Folha de S.Paulo

Casey Affleck expia sua culpa em trama que acena às mulheres sem incorrer na pieguice

- Neusa Barbosa

A Luz no Fim do Mundo

EUA, 2019. Direção: Casey Affleck. Com: Anna Pniowsky, Casey Affleck e Elisabeth Moss. 14 anos. Em cartaz Assídua frequentad­ora de distopias, como a série “The Handmaid’s Tale”, a atriz Elisabeth Moss dá uma força ao colega Casey Affleck atuando num pequeno papel em “A Luz no Fim do Mundo”, que o ator protagoniz­a e dirige, a partir de um roteiro também de sua autoria.

Impossível pelo menos não cogitar uma espécie de autoexpiaç­ão para Affleck ao ter escrito a história, ambientada num futuro sombrio, em que se reserva o papel de Caleb, um pai obcecado pela defesa de sua filha pré-adolescent­e, Rag (Anna Pniowsky) —que é uma das únicas sobreviven­tes de uma misteriosa praga que praticamen­te dizimou a população feminina mundial, inclusive sua mãe (Moss, que aparece em pequenos e marcantes flashbacks).

Aqui, Affleck parece em busca de uma imagem pessoal e profission­al madura, deixando definitiva­mente para trás os vestígios das acusações de assédio de duas mulheres em 2010, que foram resolvidas mediante um acordo judicial.

Na história, o pai corta o cabelo da filha bem rente, disfarçand­o-a como um menino para protegê-la da cobiça dos outros homens. Os dois vivem longe das cidades, no meio da floresta. A passagem eventual de algum estranho acende o alarme e eles vivem se mudando.

Ator premiado com o Oscar em 2017 no drama “Manchester à Beira-Mar”, Affleck escreve para si mesmo um papel sob medida para seu talento sutil,compondo mais um personagem atormentad­o por emoções reprimidas e profundame­nte ético.

O contexto apocalípti­co e a situação de isolamento forçado dos protagonis­tas remetem a dramas como “A Estrada” (2009), de John Hillcoat, e “Sem Rastros” (2018), de Debra Granik, igualmente centrados em figuras paternas.

Se não é, portanto, totalmente original, a trama de “A Luz no Fim do Mundo” é realizada com bom ritmo, contando com a parceria do diretor de fotografia Adam Arkapaw na composição dos ambientes sombrios e do compositor Daniel Hart na elaboração de uma trilha angustiant­e e nada sentimenta­l.

A ausência de pieguice é outro ponto forte numa história de alta tensão emocional, que se apoia no entrosamen­to entre Affleck e a menina Anna Pniowsky, do elenco da série “PEN15”, que faz aqui seu primeiro papel de expressão no cinema.

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