Minimalismo impera na SPFW como resposta ao rebuscamento fashion
PatBo e Beira apostam em looks mais básicos, enquanto Cavalera transforma a passarela em ato pró-resistência
Desde que surgiram no horizonte a gastronomia molecular, a mixologia e o Auto-Tune, as caras da comida, dos drinques e da música não foram mais as mesmas. Depois dessa “gourmetização” da vida se espraiar, o “raw”, ou seja, o que está em estado puro, surgiu como reação. O difícil é fazer um bom clássico. Na moda não é diferente.
Foi assim que as grifes deste terceiro dia de São Paulo Fashion Week botaram a mão no tecido para surfar entre o minimalismo e os básicos bem feitos do guarda-roupa.
A PatBo abriu a programação com um estudo bem amarrado da praia retrô com brilhos, proporções e acessórios de cabeça dos anos 1920.
Especializada em bordados, costurados com esmero em sua marca homônima, a estilista Patrícia Bonaldi limpou seus tecidos dessas aplicações e apostou em estampas de folhagem sobre base rosa-chá.
Por mais que seu público a reconheça pela exuberância, a designer mostrou que plissados, técnicas de macramê aplicado a maiôs com mangas de tiras e vestidos de festa lisos podem ser tão exuberantes quanto os quilos de pedraria costurada que ela exibe na marca que leva o seu nome.
A melhor parte dessa coleção de alto verão é a que Bonaldi menos carrega de rebuscamentos, permitindo sua tesoura ser simples sem que para isso precise enveredar pelo “minimal” sonolento.
A carioca Lívia Campos se debruçou numa das coleções mais difíceis de se analisar só pelo olhar. Para entender a potência da grife Beira, é necessário tocar suas peças para sentir o linho, a seda feita a partir de casulos descartados e as sobras de tecido que com o tempo se desfazem nas costuras.
O mar de azuis de diferentes tonalidades e tratamentos, desde os de tinta guache aplicada nos tênis Chuck Taylor até o celeste borrado em macacões cortados próximos à perfeição, enganam quem se dispõe apenas a ver a capa. Beiraram o maçante tantas propostas parecidas. Mas é a isso exatamente que a estilista se propõe.
Ironicamente, foi na tentativa de ampliar seu repertório minimalista para apostar em estampas, pontos de cor e brilho nos acessórios que a caboverdiana Ângela Brito escorregou em sua estreia na SPFW.
Ela não só se desconectou da boa mão para criar roupas com volumes e peças descontruídas, como abusou de desenhos impressionistas aplicados no torso e florais perdidos em peplums na cintura.
Enquanto ela se descolava, a Cavalera encerrou o dia tentando se reconectar à própria história, que nasceu em meio à cena musical para agradar uma parcela jovem pouco interessada em tendências.
Sob o olhar do prefeito Bruno Covas (PSDB), o empresário Alberto Hiar transformou a passarela em protesto contra as armas de fogo e em pedido de resistência aos jovens.
Nuvens viraram camuflados, coletes à prova de bala ganharam insígnias da marca e modelos, muitos transgêneros, negros e representantes da cena do skate, desfilaram com punho em riste para, pelo menos na imagem, “desgourmetizar” o discurso passado da grife.