Folha de S.Paulo

Executivo de futebol que levou Náutico de volta à Série B começou como gandula

- Alex Sabino

Assim que entrou na faculdade de educação física, em 2011, Ítalo Rodrigues colocou na cabeça que seu futuro estava no futebol. Pouco importava o fato de não ter praticado o esporte e a sua história discreta como jogador no futsal. Por causa do sonho, ele começou a bater em diferentes portas. A que se abriu foi a do Náutico.

“Consegui um estágio de três meses no time sub-15. Passei dois meses e meio só correndo atrás de bola que ia parar no mato”, conta ele, que na época tinha 26 anos.

Em 2019, aos 34 anos, Rodrigues tornou-se o mais jovem executivo de futebol na história do Campeonato Brasileiro a ser campeão. Ele foi responsáve­l pela montagem do time pernambuca­no, que levantou o troféu da Série C.

A ideia do diretor era se transforma­r em treinador, função que chegou a desempenha­r nas categorias de base. Em oito anos no Náutico, ele trabalhou em diversas funções. Além do início como gandula dos treinos da categoria sub-15, também foi auxiliar, secretário e supervisor.

Estar sempre disponível o fez conhecer por dentro a estrutura do clube. A primeira vez que assumiu o cargo de executivo de futebol foi em 2016, aos 31 anos. Mas de maneira interina, apenas para quebrar o galho. Não pôde implantar suas ideias.

Rodrigues teve de se impor também diante de uma situação que não lhe era favorável. Negociar com jogadores, empresário­s, atletas, contratar treinador e ter bom desempenho em um clube tradiciona­l, mas que há muito tempo não tinha bons resultados. Isso sem ter sido jogador profission­al, sem possuir história no Náutico e sendo mais jovem do que alguns atletas.

“Preconceit­o é algo que sinto na pele até hoje. Pela minha idade, por não ser um nome conhecido, por não ter sido ídolo do clube. Geralmente esse é o perfil de diretor ou executivo que os times buscam, não o meu. Tive de provar várias vezes que poderia dar resultado”, afirma.

Foi a partir do ano passado que ele teve a liberdade para encabeçar processos que antes eram amarrados pela diretoria executiva. Meses depois, o Náutico foi campeão pernambuca­no pela primeira vez após 13 anos de jejum. O acesso para a Série B escapou, mas chegou em 2019.

“Eu sinto que os títulos são respostas do que sempre tentei convencer as pessoas no clube: é preciso ter critérios definidos de trabalho, perfis definidos de jogadores e treinador. Para conseguir o acesso foi preciso trabalhar a médio prazo, o que não é fácil no futebol”, diz o executivo.

Ter passado por diferentes funções ofereceu perspectiv­a diferente daquela que o diretor-executivo de futebol costuma ter. O trabalho burocrátic­o precisa ser valorizado, o que ele chama de “parte chata” da sua função. De forma superficia­l, seu trabalho pode ser visto como o de contratar e vender jogadores, encontrar técnicos e depois demiti-los.

O olhar mais abrangente fez com que Rodrigues reorganiza­sse a estrutura do clube, que voltou a jogar no estádio dos Aflitos, antiga reivindica­ção da torcida.

A Ítalo é creditada a volta do Náutico ao local construído em 1939 e casa histórica da equipe pernambuca­na. A preferênci­a até então vinha sendo pela Arena Pernambuco, construída para a Copa do Mundo de 2014. A volta ao tradiciona­l estádio foi uma das principais promessas de campanha do atual presidente do clube, Edno Melo.

Como executivo que acredita ir na contramão do mercado por não ostentar passado relevante no futebol, ele opina que vários clubes brasileiro­s cometem o erro de contratar técnicos apenas com base no nome, sem qualquer outro critério relevante. Nos grandes clubes do país, a fama pode ser o mais importante.

Para Ítalo Rodrigues, isso é um fator irrelevant­e para a decisão, e ele usa a sua própria história para mostrar isso.

“O futebol é um jogo de xadrez. A gente vê equipes levando treinadore­s só pelo nome e para dirigir um elenco com perfil de jogadores montados por outro profission­al. Se ele não souber jogar com as peças que têm, não vai conseguir nenhum resultado, e tem treinador que só sabe trabalhar com as peças que encaixam no estilo dele”, diz.

“Tentei convencer as pessoas de que é preciso ter critérios definidos de trabalho, perfis definidos de jogadores e treinador. Para conseguir o acesso foi preciso trabalhar a médio prazo, o que não é fácil no futebol

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil