Turquia espera retorno em massa de sírios, diz chanceler
Operação contra curdos visa enviar 2 milhões de pessoas de volta à Síria; país abriga 3,5 milhões de refugiados
são paulo A Turquia espera que o estabelecimento da zona de segurança ao longo de sua fronteira com a Síria leve a um “retorno em massa” de refugiados sírios que estão em território turco, diz o ministro das Relações Exteriores da Turquia, Mevlut Cavusoglu.
“Queremos estabelecer um corredor de paz ao longo da fronteira da Síria [com a Turquia], onde os verdadeiros donos da Síria irão morar em paz, segurança e harmonia”, disse o chanceler em entrevista por email à Folha.
A Turquia abriga mais de 3,5 milhões de refugiados sírios e pretende, com a operação contra os curdos, enviar até 2 milhões de volta à Síria. A maior parte dos refugiados, no entanto, é árabe, e o território para onde serão mandados é de maioria curda.
Mesmo assim, Cavusoglu nega que a Turquia planeje uma “arabização” na região curda. Isso já foi feito antes, pelo regime sírio —nos anos 1970, o governo de Hafez al Assad confiscou terras dos curdos e reassentou famílias árabes no nordeste da Síria, diluindo a maioria curda e enfraquecendo-a politicamente.
Por que é necessário estabelecer uma zona de segurança ao longo da fronteira da Turquia com a Síria? Qual será a extensão e a profundidade dessa zona?
A Turquia está lutando contra uma série de organizações terroristas que representam uma ameaça para nossa segurança nacional.
Algumas encontraram um abrigo seguro na Síria, por causa do conflito que se instalou no país. Por meio de túneis cavados pela PYD/YPG ao longo das áreas fronteiriças, explosivos e munição têm sido contrabandeados para a Turquia para serem repassados à organização terrorista PKK.
Vínhamos negociando havia bastante tempo com os EUA o estabelecimento de uma zona de segurança. No entanto,
apesar dos nossos esforços, as negociações foram inconclusivas. Diante disso, lançamos no dia 9 de outubro a Operação Paz da Primavera, que será limitada, e nossa presença militar será temporária.
Qual é o objetivo final da operação?
Vamos manter a operação até que todos os terroristas tenham sido varridos da região, a segurança de nossas fronteiras tenha sido garantida e a população síria local tenha sido libertada da tirania do PYD/YPG, além da ameaça do Estado Islâmico.
Outro resultado positivo será o fortalecimento da integridade territorial da Síria, uma vez que a operação impedirá o PYD/YPG de impor sua agenda separatista.
Como ocorreu com nossas operações prévias no noroeste da Síria, só terroristas são alvos. Temos histórico consistente nas nossas duas operações prévias. Mostramos à comunidade internacional que é possível conduzir operações antiterrorismo sem atingir civis ou infraestrutura civil.
O presidente Erdogan pretende reassentar até 2 milhões de refugiados sírios que estão atualmente na Turquia. Não se trata de uma violação da lei humanitária que impede a devolução involuntária de refugiados para locais onde estejam sob ameaça?
A Turquia é o país que mais abriga refugiados no mundo e respeita integralmente a regra de non-refoulement. O retorno deve ser seguro e voluntário.
Mas o fardo da migração sobre a Turquia é pesado, não podemos receber outra onda de migração. Se prepararmos o esquema de segurança necessário, com condições físicas e de infraestrutura, os sírios estão dispostos a voltar.
Um dos objetivos da operação é permitir a volta segura e voluntária de refugiados sírios para seus lugares de origem e a outros locais que escolham dentro da Síria, obedecendo à lei internacional.
Esperamos que o estabelecimento da zona de segurança estimule o retorno em massa para a região. Até agora, mais de 365 mil sírios voltaram de forma voluntária e segura para as áreas que livramos de terroristas nas operações anteriores. Esperamos que mais sírios escolham voltar para sua pátria após a Operação Paz da Primavera estabilizar a área.
Onde os refugiados serão reassentados? A maioria dos refugiados sírios na Turquia é árabe e não é originalmente do nordeste da Síria. Há um potencial para conflitos com os habitantes atuais da área, que são curdos?
Quero deixar uma coisa muito clara: a Turquia não tem nenhum plano para modificar a estrutura demográfica na área. Ao contrário, essa operação tem como objetivo permitir a volta de sírios que foram desalojados por causa de ações da PYD/YPG, que cometeram crimes contra a humanidade, entre eles limpeza étnica.
Uma zona de segurança vai estimular esses sírios, inclusive os mais de 300 mil sírios curdos na Turquia, a voltar para suas casas. Queremos estabelecer um corredor de paz ao longo da fronteira, onde os verdadeiros donos da Síria irão morar em paz, segurança e harmonia.
A SDF afirmou que, com uma invasão turca, não teriam mais capacidade para policiar as prisões com milhares de combatentes do EI. A Turquia será responsável por esses combatentes?
Como o único país que se envolveu na luta corpo a corpo contra o EI na Síria, a Turquia considera que o destino dos terroristas presos do EI é de importância vital.
Nós iremos manter as conquistas na luta contra o EI e vamos lidar de forma eficiente com o problema dos terroristas estrangeiros. A única solução é a repatriação de todos os terroristas estrangeiros para seus países de origem. A comunidade internacional não deveria deixar o PYD/YPG explorar essa questão para tentar ganhar legitimidade e manter seu império de terror.