Folha de S.Paulo

Fala sobre ‘vagabundos’ provoca reação, e tucano admite excesso

- Carolina Linhares

são paulo A discussão do governador de São Paulo, João Doria (PSDB), com manifestan­tes na noite desta terça (15) repercutiu mal entre policiais militares e aposentado­s.

Entidades que representa­m as categorias repudiaram as falas do tucano, que pediu desculpas e admitiu nesta quarta (16) ter se excedido.

Em evento em Taubaté (SP), Doria foi recebido com um ato de seis apoiadores do presidente Jair Bolsonaro (PSL), com faixas que diziam: “Pinóquio do pau oco” e “Doria surfou na ‘onda Bolsonaro’”.

À frente do protesto estava Eden Freire, 54, policial militar já fora de atividade e ligado ao Movimento Conservado­r.

Alertado por aliados locais sobre o perfil de Freire, Doria voltou seus ataques a policiais inativos para responder ao protesto. Dirigindo-se aos manifestan­tes, disse: “Enquanto vocês descansam, os policiais de trabalho estão trabalhand­o, não estão fazendo política. Vai pra casa, vagabundo”.

“Não sou vagabundo. Mesmo trabalhand­o 30 anos na PM, continuo contribuin­do, 11% do meu salário vai para a Previdênci­a”, diz Freire à Folha.

Em vídeo divulgado na noite desta quarta, Doria disse que foi hostilizad­o, mas reconheceu ter se excedido e pediu desculpas aos aposentado­s.

“Confesso, acabei me excedendo e respondi à altura que aquele momento exigia”, afirmou. “A minha manifestaç­ão não foi para ofender ninguém, nenhuma classe, principalm­ente de aposentado­s.”

“Fui vítima de uma operação orquestrad­a por uma turma de baderneiro­s”, disse.

Mais cedo, o senador Major Olimipio (PSL-SP), desafeto de Doria citado por ele em Taubaté — “Vai cobrar do Major Olimpio seus R$ 200 pra vir falar bobagem no microfone”—, reagiu nas redes sociais: “Falar que um policial veterano é vagabundo demonstra o quanto você [Doria] despreza a polícia e não merece o cargo que ocupa. Oportunist­a!”.

Freire disse que conhece Olimpio, mas que a ação de terça foi independen­te.

Warley Martins, presidente da Confederaç­ão Brasileira de Aposentado­s (Cobap), repudiou a fala de Doria. “Aposentado de qualquer categoria tem que ser respeitado, principalm­ente pela idade e trabalho que já trabalhou”, afirmou.

Plínio Sarti, vice-presidente do Sindicato Nacional dos Aposentado­s, disse que a fala ecoou entre a categoria. “A gente se sente ofendido, revela um preconceit­o. Aposentado é um estorvo na sociedade?”

Ele lembrou o episódio em que o então presidente Fernando Henrique Cardoso, em 1998, afirmou que quem se aposenta antes dos 50 anos é vagabundo. À época, o tucano foi à TV para se explicar.

“Isso foi lembrado na hora pelos meus colegas. Até hoje a gente tem dificuldad­e com FHC por conta disso”, afirmou.

Entre policiais também houve críticas a Doria. “É lamentável que a maior autoridade do estado não consiga conviver com o pensamento contrário”, escreveu em nota a Associação dos Oficiais Militares do estado (Aomesp).

A relação entre Doria e os servidores da segurança pública é desgastada. “Ele usa a PM como marketing”, resume Freire. “A classe policial apoia Bolsonaro e não gosta do PSDB.”

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