Folha de S.Paulo

Renda do 1% mais rico é 34 vezes a dos 50% mais pobres

Em 2018, rendimento médio com trabalho do 1% mais rico no Brasil foi de R$ 27,7 mil; dos 50% mais pobres, R$ 820

- Fernando Canzian Colaborou Nicola Pamplona

Em 2018, o rendimento médio dos mais ricos foi de R$ 27.744; na metade mais pobre, de R$ 820, mostram dados do IBGE. A renda real do trabalho dos 50% mais pobres caiu ou subiu bem menos do que a dos mais ricos, aprofundan­do a desigualda­de.

“Os mais pobres acabam sofrendo mais do que aqueles com carteira de trabalho ou funcionári­os públicos Maria Lúcia Vieira gerente da PNADC

são paulo O rendimento médio mensal obtido com trabalho do 1% mais rico da população brasileira atingiu, em 2018, o equivalent­e a 33,8 vezes o ganho obtido pelos 50% mais pobres. No topo, o rendimento médio foi de R$ 27.744; na metade mais pobre, de R$ 820.

A diferença entre os rendimento­s obtidos pelo 1% mais rico e dos 50% mais pobres no ano passado é recorde na série histórica da PNADC (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio Contínua) do IBGE, iniciada em 2012.

A desigualda­de aumentou porque o rendimento real do trabalho da metade mais pobre caiu ou subiu bem menos do que o dos mais ricos, sobretudo nos últimos anos.

Para a gerente da pesquisa, Maria Lúcia Vieira, o aumento da desigualda­de reflete a recessãodo mercado de trabal honos últimos anos, que impacta principalm­ente aqueles que vivem de ocupações menos formais.

“Os mais pobres acabam sofrendo mais do que aqueles com carteira de trabalho ou funcionári­os públicos, por exemplo ”, disse ela, em entrevista nesta quarta (16) para comentara pesquisa.

De 2017 para 2018, por exemplo, o ganho dos 10% mais pobres caiu 3,2%( par aR $153 em média) enquanto odo 1% mais rico aumento 8,4% (para R$ 27.774).

Desde o início da pesquisa, e coincidind­o com o aumento na desigualda­de, houve ainda uma diminuição no total de domicílios atendidos pelo Bolsa Família, de 15,9% no total do país em 2012 para 13,7% em 2018.

Vista de outro ângulo, a extrema concentraç­ão de renda no Brasil revela que os 10% da população com os maiores ganhos detinham, no ano passado, 43,1% da massa de rendimento­s (R$ 119,6 bilhões). Na outra ponta, os 10% mais pobres ficavam com apenas 0,8% da massa (R$ 2,2 bilhões).

A disparidad­e de renda no Brasil tem ainda forte aspecto regional, com o Sudeste —com pouco mais de 40% da população— concentran­do uma massa de rendimento­s (R$ 143,7 bilhões) superior à de todas as outras regiões somadas.

Já o Sul, com cerca da metade da população do Nordeste, tem massa de rendimento­s maior do que a dos nove estados nordestino­s (R$ 47,7 bilhões ante R$ 46,1 bilhões).

Os dados de 2018 mostram ainda que o índice Gini, que medea desigualda­de numa escalade 0( perfeita igualdade) a 1( máxima concentraç­ão) aumentouem todas as regiões do Brasil e atingiu o maior pat amarda série, chegando a 0,509.

A exceção foi o Nordeste, onde a desigualda­de de rendimento­s caiu porque aspessoas no topo perderam renda —e não porque os mais pobres ganharam mais.

Segundo a gerente da pesquisa, o movimento reflete a maior informalid­ade da economia na região, que distribui os impactos da crise de forma mais homogênea entre as diversas classes de renda.

Pelos cálculos da PNADC, o rendimento médio mensal de todos os trabalhos (de pessoas de 14 anos ou mais) em 2018 ficou em R$ 2.234, ainda abaixo do maior valor da série, os R$ 2.279 apurados em 2014.

ONordesteé­a região com o menor rendimento médio: R $1.497. O Sudeste, como maior: R$ 2.572.

Apesar da extrema concentraç­ão de renda mostrada na pesquisa, ela não revela outros aspectos da questão.

Como setra tadeu ma pesquisado­miciliar, a partir de um questionár­io, as pessoas mais ricas e com outras fontes de renda —sobretudo de aplicações financeira­s e aluguéis— tendem anão mencionare­s ses ganhos quando abordadas.

Já o Relatório da Desigualda­de Global, da Escola de Economia de Paris e que agrega pesquisas domiciliar­es, contas nacionais (onde constam subsídios e incentivos a grupos) e declaraçõe­s de imposto de renda, sustenta que a concentraç­ão de renda no Brasil é ainda maior: o 1% mais rico se apropria de 28,3% dos rendimento­s brutos totais.

Na outra ponta, os 50% mais pobres ficam com apenas 13,9% do conjunto de todos os rendimento­s.

Por esses cálculos, o Brasil é o país democrátic­o mais desigual do mundo, atrás só do autocrátic­o e minúsculo Qatar.

Diferentem­ente de outras pesquisas que captam melhor ganhos de capital, na PNADC a rendado trabalhoép­re ponderante para o cálculo do rendi- mento médio( representa 72,4% do total), seguida por aposentado­rias e pensões (20,5%). O item “outros rendimento­s” responde por apenas 3,3%.

Segundo especialis­tas, a desigualda­de de renda no Brasil é alta e persistent­e por conta de fatores históricos e estruturai­s, como a herança escravocra­ta, o patrimonia­lismo que se apodera de recursos estatais e empregos públicos, políticas sociais voltadas a grupos que menos precisam e uma estrutura tributária regressiva, que cobra proporcion­almente mais impostos de quem ganha menos.

“O Brasil tem um histórico de desigualda­de bastante elevado e a pesquisa mostra que o problema persiste”, afirmou o coordenado­r de Trabalho e Rendimento do IBGE, Cimar Azeredo.

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Lalo de Almeida/ Folhapress Moradoras caminham em meio ao lixo na comunidade Sol Nascente, na Ceilândia, no DF
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