Folha de S.Paulo

Modelo de formação está em crise nos EUA; no Brasil, procura aumenta

Lá e aqui, currículos mudam para acompanhar nova velocidade do mercado

- Carolina Moraes

Empresas mais velozes e e tecnológic­as põem em xeque o MBA como principal alavanca profission­al. Ao menos nos Estados Unidos. Lá, os cursos de negócios mais bem classifica­dos, como os de Harvard e Stanford, começaram a registrar declínio no número de candidatos. Em 2018, as dez principais escolas de negócios norteameri­canas juntas apresentar­am uma queda na procura de 5,9%: de 53.907 candidatos contra 57.311 no ano anterior. Os dados foram levantados pelo Poets and Quants, site de educação executiva. “Fora do Brasil, de fato, há um questionam­ento muito grande sobre o MBA. É um programa integral, longo, e hoje os profission­ais têm disponibil­idade diferente”, diz Marcelo Orticelli, diretor de educação para executivos e desenvolvi­mento institucio­nal do Insper. Uma grande diferença em relação ao cenário brasileiro é que cursos de tempo integral são comuns nos EUA. Aqui, o profission­al mescla atividade acadêmica e dedicação ao trabalho, diz o diretor. A segunda diferença é a conjuntura econômica. A crise brasileira aquece o mercado de MBA. “Em tempos em que a economia está mais devagar, percebe-se aumento de profission­ais em cargo de gestão que buscam por reciclagem e networking”, afirma Orticelli. “É o momento em que as pessoas investem mais.” O diretor da pós-graduação lato sensu da ESPM, Tatsuo Iwata, lembra que a crise de 2008, desencadea­da quando um dos maiores bancos de investimen­to do mundo declarou falência, gerou questionam­ento da atuação dos executivos nos Estados Unidos. Esse teria sido o estopim para se repensar a formação do ponto de vista ético, diz ele. Essa mudança é um ponto de aproximaçã­o entre o mercado de MBA nos EUA e

Fora do Brasil, há um questionam­ento muito grande sobre o MBA. É um programa integral, longo, e hoje os profission­ais têm disponibil­idade diferente

Lívia Barakat coordenado­ra acadêmica de MBA da Fundação Dom Cabral

Em tempos em que a economia está mais devagar percebe-se um aumento de profission­ais em cargo de gestão que buscam por reciclagem e networking. É o momento em que as pessoas investem mais

Marcelo Orticelli diretor de educação executiva do Insper

no Brasil. Na Fundação Dom Cabral, por exemplo, as disciplina­s abordam o legado de uma organizaçã­o, a crise migratória mundial e a sustentabi­lidade. “Isso é uma grande tônica. Que MBA é esse em que as pessoas não consideram o impacto de um trabalho sobre o meio ambiente, por exemplo?”, diz Lívia Barakat, coordenado­ra acadêmica de MBA da instituiçã­o. Nos 19 meses de MBA, a fundação usa o Watson, serviço de inteligênc­ia artificial da IBM, para medir o desenvolvi­mento dos —por eles chamados— “líderes com propósito”, atentos às mudanças globais. A partir de um questionár­io feito em momentos diferentes do curso, a fundação mede essas aptidões nos alunos. Barakat enxerga uma necessidad­e de repensar o propósito e as formas de aprendizag­em vê crise para dos a MBAs, modalidade mas não no Brasil, já que a procura pelos cursos só aumenta. Ainda assim, é bom estar em constante movimento. A grande mudança nesses programas de formação executiva ocorrida nos últimos anos envolveu a metodologi­a de ensino, antes totalmente centrada no professor. Hoje os alunos são estimulado­s a manter uma atitude mais ativa em sala de aula, interagind­o com o professor e os colegas para a construção coletiva do conhecimen­to. “Aulas com excesso de carga expositiva, de fato, perderam a atrativida­de”, afirma Bakarat. Orticelli, do Insper, explica que isso é reflexo de um mercado de trabalho movido por equipes cada vez mais dinâmicas. Na instituiçã­o, os estudantes participam de aulas baseadas em solução de problemas como uma forma de trazer essa dinâmica das companhias para dentro do curso. “No passado, os MBAs eram muito funcionais. Hoje, esses cursos têm que preparar o aluno para atuar em empresas mais modernas, em que se trabalha com grupos e pessoas de diferentes áreas, e em que essa pessoa vai ser líder de um grupo e, em outro, pode estar sendo liderada”, afirma o diretor de educação executiva da Fundação Getulio Vargas em São Paulo, Paulo Lemos. A instituiçã­o lançará uma modalidade de MBA personaliz­ado em março de 2020 como um reflexo das mudanças curricular­es pelas quais o curso tem passado. O candidato será submetido a uma avaliação feita por profission­ais da instituiçã­o, que então montam um programa de 18 disciplina­s mais adequadas ao perfil do aluno. Ao longo do curso, o programa vai sendo repensado e ajustado para se adequar melhor ao momento. Além de se adaptar às novas dinâmicas do mercado, os currículos de MBA precisam agora contemplar outra tendência: a das “soft skills”. Essas competênci­as socioemoci­onais se tornam mais relevantes ao passo que a transforma­ção digital aumenta, de acordo com Elaine Tavares, que é diretora do Coppead/ UFRJ, instituto de pós e pesquisa em administra­ção da Universida­de Federal do Rio de Janeiro. “Botar a pessoa para aprender soft skills não é trivial, da mesma forma que ensinar conceitos técnicos a um gestor não é trivial. Escolas precisam se atentar a isso para montar currículo”, diz.

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