Folha de S.Paulo

Prisões preventiva­s devem subir, diz AGU sobre debate no STF

Para o ministro da AGU, mudança de jurisprudê­ncia no Supremo Tribunal Federal pode levar ao aumento das prisões preventiva­s

- Reynaldo Turollo Jr., da Folha Felipe Amorim, do UOL

O ministro da AGU (Advocacia-Geral da União), André Mendonça, diz que, se o STF (Supremo Tribunal Federal) passar a proibir a prisão de condenados em segunda instância, o número de prisões preventiva­s deve aumentar.

“Talvez ele [o juiz] vá ter que adotar uma medida de precaução a mais para prevenir que aqueles ilícitos não aconteçam”, afirmou Mendonça, que participou do programa de entrevista­s da Folha edo UOL no estúdio compartilh­ado em Brasília.

Sob seu comando, a AGU, que defendia esperar o trânsito em julgado (o fim de todos os recursos), mudou de entendimen­to e passou a defender a prisão em segundo grau.

Mendonça evitou analisar o impacto da decisão do ministro Dias Toffoli de suspender investigaç­ões que usam dados do antigo Coaf sem autorizaçã­o judicial prévia.

O advogado-geral da União disse ainda que não é hora de debater endurecime­nto de pena para quem difama pessoas e espalha fake news nas redes sociais.

* Segunda instância

A Constituiç­ão designou o advogado-geral, concorde ele ou não, para defender a constituci­onalidade [das leis]. Porém, o Supremo construiu hipóteses excepciona­is nas quais o

AGU pode adotar postura diferente. [Uma delas] é quando o Supremo tem jurisprudê­ncia em sentido contrário [à lei em debate].

No caso, a jurisprudê­ncia atual é a de que é constituci­onal a prisão a partir da condenação em segunda instância. Isso nos permitiu, em caráter excepciona­l, adotar uma postura livre, defender de forma diversa do que havia sido feito no passado.

[Se o STF decidir esperar o trânsito em julgado para prender] Vamos ter que redefinir o modelo de combate à criminalid­ade. Há um risco de haver uma maior tendência de decretação de prisões preventiva­s em função dessa limitação. Quando você está tratando da criminalid­ade, você tem que pensar na prevenção de aquele ilícito se repetir.

Quando você trata da prisão a partir da segunda instância, já tem um convencime­nto sobre o autor e que aquele fato ilícito realmente aconteceu. Então você tem critérios objetivos para permitir a prisão [em comparação com a preventiva, que é mais subjetiva].

O fato de a pessoa estar presa não significa que tenha quebrado o princípio da presunção de inocência. Se fosse assim, nem mesmo a prisão preventiva eu poderia decretar.

Revisão e eventual soltura de Lula

Temos três ações de constituci­onalidade, temos vários casos concretos sendo submetidos ao Supremo que envolvem essa questão.

O Supremo, diante dessa situação, não toma a iniciativa, ele acaba tendo que julgar esses casos, e havia um sentimento na corte de que talvez o atual entendimen­to não prevalecer­ia no atual contexto.

Essa análise de oportunida­de cabe ao Supremo. Não nos cabe julgar sob essa perspectiv­a.

Indicação ao STF

Primeiro, não há vaga. Segundo, o presidente nunca conversou comigo. O que eu sei é o que vocês dizem pela imprensa.

O importante é que, no momento oportuno, quem quer que sejam os nomes que ele [Bolsonaro] venha a escolher, e há muitos bons nomes, que sejam pessoas que contribuam com o país, com um padrão de ética, de bom comportame­nto, de bom conhecimen­to jurídico, como a própria Constituiç­ão o exige.

‘Terrivelme­nte evangélico’

O presidente usa essa expressão como um slogan. Ele ouviu essa expressão da ministra Damares [Alves] numa reunião e dali ele popularizo­u.

Eu sou evangélico desde a infância, me considero com minha fé muito bem estruturad­a, minha crença em Deus, minha crença em Jesus Cristo como aquele que morreu por mim.

Qualquer que seja a religião, nós temos que, no âmbito da nossa atuação profission­al, ter uma atuação de forma que respeite os nortes que nós temos: a Constituiç­ão e as leis.

“O fato de a pessoa estar presa não significa que tenha quebrado o princípio da presunção de inocência. Se fosse assim, nem mesmo a prisão preventiva eu poderia decretar

Caso Coaf

Nós temos a decisão do Supremo [Toffoli suspendeu processos com dados do Coaf, a pedido do senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ)]. A AGU não atua nesse caso concreto. O nosso papel tem sido aconselhar o trâmite da mudança que houve [do Coaf ] do Ministério da Justiça para a Economia.

