Folha de S.Paulo

Economia pode respirar, se presidente deixar

Dinheiro extra de FGTS, PIS, Bolsa Família, estados e cidades deve causar alívio

- Jornalista, foi secretário de Redação da Folha. É mestre em administra­ção pública pela Universida­de Harvard (EUA) Vinicius Torres Freire vinicius.freire@grupofolha.com.br

Até a eleição de 2020, um bom dinheiro extra vai irrigar a economia. Deve ser mais de 1% do PIB, uns R$ 70 bilhões ou mais que vão cair na mão de estados, municípios e famílias. Se não houver desastres novos, o estímulo deve aliviar um pouco da depressão.

Como o país observa bestificad­o um governo dar tiros até na própria cabecinha, caso da turumbamba vulgaríssi­ma do PSL e dos Bolsonaro, sempre pode haver tumulto político sério, com implicaçõe­s econômicas.

Suponha-se, por ora, que não seja assim.

Esse dinheiro extra não será a salvação da lavoura nem o começo do “milagre do cresciment­o”, nem mesmo de algum cresciment­o duradouro, necessaria­mente. Mas deve ajudar a colher umas couves até a escolha dos prefeitos. Que dinheiro é esse?

Entre o final deste 2019 e do ano que vem, devem cair na mão das famílias cerca de R$ 40 bilhões dos saques do FGTS. Outros R$ 2 bilhões de saques do PIS/Pasep.

Mais R$ 2,5 bilhões do “13°” do Bolsa Família.

Estados e municípios terão cerca de R$ 24 bilhões dos recursos que serão arrecadado­s com os leilões de exploração de petróleo, agora em novembro. Vão gastar, claro. Será uma despesa picada, que não vai colocar de pé grandes obras ou projetos. Na verdade, governador­es e prefeitos vão pagar muita despesa corrente, salário e aposentado­ria e atrasados de fornecedor­es.

A conta já chega aí a pouco mais de R$ 68 bilhões, quase 1% do PIB ou 50% mais que o dinheiro liberado pelo governo de Michel Temer para dar uma ressuscita­da na economia em 2017 (saques do FGTS). O efeito, porém, pode ser maior, ressalvada a hipótese de tumulto provocado pelo governo ou outro choque (desordem na economia mundial, por exemplo).

Algumas prefeitura­s mais bem arrumadas vão gastar mais em 2020, pois o ano é de eleição. Além do mais, estados e municípios estão recebendo mais dinheiro federal. Sim, por lei, parte dos impostos e dinheiros da exploração de recursos naturais têm de ser repassados para estados e cidades.

Nos últimos 12 meses, a receita total do governo federal ficou estagnada, em termos reais. Mas os repasses para estados e municípios cresceram, em especial graças ao petróleo. As transferên­cias aumentaram em R$ 15 bilhões.

Usando um microscópi­o, dá para perceber que a economia está em situação melhor agora do que em 2017. Em português claro, há mais crédito para pessoas físicas e as taxas de juros estão menores, em especial a taxa básica no mercado, embora até o custo do crédito bancário esteja um tico menos escorchant­e. As taxas de juros devem cair mais, daqui até o ano que vem, na ausência de choques e bolsonaric­es tumultuári­as no Congresso. Em resumo, há um alívio nas “condições financeira­s”, como dizem os economista­s.

Um impulso de mais de 1% do PIB em “dinheiro novo”, para gastar, e taxas de juros menores devem ser ajuda bastante para tirar o cresciment­o da casa de 1% deste ano e levá-lo para 2% em 2020. Não resolve a nossa situação, óbvio, e se trata por ora de hipótese estatístic­a. Mas seria um alívio, ao menos temporário.

Seria o primeiro cresciment­o além de 1% desde 2013. É um número que deveria entrar nas consideraç­ões políticas e econômicas dos que odeiam e dos que amam o governo.

Vai acontecer? Pode haver choques. Uma crise mundial. Mais à vista, uma crise federal. O regime dos Bolsonaro parece o clichê da reabilitaç­ão de pessoas com problemas com drogas: “um dia depois do outro”. Que sempre pode ser pior.

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