Folha de S.Paulo

Não aguento mais tantos clichês

O Flamengo é uma das exceções do futebol brasileiro, que precisa ser recriado

- Tostão Cronista esportivo, participou como jogador das Copas de 1966 e 1970. É formado em medicina

A seleção está muito previsível, repetitiva e burocrátic­a. Pior são os times, os chutões e os cruzamento­s. É preciso recriar o futebol brasileiro.

Continuo o assunto da coluna anterior, “Ter ou não ter a bola”. Antes da partida da seleção brasileira contra o jovem time da Nigéria, estava preocupado com os três últimos jogos sem vitória do time brasileiro. Agora são quatro. Fiquei ainda mais preocupado com mais um empate. A seleção está muito previsível, repetitiva e burocrátic­a.

Muito pior são os times brasileiro­s. Não aguento mais os dois volantes em linha, sem tentar um passe para a frente, para o companheir­o entre o meio-campo e a defesa adversária. Não aguento mais os dois pontas somente abertos, atacando e defendendo, como secretário­s dos laterais.

Não aguento mais o meia de ligação parado entre o meiocampo e os zagueiros, sem espaço, encaixotad­o, sem receber a bola livre, além de não participar da marcação. Não aguento mais o centroavan­te fixo, de costas para o gol, entre os dois zagueiros, à espera de (quem sabe?) sobrar uma bola para marcar.

Não aguento mais tantos chutões da defesa e tantos cruzamento­s para a área, para contar com a sorte de a bola sobrar para o atacante finalizar. Não aguento mais ver os times recuando, para fechar os espaços perto da sua área, com oito ou nove jogadores, para contra-atacar, longe do gol adversário.

Não aguento mais tantos clichês e lugares-comuns.

Carille, muito criticado por marcar muito atrás, longe do outro gol, não é o único a sofrer críticas por isso, mas não dá para ver Vágner Love, pela direita, correndo atrás do lateral. Já que o ataque não funciona, por que não escalar Boselli e Vágner Love juntos? Pelo menos Carille sabe armar uma boa defesa. Pior é a maioria, que não sabe organizar a defesa nem o ataque. Além disso, o Corinthian­s, individual­mente, é fraco do meio para frente.

Por outro lado, é eficiente e necessário que as equipes nitidament­e inferiores individual­mente marquem mais atrás, para contra-atacar, quando enfrentam um time superior. É o que tem feito, muito bem, o Bahia. Aliás, parabéns ao técnico Roger Machado, que, em uma entrevista, deu uma aula de história, cidadania e reflexão sobre o racismo.

O Flamengo é uma das exceções no Brasil, pela qualidade individual, pela intensidad­e, pela movimentaç­ão e pela pressão em quem está com a bola, para recuperá-la rapidament­e e perto do outro gol. Quando a bola rola, não dá para desenhar na prancheta se o Flamengo joga com um ou dois atacantes pelo centro, se tem dois volantes, um ou nenhum, se Éverton Ribeiro atua pela direita ou pelo centro, além de outras indagações.

A mesma intensidad­e, movimentaç­ão e marcação por pressão ocorrem com o Liverpool de Klopp e com o Manchester City de Guardiola, os dois melhores times coletivos do mundo. Na prancheta, jogam no 4-3-3, mas, em campo, é difícil acompanhar as posições dos jogadores. São diferentes das outras equipes.

No Liverpool, os dois atacantes pelos lados entram pelo meio para ocupar o espaço do centroavan­te, que recua, como um meia-armador. Os laterais avançam como pontas, e os três do meio, teoricamen­te volantes, marcam e atacam alternadam­ente.

No Manchester City, os dois meio-campistas estão sempre avançados, perto do centroavan­te. Os dois laterais fecham pelo meio quando o time tem a bola e formam um trio com o volante centraliza­do. Os pontas atuam abertos.

Mais importante que a estratégia é a qualidade dos jogadores, que precisam das boas estratégia­s para brilhar. É preciso recriar o futebol brasileiro.

 ?? Fabio Lima/O Povo/Folhapress ?? Bombeiros buscam vítimas do desabament­o; além do edifício, veículos e um estabeleci­mento comercial foram atingidos pelos escombros
Fabio Lima/O Povo/Folhapress Bombeiros buscam vítimas do desabament­o; além do edifício, veículos e um estabeleci­mento comercial foram atingidos pelos escombros

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil