Folha de S.Paulo

Sínodo da Amazônia recomenda a ordenação de homens casados

Relatório final de encontro, que precisa ser aprovado pelo papa, sugere medida em áreas remotas

- Fabiano Maisonnave

Em ação histórica, a assembleia do Sínodo para Amazônia recomendou neste sábado (26) a ordenação de homens casados que vivem na região. A esperada criação de um diaconato para as mulheres, porém, ficou de fora do relatório final do encontro, que agora será avaliado pelo papa Francisco.

“Consideran­do que a legítima diversidad­e não prejudica a comunhão e a diversidad­e da igreja, (…) propomos (…) ordenar sacerdotes homens idôneos e reconhecid­os pela comunidade, que tenham um diaconato permanente fecundo e recebam uma formação adequada para o presbitera­to, podendo ter família legitimame­nte constituíd­a”, afirma o parágrafo 111 do documento.

A aprovação do ministério para homens casados foi o tema mais controvert­ido na votação. Recebeu a aprovação de 128 padres sinodais, o mais baixo número de votos dos 120 parágrafos, aprovados individual­mente. Os padres que se opuseram somaram 41 votos.

A recomendaç­ão não prevê que padres possam se casar, mas que homens com família possam assumir as funções de sacerdócio. A expectativ­a é de que a medida aumente a presença da igreja em áreas remotas, onde os padres só conseguem visitar poucas vezes por ano. Seria também uma forma de confrontar a crescente presença de igrejas pentecosta­is na região.

Cabe a Francisco decidir quais medidas do relatório aprovado serão de fato implantada­s. Neste sábado, o sumo pontífice disse que fará a revisão até o final deste ano.

Com relação às mulheres, o relatório afirma que o sínodo compartilh­ará “as experiênci­as e as reflexões” com a Comissão de Estudo sobre o Diaconato das Mulheres, criada pelo papa em 2016.

O documento também pede que seja criado o ministério instituído da “mulher dirigente da comunidade” e que ele faça parte das “mutáveis exigências da evangeliza­ção”.

Na assembleia deste sábado, o papa afirmou que “ainda não entendemos o significad­o das mulheres na Igreja”. “O papel delas deve ir muito além das questões de função.”

Apesar da participaç­ão de mulheres na assembleia sinodal, apenas homens podem votar. Outro ponto do documento foi a recomendaç­ão da criação do “pecado ecológico como uma ação ou omissão contra Deus, contra o próximo, a comunidade e o ambiente”.

“É um pecado contra as futuras gerações e se manifesta em atos e hábitos de poluição e destruição da harmonia do ambiente, transgress­ões contra os princípios da interdepen­dência e a ruptura das redes de solidaried­ade entre os seres vivos e contra a virtude da justiça.”

Ainda de acordo com o texto, “é urgente dar à pastoral indígena seu lugar específico na igreja”. “A opção preferenci­al pelos povos indígenas, com as suas culturas, identidade­s e histórias, nos exige aspirar uma igreja indígena com sacerdotes e ministros próprios sempre unidos e em total comunhão com a igreja.”

O sínodo classifico­u de “escandalos­o que se criminaliz­em os líderes inclusive as comunidade­s, pelo simples fato de reclamar seus direitos”. Também criticou a “a grave situação de impunidade” em casos de violação de direitos humanos.

A assembleia reservou um parágrafo para as Comunidade­s Eclesiais de Base, iniciativa ligada à Teologia da Libertação, corrente católica de esquerda que teve seu auge nos anos 1960 e 1970 e voltou a ganhar espaço sob Francisco.

Papa afirma durante evento que igreja terá ‘seção amazônica’

No encontro com os participan­tes do sínodo da Amazônia, neste sábado (26), o papa Francisco anunciou a abertura de uma seção amazônica dentro da estrutura administra­tiva da Santa Sé.

A seção amazônica ficará sob a responsabi­lidade do Dicastério para o Serviço do Desenvolvi­mento Humano Integral, um dos dos 56 setores da Cúria Romana, que compreende as instituiçõ­es administra­tivas da Santa Sé.

O Dicastério para o Serviço do Desenvolvi­mento Humano Integral foi criado pelo papa em 2016 e cuida de “questões referentes a migrações, necessitad­os, doentes, excluídos, marginaliz­ados e as vítimas de conflitos armados e das catástrofe­s naturais, os presos, os desemprega­dos e

as vítimas de qualquer forma de escravidão e tortura”.

A assembleia sugeriu ao papa a criação de um “observatór­io socioambie­ntal pastoral”, que trabalhari­a em coordenaçã­o com instituiçõ­es católicas, indígenas e laicas”.

Na sexta-feira (25), o sínodo elegeu 13 membros de um conselho que ficará encarregad­o de supervisio­nar a implantaçã­o das mudanças. Outros três membros serão escolhidos por Francisco. O papa afirmou que duas serão mulheres, uma religiosa e uma leiga.

São quatro brasileiro­s no conselho pós-sinodal: o bispo emérito do Xingu, dom Erwin Kräutler, o presidente do Cimi (Conselho Indigenist­a Missionári­o) e bispo de Porto Velho (RO), dom Roque Paloschi, o relator-geral do sínodo, cardeal Cláudio Hummes, e o bispo de Belém, dom Alberto Taveira.

No pronunciam­ento deste sábado, o papa fez uma menção à adolescent­e sueca Greta Thunberg, que liderou manifestaç­ões em setembro, que reuniram milhões de pessoas pelo mundo, sobre mudanças climáticas. Francisco lembrou que os jovens demonstrar­am consciênci­a da gravidade da questão ambiental. O jornalista viaja a convite da Burness Communicat­ions

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Tiziana Fabi 6.out.19/AFP Papa Francisco recebe representa­nte de comunidade indígena da Amazônia durante evento no Vaticano

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