Folha de S.Paulo

STF de hoje não bate com o da decisão de 2017

- Hélio Schwartsma­n helio@uol.com.br

são paulo Juízes juram de pés juntos que, na hora de julgar, levam em conta apenas provas e teses jurídicas, mas qualquer um que já tenha aberto um livro de psicologia sabe que não é bem assim. Magistrado­s, a exemplo de outros humanos, são influencia­dos por uma infinidade de fatores, que incluem humores políticos, importânci­a dos réus, preferênci­as ideológica­s e até parâmetros fisiológic­os.

Ficou famoso o estudo israelense que mostrou que a probabilid­ade de um preso conseguir a condiciona­l é muito maior quando seu caso é analisado após o intervalo para o lanche, quando os julgadores estão descansado­s e alimentado­s.

Um bom exemplo nativo de que a tese jurídica nem sempre é a rainha do pedaço está no habeas corpus 137.316, em que os réus pediam revisão de sua condenação alegando uma série de afrontas ao princípio da ampla defesa, incluindo a ordem das alegações finais. A peça dizia que, entre outros abusos, não fora dada aos acusados que não colaborara­m com o MP a oportunida­de de apresentar seus memoriais depois dos dos réus colaborado­res.

O habeas corpus foi julgado pela Segunda Turma do STF em 2017. O relator do caso foi Gilmar Mendes, que considerou os argumentos dos réus “impertinen­tes” e rejeitou-os, sendo acompanhad­o por todos os outros ministros da turma, incluindo Ricardo Lewandowsk­i e Celso de Mello. Os três são autores dos votos que, agora, quando a mesmíssima questão foi reapresent­ada à corte, mais apaixonada­mente insistiram na necessidad­e de dar aos réus não colaborado­res a última palavra, falando até em nulidade absoluta.

É claro que nem todos os casos concretos se assemelham e que, por vezes, até juízes cochilam (embora não devessem). Mas me parece complicado conciliar a veemência de hoje com a unanimidad­e da decisão de 2017. A melhor explicação, creio, é a mudança dos ventos políticos, que já ganhou força para tornar-se uma depressão tropical.

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil