Folha de S.Paulo

A consciênci­a degenera

-

(Ouve-se o ruído da chegada de um segundo carro. Portas se abrem e mais luzes de faróis ampliam a visão da escada em frente à varanda. Jonas, sua filha Hannah e Ivone, a namorada, se aproximam de Teresa. Quando vê a ex-esposa, Jonas abre os braços num gesto teatral e comovido)

Teresa (Narra) Um. Chegada. (A Jonas) Meu Deus, é você, Jonas? Não te reconheci sem a barba.

Jonas (Aproxima-se dela) Ah, querida, você está linda… Volat irrevocabi­le tempus, voa o tempo

que não volta… (Faz carinhos nas

mãos de Teresa) E pensar que fomos um casal.

Teresa (Aponta Hannah) Éasua filha com a Léa? (A Hannah) Eu te vi criança, ficou a cara da mãe.

Hannah Meu nome é Hannah. (Teresa a beija no rosto)

Jonas Parece mais com você, as

semelhança­s imprevista­s. (Nota a impaciênci­a de Ivone e a apresenta)

Esta é Ivone… uma amiga.

Ivone (A Teresa) Eu te conheço bem.

Teresa De onde?

Ivone Da televisão e do palco. Te assisti três vezes na “Hedda Gabler”,

antes de conhecer esse senhor… meu amigo aqui.

Teresa (A cumpriment­a) Bemvinda.

Jonas (A Teresa) E você?! Um espetáculo!

Teresa Estou me segurando, até que toquem o terceiro sinal.

Jonas A bondade conserva, a consciênci­a degenera… (Aponta Ivone) Vou dizer, por que não? Namoramos. (Imita um personagem do filme “8 ½”, de Fellini, com

sotaque italianiza­do) “Sou trinta anos mais velho que ela, e daí? Posso ser um velho babão, aquele que paga as contas, tudo bem, concordo! E daí?”

Ivone É de um filme. Já me recitou quatro vezes.

Jonas “E, no entanto, eu a sinto muito apegada a mim, ela é simples, boa, nada burra.”

(Ivone bate palmas)

Ivone Palhaço, meu palhaço. (Beija-o)

Teresa Acho que vocês vão carregar as malas sozinhos, não sei aonde foram os caseiros. Tem uma luz acesa, mas ninguém se interessa por nós.

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil