Morre Lázaro Brandão, ex-presidente do Bradesco
Executivo ficou à frente das empresas controladoras do banco até esta quarta
Funcionário do Bradesco por 76 anos, Lázaro Brandão morreu ontem, aos 93. Ocupou a presidência executiva de 1981 a 1999, sucedendo o fundador do banco, Amador Aguiar. Ficou à frente do conselho de administração de 1990 a 2017, e depois continuou a ir ao trabalho diariamente. Era conhecido por jornadas de 12 horas ao longo de seis décadas.
são paulo Simplicidade e criatividade —esta era a fórmula que Lázaro de Mello Brandão usava para descrever a razão do sucesso do maior banco privado brasileiro por meio século (de 1959 a 2009).
Brandão foi presidente executivo do Bradesco de 1981 a 1999, quando passou a apenas presidir o conselho de administração, função que já acumulava desde 1990 e de onde saiu em 2017. Desde então, presidia as holdings do banco.
O executivo morreu nesta quarta-feira (16), em São Paulo, aos 93 anos. Ele estava internado em um hospital da capital paulista para a recuperação de uma cirurgia.
Deixou a presidência do conselho do banco só em 2017, aos 91 anos. E, depois, ainda ia ao banco diariamente.
O executivo deixa mulher, duas filhas e um neto —uma terceira filha já havia morrido. Brandão ocupava a função de presidente das empresas controladoras do Bradesco, empresa na qual atuou por quase toda a vida —foram 76 anos.
E, de fato, ele também era um homem simples e criativo, mas não se furtou a suar a camisa em jornadas de 12 horas diárias iniciadas antes da sete da manhã ao longo de seis décadas, inclusive, aos sábados.
Nascido a 15 de junho de 1926 em Itápolis (SP), Brandão ingressou no Bradesco antes mesmo de Amador Aguiar, em 1942, nos tempos em que a instituição se chamava Casa Bancária Almeida e Cia., sediada na cidade de Marília (SP).
Do modesto cargo de escriturário galgou, posto a posto, as funções de responsável por contas correntes, gerente, diretor, até chegar a vice-presidente da instituição. Na década de 80, foi escolhido a dedo pelo inventor do Bradesco e seu mestre declarado, o banqueiro Amador Aguiar, para sucedê-lo como presidente executivo. A partir de então, Aguiar ocupou a presidência do Conselho de Administração praticamente até morrer, em 1991.
Também neste posto Brandão sucedeu a Aguiar, mais tarde. Tinha no mestre um paradigma, mas, ao contrário de Aguiar, que detestava festas, às vezes, em ocasiões especiais, arriscava um black tie.
Aguiar, ao fundar o Bradesco, teve a ideia de fazer um banco em que seus executivos pudessem ser confundidos, pela simplicidade, com os correntistas. Brandão cultivou esse estilo até no vestirse. Considerava absolutamente certa a decisão de seu mentor de transferir o comando do Bradesco para Osasco, de modo que os principais executivos pudessem ficar longe dos problemas do dia a dia das agências e arquitetarem grandes negócios que transformariam a modesta casa bancária na atual potência financeira.
Fidelidade
A vida profissional de Brandão reflete a própria história do banco e sua fidelidade absoluta a Aguiar levou-o a ser conhecido como o “segundo rosto” do Bradesco. Com sua morte desaparece da cúpula do Bradesco o último remanescente dos tempos heroicos da Casa Almeida.
Católico por formação desde a infância modesta, ele apresentava-se a seus interlocutores como homem simples e fiel às raízes interioranas —gostava dos finais de semana na fazenda em Itatiba (SP), onde plantava café. Podia ser simples, mas era determinado.
Certa vez, em 1996, ao ser indagado sobre quando deixaria a presidência do banco, Brandão respondeu rápido: “Ainda não é hora porque o momento é de grandes desafios”. Referia-se ao esforço vitorioso que comandou para adaptar o maior banco particular do país à nova realidade da estabilidade econômica gerada a partir do Plano Real.
Apesar do jeito cordato, Brandão tomou atitudes firmes quando julgou necessário, sob a justificativa de que estava defendendo uma causa maior —ou seja, o banco.
Assim, consta que ele impediu Alcides Tapias, então vicepresidente, de chegar à presidência executiva, em 1996. A versão oficial é que Tapias desligou-se do Bradesco porque, aos 54 anos, após presidir a Febraban de 1992 a 1995, estava em busca de novos desafios.
Mas a imprensa especializada anotou à época que Tapias saiu porque ele não o queria como substituto. Em contrapartida, Brandão abençoou —e nomeou— seus sucessores no cargo: Márcio Cypriano (de 1999 a 2009) e, depois, Luiz Carlos Trabuco Cappi.
Na presidência executiva, não hesitou em cancelar o limite de idade de 65 anos para o cargo, em benefício próprio. Ao sair, porém, reintroduziu a norma e a fez cumprir na passagem do comando de Cypriano a Trabuco. A propósito dessas sucessões, Brandão dizia que o Bradesco muda para continuar o mesmo.
Interlocutor de políticos
Entre a enorme coleção de sucessos colhidos como banqueiro —curiosamente com participação ultramin oritária na complexa composição acionária do Bradesco— um episódio que o chateou foi a investigação da Polícia Federal, com base em escutas, sobre suas relações com o doleiro Kurt Paul Pickel, que foi preso em março de 2009 sob acusação de evasão de divisas, lavagem de dinheiro e outros crimes. Do inquérito não resultou qualquer acusação formal contra o banqueiro.
Até 2017 ele se manteve firme à frente do conselho de administração —e depois nas controladoras do Bradesco— e continuou a receber romaria permanente de políticos de todos os partidos que afluiam à Cidade de Deus em busca das bênçãos de Lázaro Brandão.
Por bênçãos entendam-se conselhos sobre o futuro do país e recursos para campanhas eleitorais. Brandão foi, até o fim, um discreto e confiável interlocutor de políticos, de vereadores a presidentes.
Rico e realizado, podia fazer o que quisesse. E ele fez. Trabalhou dos 16 aos 93 anos, com dedicação e afinco, no que chamava de “minha vida”, o Bradesco.
Ele foi velado e cremado nesta quarta (16) no cemitério Horto da Paz, em Itapecerica da Serra. Durante o velório, Luiz Carlos Trabuco, presidente do conselho de administração do Bradesco, compartilhou parte da rotina de trabalho com Brandão, do qual se aproximou nos anos 1980. “Nos últimos dez anos, trabalho na mesa ao lado da dele.”
Trabuco falou ainda sobre a relação de Amador Aguiar e de Brandão com Octavio Frias de Oliveira (19122007), que remonta os anos 1950. Foram sócios em bancos e empreendimentos imobiliários antes de que ele se tornasse publisher da Folha. “As duas instituições [Bradescoe Folha] têm uma história comum há muito tempo”.