Governo quer concorrência por saneamento em cidades
Ministério da Economia oferece ajuda para realizar licitações e verba federal
brasília O governo federal planeja oferecer apoio técnico e financeiro a municípios que quiserem abrir o setor de água e esgoto para exploração pela iniciativa privada.
Determinada a estimular a competição entre empresas públicas e privadas, a equipe econômica quer ajudar a formular licitações e disponibilizar recursos federais para investimentos em saneamento.
Um projeto que muda regras do setor deve ser votado nesta semana em comissão na Câmara sob forte pressão de companhias estaduais, principalmente do Norte e do Nordeste, e governadores.
Em entrevista à Folha ,orelator especial da ONU em direito à água e ao saneamento, o brasileiro Léo Heller, disse que a proposta de ampliar participação privada na área é falaciosa.
Após a declaração, o governo reagiu. “É opinião política. A carreira toda dele [Heller] é pró-estatal, e o resultado é de mais de 100 milhões de brasileiros desconectados da rede de esgoto”, afirmou o secretário de Desenvolvimento da Infraestrutura do Ministério da Economia, Diogo Mac Cord de Faria.
A equipe do presidente Jair Bolsonaro (PSL) diz acreditar que as estatais se tornaram ineficientes, perderam o poder de investimento e não são capazes de universalizar o serviço de água e esgoto.
Por isso, na visão do governo, é necessário abrir o mercado para o setor privado.
Se conseguir convencer a maioria dos parlamentares a adotar a medida, o Ministério da Economia pretende oferecer informações e estudos sobre viabilidade econômica, técnica e ambiental para as licitações e ajudar na elaboração dos planos e governança do saneamento.
Além disso, deve ser criado um grupo interministerial para coordenar o Plano Nacional do Saneamento Básico, cuja meta é universalizar o acesso ao serviço até 2033.
“O BNDES pode colocar algumas linhas [de financiamento]. Queremos garantir o acesso a recursos federais. Há diversas ferramentas necessárias para estimular o saneamento”, disse Faria.
Para o secretário, a ineficiência das estatais tem travado a liberação de empréstimos para obras de água e esgoto, pois muitas companhias estaduais não conseguem nem sequer concluir um projeto a ser financiado. Atualmente, apenas cerca de metade dos recursos disponíveis é usada, segundo Faria.
Levantamento do governo federal aponta que nove estados usam mais de 50% da receita operacional para pagamento de pessoal, reduzindo o espaço para investimentos. A maioria está no Norte e no Nordeste, onde há maior carência de cobertura.
Sem consenso, o Congresso debate o novo marco regulatório do setor desde o fim da gestão de Michel Temer (MDB).
A equipe de Bolsonaro aproveitou quase toda a proposta do antecessor para defender que a escolha do operador de água e esgoto do município seja por concorrência (licitação) entre o setor público e o privado.
No capítulo mais recente do embate no Congresso, a Câmara dos Deputados criou uma comissão especial para analisar todos os diferentes projetos para novas regras de saneamento. O relator é o deputado Geninho Zuliani (DEM-SP), cujo voto está alinhado com o governo.
A versão apresentada pelo deputado federal desagradou a empresas estaduais de saneamento, prefeitos e governadores do Nordeste, que articulam a derrubada da proposta. Dessa forma, o deputado Fernando Monteiro (PP-PE) entregou um texto alternativo.
A versão é pela manutenção dos chamados contratos de programa, assinados diretamente entre municípios e companhias estaduais de água e esgoto —sem necessidade de concorrência.
Prefeitos, hoje, podem fazer contratos com empresas privadas, mas o setor diz haver muitos entraves que dificultam a ampliação da participação privada.
O objetivo do governo e de Zuliani é acabar com os contratos de programa e abrir o mercado à iniciativa privada.
Até a próxima quarta (30), o relator deve fazer ajustes para atender a pedidos de membros da comissão. O deputado confia que o projeto será aprovado pelo colegiado e, até o fim de novembro, ser votado no plenário da Câmara. Se aprovada, a proposta terá de voltar ao Senado, que analisou o tema em junho.
Os senadores decidiram que o melhor seria permitir que os municípios prorrogassem os contratos com as estatais de água e esgoto, o que permitiria a atuação de companhias estaduais —sem concorrência— por até 30 anos.