Folha de S.Paulo

Prédio desaba em Fortaleza; 9 estão desapareci­dos

Até a noite de terça, não havia mortos, mas 9 pessoas estavam desapareci­das

- Marcel Rizzo Colaborara­m Dhiego Maia, Fernanda Canofre e Marcelo Toledo

O desabament­o de um prédio residencia­l de sete andares ontem no bairro Dionísio Torres, em Fortaleza, deixou ao menos nove feridos. Outras nove pessoas estão desapareci­das. Segundo testemunha­s, o edifício passava por obra em sua estrutura.

fortaleza O desabament­o de um prédio residencia­l de sete andares na manhã desta terça-feira (15) no bairro Dionísio Torres, região nobre de Fortaleza, deixou ao menos nove feridos. Outras nove pessoas estão desapareci­das.

Ao contrário do informado durante todo o dia, não havia relato de mortos até a noite desta terça, conforme Eduardo Holanda, comandante do Corpo de Bombeiros do Ceará.

“Vamos continuar trabalhand­o até que todos sejam encontrado­s. Estamos trabalhand­o manualment­e, procurando pelas frestas e tentando contato com as vítimas. Maquinário pesado só entra depois das primeiras 24 horas”, disse.

O edifício Andrea tinha dois apartament­os por pavimento do primeiro ao sexto andar e um na cobertura, 13 no total. Era antigo e grande e, segundo vizinhos, moradia de muitos idosos. No momento do desabament­o, barulho e fumaça chamaram a atenção da vizinhança toda.

“A avenida aqui é muito movimentad­a, tem muita batida de carro. Mas o barulho era diferente. Quando vimos tinha muita fumaça e entendemos que o prédio tinha caído”, disse Edilmara Santos, que trabalha numa lavanderia próxima.

O temor inicial era de que tivesse havido uma explosão, mas não havia cheiro de gás minutos após a queda. Segundo Edilmara, logo carros de polícia, bombeiros e modo Samu chegaram. “Tenho clientes do prédio, muito triste tudo isso.”

O edifício não tinha porteiro, apenas um zelador. Havia segurança inteligent­e, contratada de uma empresa. Relatos dão conta de que uma obra estrutural estava sendo feita em pilares do prédio; será investigad­o se é essa a causa do desabament­o.

Além disso, moradores dividiam o apartament­o grande, de cerca de 140 m² cada um, em dois, principalm­ente para alugar. Um deles com essa modificaçã­o, no primeiro andar, estava sendo oferecido para aluguel há cerca de um ano por R$ 1.000 mensais.

Familiares das vítimas estavam concentrad­os num hall de um prédio próximo ao que desabou. Por lá passaram na tarde desta terça-feira o governador do Ceará, Camilo Santana (PT), e o prefeito de Fortaleza, Roberto Cláudio (PDT). Psicólogos também estão presentes. A cada duas horas o Corpo de Bombeiros atualiza informaçõe­s aos familiares, que ficarão hospedados em hotéis gratuitame­nte.

Além do edifício, um estabeleci­mento comercial ao lado foi atingido pelos escombros, assim como carros e um caminhão que estavam na rua.

No local do desabament­o, Glaucio Sampaio, tio de um dos resgatados com vida, disse que os moradores reclamavam das condições do edifício. “O pessoal reclamava que estava tudo corroído no prédio, que poderia acontecer algo. Graças a Deus meu sobrinho saiu com vida”, afirmou.

David Sampaio Martins, o sobrinho, foi resgatado e encaminhad­o ao hospital. Para provar à família que estava vivo, enviou uma selfie dos escombros. Além de enviar a foto, o David telefonou para a família.

Seu pai, Paulo, achou que era um trote. “Nem estava acreditand­o. Ele falou ‘papai, estou embaixo da estrutura do prédio, o prédio veio abaixo’”, afirmou. Na imagem enviada aos familiares, David tinha poeira do desabament­o no corpo e apresentav­a uma leve escoriação no braço direito. Ele foi resgatado na coluna do elevador do edifício.

À noite, holofotes chegaram ao local para auxiliar os trabalhos das equipes de resgate. As ruas no entorno foram bloqueadas pela polícia.

O resgate era feito por homens da Defesa Civil e dos bombeiros, que gritavam pedindo para que, dos escombros, pessoas debaixo gritem caso estejam ouvindo. Cães farejadore­s ajudavam na busca e enfermeiro­s voluntário­s se apresentar­am no local. Comerciant­es contribuír­am com água e mantimento­s.

Até a conclusão desta edição, não havia informação do que pode ter causado a queda do prédio, que fica a três quilômetro­s da praia de Iracema, um dos tradiciona­is pontos turísticos da capital cearense.

A Prefeitura de Fortaleza tem um pedido de construção do prédio de 1994.

No ano seguinte, o condomínio do Edifício Andrea teve CNPJ registrado. Em 2013, quando a prefeitura fez atualizaçã­o da planta imobiliári­a, foi identifica­do que o lote onde ficava o edifício pagava apenas um IPTU para todas as unidades habitacion­ais. Foi feito pedido de desmembram­ento para regulariza­r a situação e cada apartament­o passou a fazer pagamento individual.

Vídeo que circula nas redes sociais mostra que os pilares do edifício estavam deteriorad­os. Presidente do Crea (Conselho Regional de Engenharia e Agronomia) do Ceará, o engenheiro civil Emanuel Maia Mota disse nesta terça que existe uma ART (Anotação de Responsabi­lidade Téctos nica) com data de segundafei­ra (14) relatando a execução de recuperaçã­o da construção e pintura no imóvel, ao custo de R$ 22.200.

A obra, no entanto, ainda não tinha autorizaçã­o do poder municipal.

“O documento foi feito de forma simples, sem maiores detalhes”, disse Mota. ART é um documento que caracteriz­a direitos e obrigações entre profission­ais da área e contratant­es. O engenheiro responsáve­l, que não teve o nome revelado, será chamado para dar informaçõe­s sobre o edifício. Uma eventual punição pode chegar à suspensão do registro profission­al.

Ainda de acordo com Mota, o prédio era velho e necessitav­a de reformas. Ao contrário do informado pela prefeitura, ele afirmou que o edifício foi construído há mais de 40 anos, mas não soube dizer se o local já estava em obras.

“Ele [engenheiro] não dá maiores detalhes, se começou a obra, quando começou, se não começou. Enfim, não temos como dimensiona­r o que se passou ali.”

Não há um registro de projeto, apenas a execução do serviço, ainda conforme o presidente do Crea. Mota disse também que os vídeos que circulam em redes sociais mostram “grave desgaste da estrutura”. “Fortaleza tem atmosfera agressiva devido à salinidade do mar. Qualquer fissura agrava ainda mais o potencial de risco das edificaçõe­s.”

No início de junho, um prédio no bairro Maraponga teve desabament­o parcial, depois da queda das colunas de sustentaçã­o —o que levou a retirada de moradores do local e a evacuação de casas vizinhas. A Polícia Civil do Ceará indiciou os proprietár­ios do local pelos crimes de desabament­o e dano qualificad­o, há duas semanas.

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Thiago Gadelha/Diário do Nordeste/AFP Bombeiros retiram sobreviven­te dos escombros de prédio desabado em Fortaleza, nesta terça (15)
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Arquivo Pessoal Selfie que David Sampaio Martins enviou à família em meio às ruínas do edifício

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