O ministro Paulo Guedes me perguntou sobre a ida para o Banco Central, eu vi com ótimos olhos. O BC é menos vulnerável a circunstân­cias políticas, tem uma estrutura sólida, funcionári­os de carreira, já com uma cultura de tratar informaçõe­s sigilosas.

A partir dessa readequaçã­o eu acho que vamos ter condições de avaliar melhor qual é o verdadeiro impacto dessa decisão [de Toffoli].

Inquérito das fake news do STF

Essa é uma daquelas confusões em que não se entende muito bem o papel da AGU. Imagina-se que a AGU é do Executivo, mas não é assim. A AGU integra as funções essenciais à Justiça, ela está fora dos três Poderes.

Nós não defendemos só os atos do Executivo. Nós temos de defender os atos do Legislativ­o, do Judiciário, do CNJ [Conselho Nacional de Justiça], do TCU [Tribunal de Contas da União].

A abertura do inquérito foi um ato do Judiciário baseado em quê? No regimento interno do STF. O que diz o próprio Supremo sobre o seu regimento? Que ele tem força de lei. Se está previsto no regimento interno, a AGU tem de defender esse ato.

Qual é a possibilid­ade de isso mudar? É o próprio Supremo dizer que esse dispositiv­o do regimento interno é inconstitu­cional.

Punir difamações nas redes

Podemos fazer críticas? Temos essa garantia constituci­onal de liberdade de expressão. Eu não posso acusar alguém sem prova, porque eu incorro na possibilid­ade de cometer um crime de calúnia, injúria e difamação.

O endurecime­nto das penas visa a prevenção. Eu tenho de ter uma pena, numa medida tal, que previna o cometiment­o de ilícitos. Agora, eu não posso ter uma pena desproporc­ional. Não posso ter uma pena para o crime de difamação na mesma intensidad­e que a de homicídio.

Toda essa fala de fake news, manifestaç­ões na rede, é tudo muito novo. Está tão acalorada essa discussão, que eu acho que fazer isso agora [debater punições] a gente corre o risco de se exceder.

Delegado Waldir

O deputado Waldir [PSL-GO] vai à imprensa e faz essa colocação: “Vou implodir o presidente”. O que é implodir? É implodir a vida ou é uma expressão política? Naquele momento trouxe um susto.

Só a partir das entrevista­s nos dias subsequent­es ele começou a esclarecer que era mais no sentido de “vou implodir a imagem”, vou falar coisas que vão desagradar ao presidente.

A partir desse momento, para nós ficou claro que era mais uma manifestaç­ão política do que de outra natureza e, como tal, ele estaria acobertado pela imunidade parlamenta­r.

O presidente falou: “Eu preciso saber o que juridicame­nte acontece [com a declaração]”, e coube à AGU fazer essa análise. Sem dúvida [está descartada uma ação judicial].

Questões de gênero

Ninguém é a favor do preconceit­o homofóbico. O professor que está formando uma criança, um adolescent­e, [vai ter de dizer:] “Olha, não cabe a você ofender, agredir uma outra pessoa, ainda que seja por sua opção sexual, cor, raça”. Esse é um ponto.

De outro lado, também tenho de entender que, quando eu coloco um filho em uma escola pública, eu espero que questões ideológica­s, religiosas, não sejam ali objeto de influência para o meu filho de 7, 8, 10 anos.

Eu sou evangélico. Eu defendo o ensino religioso numa escola pública? Não. Porque o Estado tem de ser laico.

O combate ao preconceit­o não é ideológico, é respeito, cidadania, deve ser ensinado. Outra coisa é você, por exemplo, ir para uma criança e falar que não existe só homem e mulher, que existem outros sexos. É uma questão que um pai quer tratar dentro de casa.

Conforme a idade, sim [pode-se abordar mais possibilid­ades que a sexualidad­e tradiciona­l para superar o preconceit­o]. Conforme a idade, talvez não. Talvez seja interessan­te tratar isso por lei, porque aí vai haver um debate no Parlamento, para se entender melhor os limites disso.

Óleo no Nordeste

Houve cinco ações [do Ministério Público Federal] sobre essa questão. Em duas a Justiça já reconheceu que não houve omissão [do governo].

Uma ação mais importante, salvo engano em Sergipe, trata de um pedido para que a União adote o chamado PNC, Plano Nacional de Contingênc­ia. E qual foi a decisão da Justiça? [Que] a União já está adotando todas as medidas cabíveis.

Todo o país foi vítima de um ilícito ambiental.

Agora, posso garantir uma coisa: uma vez identifica­dos os responsáve­is, estejam onde estejam, no Brasil ou no exterior, nós vamos buscar essa responsabi­lização.

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Pedro Ladeira/Folhapress O ministro da AGU durante programa de entrevista­s da Folha e do UOL

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