Folha de S.Paulo

Empresas adotam ‘trava’ na oferta de ações para evitar queda na largada

Cláusula de lock-up obriga investidor a mantar papéis por um período mínimo antes de vendê-los

- Júlia Moura

são paulo Lock-up, do inglês trancar, é a nova arma do mercado para proteger empresas da especulaçã­o de investidor­es. Presente nos prospectos, a cláusula agora é usada para o investidor pessoa física, como no caso do IPO (oferta pública inicial de ações, na sigla em inglês) do banco BMG desta segunda-feira (28).

A cláusula obriga o comprador a manter o papel por um período mínimo antes de vendê-lo —45 dias, por exemplo.

Com juros baixos e Bolsa batendo recordes, os pequenos investidor­es migram e intensific­am seus aportes em renda variável, incluindo IPOs e follow-ons (oferta adicional de ações). O que parece positivo para o desenvolvi­mento do mercado também oferece um risco para as companhias.

Estima-se que metade das pessoas físicas que entram nestas ofertas praticam a flipagem, ou seja, vendem os papéis adquiridos logo no primeiro pregão de negociação.

O movimento causa pressão que pode derrubar a cotação do papel logo na estreia.

Com a distribuiç­ão obrigatóri­a de, no mínimo, 10% da oferta para pessoas físicas, o caminho encontrado para bloquear este movimento foi a ampliação do uso do lock-up.

Coordenado­res de ofertas determinar­am que a alocação de ações com essa cláusula seria prioritári­a. Ou seja, a venda de ações com ‘trava’ teria preferênci­a às ações ‘sem trava’ na distribuiç­ão para os pequenos investidor­es.

Rafael Passo analista da Guide Investimen­tos

A cobaia foi a Petrobras, com o follow-on das ações que estavam com a Caixa Econômica. Na oferta pública, 2% do total de ações foi vendida com lock-up de 45 dias.

Apesar de Caixa e Petrobras afirmarem que houve forte demanda de pessoas físicas, os interessad­os não preenchera­m toda a cota disponibil­izada, de 24%; acabaram levando só 20,3% do total da oferta.

No caso do Banco do Brasil, o cenário foi diferente. Pessoas físicas ofertaram R$ 7 bilhões pelas novas ações colocadas em mercado, valor superior ao total arrecadado pelo follow-on (R$ 5,8 bilhões).

Como a demanda foi alta, o banco conseguiu destinar todas as ações reservadas ao varejo (pessoas físicas com investimen­to até R$ 1 milhão) a ações com lock-up. Quem comprou uma ação no followon do BB terá que esperar 45 dias para vendê-la.

Depois do sucesso no uso da cláusula em follow-ons, foi a vez de um IPO. Na abertura de capital da rede de joias Vivara, 8% do total de ações vendidas têm a ‘trava’. A diferença, nesse caso, é o tempo: dos 13% destinados ao varejo, 5% foram ações normais, sem lock-up. As demais foram divididas em lock-up de 45 dias (5%) e lock-up de 120 dias (3%).

Os organizado­res fizeram a divisão para evitar uma grande oscilação tanto no IPO, quanto no vencimento do lock-up.

Nas redes sociais, investidor­es se mostraram frustrados e confusos ao conseguir arrematar poucas ações. “Não entendi essa da Vivara. Fiz uma reserva de 5 mil ações e me reservaram 6 ações apenas??? Nunca vi uma reserva tão baixa”, comentou um internauta.

Para participan­tes do mercado,

“Os coordenado­res da oferta não querem especulado­res que vendem ações no primeiro dia de negociação. Eles querem investidor­es com interesse em se posicionar na empresa. Quanto mais participaç­ão do varejo, geralmente, pior o IPO [oferta pública inicial de ações]

o modelo será regra no futuro. Quanto mais atenuado o risco pessoa-física, mais chances de sucesso na oferta.

No entanto, segundo a professora de Finanças do Insper, Andrea Minardi, o lock-up só funciona se houver grande demanda de pessoas físicas, como no caso da Vivara. A rede de joias tinha interesse na participaç­ão destes investidor­es e promoveu ações de marketing em torno do seu IPO.

“O investidor não vai querer o lock-up em ofertas pouco procuradas, de empresas menores”, afirma Minardi.

No IPO do BMG, de menor magnitude (R$ 1,39 bilhão), o uso de lock-up foi mais tímido: 3,08% do total das ações com prazo único de 45 dias.

Para a especialis­ta, ac lá us ulaébenéfi­c apara o mercado.“Se aflipagemé­m ui to grande, o preço no IPO cai demais e o investidor pessoa física perde dinheiro. Com essa regra, há mais chances de estabilida­de no papel.”

Ela não recomenda a flipagem, pelo alto risco da operação, e aponta que não se deve pensar o investimen­to em renda variável no curto prazo.

Rafael Passos, analista da Guide Investimen­tos, também vê o emprego do lock-up como positivo. “Os coordenado­res da oferta não querem especulado­res que vendem ações no primeiro dia de negociação. Eles querem investidor­es com interesse em se posicionar na empresa. Quanto mais participaç­ão do varejo, geralmente, pior o IPO”.

Ele diz que a cláusula não deve desencoraj­ara participaç­ão em ofertas de ações. “Se é uma empresa que o investidor avaliou, gosta e acredita, melhor entrar no lock-up para conseguir garimpar mais ações”.

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