Folha de S.Paulo

As medidas ‘pop’ de Bolsonaro

Atos no fim de ano devem ajudar a conter a sangria do prestígio presidenci­al

- Vinicius Torres Freire Jornalista, foi secretário de Redação da Folha. É mestre em administra­ção pública pela Universida­de Harvard (EUA) vinicius.freire@grupofolha.com.br

Pesquisado­res de opinião dizem que medidas preliminar­es e recentes indicam o fim da sangria da popularida­de de Jair Bolsonaro, que vinha desde o início do ano. Alguns deles acreditam até em pequena melhora, um pouco além de um terço de “ótimo ou bom”.

Bolsonaro continua com a pior avaliação de um início de mandato desde a redemocrat­ização. Mas alguns atos de seu governo, goste-se deles ou não, podem ajudar a conter a degradação da imagem presidenci­al; alguns fatos da vida também.

O governo vai dar um 13º para os beneficiár­ios de Bolsa Família. Como oficialmen­te o pagamento extra vale apenas para este ano, trata-se de uma espécie de bônus de Natal.

É um dinheirinh­o muito pequeno, mas que faz diferença para a gente mais miserável desta terra pobre, muita gente, 13,5 milhões de famílias. No total, são R$ 2,58 bilhões que vão rodar na economia de periferias e cidadezinh­as neste final de ano.

Outra medida provisória desta semana prevê que o governo pode renegociar dívidas e disputas tributária­s de cidadãos e empresas com a Receita Federal. Vale para pessoas físicas, micro e pequenas empresas e também para grandes. No mundo das dores de cabeça com o fisco e fichas sujas de crédito, a dura e pragmática vida real, pode fazer diferença para centenas de milhares de devedores.

Ainda está para se ver como o governo vai levar a providênci­a à prática, pois não é trivial renegociar tantos débitos e contencios­os. Ainda assim, não convém subestimar a popularida­de e até efeitos econômicos benéficos da medida.

O povo também começou a sacar o dinheirinh­o do FGTS. Parece também um caraminguá para quem tem vida remediada ou rica, mas paga contas e movimenta lojas, pequenos serviços e supermerca­dos. Até R$ 28 bilhões podem irrigar a economia neste final do ano.

Nada a ver com Bolsonaro, a inflação dos alimentos diminuiu. O preço da comida estava subindo ao ritmo de cerca de 9% ao ano entre maio e abril. Agora, aumenta a quase 4%. Carestia de comida é um motivo recorrente de impopulari­dade de governo. Afora choques e outros acidentes, nos próximos meses o preço da comida deve ficar mais comportado, graças também à ajuda de uma safra boa.

Enfim, caso os chutes informados de economista­s e consultori­as não estejam outra vez tristement­e errados, a economia deste último trimestre deve crescer no passo mais rápido do ano. Será muito pouco, ainda, mas é melhor do que o nada ou menos que isso que vimos no início do ano.

Não é salvação da lavoura, mas salvam-se algumas couves. É pelo menos alguma contraposi­ção às más notícias que dominaram este 2019 até passada a metade do ano.

Vale repetir que o salário médio não cresce desde abril (na comparação anual). Vale lembrar que, apesar de comentário­s e otimismos equivocado­s por aí, não há melhoras notáveis no mercado de trabalho (o emprego formal cresce no mesmo ritmo lento desde fins do ano passado e a redução da taxa de desemprego de 2018 para 2019 será quase nenhuma).

O salário mínimo não terá reajuste real. Com a aprovação da reforma da Previdênci­a, mais gente vai se dar conta de que vai ter de trabalhar muitos anos mais antes da aposentado­ria.

Sim, o país decerto ainda está no buraco econômico. Mas não é fácil chutar que haverá derrocada sem fim do prestígio de Bolsonaro, ao menos no que depender dessa névoa vaga que se chama “efeito da economia” nos humores do povo.

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