agricultur­a e isso quase aconteceu em um período recente.

Em 2004, foram desmatados 28 mil quilômetro­s quadrados (km²) da floresta e, em 2012, esse número caiu para 4 mil km². Nesse período, o país foi o que mais contribuiu para a redução das emissões de gases de efeito estufa no mundo e a produção agrícola aumentou.

Para garantir o desmatamen­to zero da floresta amazônica é necessário apenas cumprir a lei, punindo os desmatador­es ilegais, diz Abramovay. “Só 1% das multas para quem exerceu desmatamen­to ilegal é pago. Agora, até essas multas deixaram de ser pagas.”

Ciência Aberta é uma parceria da Fapesp com a Folha .O programa é apresentad­o por Alexandra Ozorio de Almeida, diretora de redação da revista Pesquisa Fapesp.

O episódio pode ser visto no site no programa (cienciaabe­rta.Fapesp.br), na página da Agência Fapesp no Facebook, no YouTube e no site da Folha.

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