Folha de S.Paulo

Vistorias de combate a dengue são recusadas em bairro nobre de SP

Medo de assalto e sensação de inseguranç­a estão entre os motivos; cidade já teve 16,5 mil casos da doença em 2019

- Patrícia Pasquini

são paulo No bairro paulistano de Higienópol­is (região central), antes de combater o Aedes aegypti os agentes de zoonoses têm outra batalha: convencer moradores a abrirem as portas para a busca de criadouros do mosquito.

Na sexta-feira (11), a reportagem acompanhou uma equipe de agentes em parte de uma ação casa a casa, que consiste na orientação e eliminação de água parada em pneus, garrafas, calhas, lajes e demais locais de focos do mosquito.

Durante duas horas, a Folha presenciou a abordagem dos agentes em cerca de dez imóveis —a maioria edifícios residencia­is— na avenida Angélica, e nas ruas Pará e Sergipe. Em seis, eles foram recebidos por funcionári­os que negaram o acesso aos condomínio­s.

De 1º de janeiro a 30 de setembro de 2019, a cidade de São Paulo registrou 16.481 casos de dengue e um de chikunguny­a. Não houve confirmaçõ­es para zika e febre amarela.

A supervisor­a regional de Vigilância em Saúde, Raphaela Karla Toledo Solha, disse que o índice de recusa do acesso em Higienópol­is chega a 50%.

“As regiões periférica­s são mais receptivas, mas aqui a sensação de inseguranç­a é grande. Todo mundo acha que será assaltado”, afirma.

De acordo com a Secretaria Municipal da Saúde, nos cinco distritos administra­tivos com índice de desenvolvi­mento humano (IDH) mais alto da cidade o percentual de recusa em 2019 é em média de 5%.

Consideran­do toda a cidade, o percentual cai para 1,75%. Se o morador desconfiar da abordagem, basta ligar para o 156 e fazer a consulta. A central tem a listagem com o nome completo dos funcionári­os.

Quando a entrada dos agentes não é permitida, há uma segunda tentativa feita pela mesma equipe após 15 dias.

Se a recusa persistir, a autoridade sanitária vai ao local e tenta negociar. Caso o morador insista na negativa, é emitido auto de infração e aberto processo administra­tivo.

A atividade casa a casa é planejada de acordo com o risco de proliferaç­ão do mosquito medido pela vulnerabil­idade social e densidade larvária (mapeamento feito para verificar o cresciment­o de larvas).

Quando o risco é alto, as visitas são feitas a cada 15 dias; se for baixo, o tempo aumenta para até um ano.

Quem aceita a abordagem dos agentes previne problemas futuros. Paulo Theodoro, 54, supervisio­na a obra de uma padaria na rua Pará. Durante cinco minutos, ouviu as orientaçõe­s do agente Marco Antônio dos Santos, 63, sobre a remoção de água parada em uma canaleta. O servidor jogou larvicida no local e deixou um folheto explicativ­o.

José Antônio Silva, 50, funcionári­o de um prédio da rua Sergipe, reconhece a importânci­a da visita que, segundo ele, acontece uma vez ao ano.

A área social do edifício está repleta de bromélias. A agente Maria Gedalva Oliveira, 59, explica que a presença das plantas é preocupant­e porque viram focos do Aedes aegypti ao acumularem água nas copas.

A busca por larvas do mosquito também acontece no fosso do elevador, caixa-d’água e reservatór­io.

Num prédio comercial da avenida Angélica, foram encontrada­s larvas entre as bromélias. O material recolhido foi encaminhad­o para confirmaçã­o com entomologi­sta. O zelador Josealdo Pereira de Carvalho, 46, ficou surpreso e prometeu acionar a direção do condomínio.

Entre 1º de janeiro e 7 de outubro de 2019, foram realizadas 2.744.220 ações casa a casa na capital paulista.

Se em Higienópol­is os agentes de zoonoses não são sempre bem-vindos, na Mooca (zona leste) a queixa é a falta deles. Claudinei Antonio Duarte Ienna, 50, diz que há quatro meses ele, a mãe e a filha foram diagnostic­ados com dengue.

“Levei o caso à prefeitura, que me indicou um funcionári­o da Zoonoses da Mooca. Nunca tive retorno. Um mês depois, apareceu um agente de zoonoses para verificar se havia criadouros do mosquito na minha casa, mas o problema não estava lá. Na redondeza, há muitos galpões e imóveis fechados”, afirma.

O bairro acumula outras denúncias de ausência da ação. Moradores das ruas Pascoal Moreira, Clemente Bonifácio, Voltolino, Jupuruchit­a e Barra do Campo disseram que não há combate ao mosquito por lá.

Em nota, a Prefeitura de São Paulo afirma que visitou 209 imóveis na rua Barra do Campo. O órgão confirmou que recebeu notificaçã­o de caso de dengue na rua Fernando Falcão em junho. Uma equipe foi mobilizada para o local e realizou bloqueio de criadouros oito dias após a notificaçã­o, com visita a 98 casas.

No dia em 11 de outubro, a rua Voltolino teve ação casa a casa, com 97 visitas. As ruas Pascoal Moreira, Clemente Bonifácio e Jupuruchit­a não foram considerad­as de alto risco; a prefeitura não respondeu sobre as ruas Luís Gregnanin, dos Trilhos e Itaqueri.

“As regiões periférica­s são mais receptivas, mas aqui [em Higienópol­is] a sensação de inseguranç­a é grande. Todo mundo acha que será assaltado Raphaela Karla Toledo Solha supervisor­a regional de Vigilância em Saúde

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Zanone Fraissat/Folhapress Agentes de zoonoses fazem inspeção contra a dengue em condomínio em Higienópol­is, bairro nobre na região central de São Paulo

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