Relato falso baseou citação a Jair Bolsonaro no caso Marielle, diz Promotoria
Nesta quarta, a promotora Letícia Emily afirmou que foram apreendidas gravações de janeiro a março. Ela diz que todo o material foi submetido a perícia no Ministério Público, que atestou não ter ocorrido adulteração.
Emily disse ainda que, segundo as investigações do Ministério Público do Rio, não há provas concretas de que o ex-deputado Domingos Brazão seja o mandante do assassinato de Marielle nem o responsável por obstruir as investigações.
Brazão foi alvo de pedido de investigação da ex-procuradora-geral da República Raquel Dodge, por considerar haver suspeitas contra o ex-deputado. Ela também o denunciou sob acusação de obstrução de Justiça por ter tentado atrapalhar as investigações do caso.
De acordo com reportagem do UOL, no texto ela afirma que o ex-deputado é também o mandante do crime.
O novo PGR, Augusto Aras, disse que o arquivamento da menção ao nome de Bolsonaro não paralisa investigações no Rio sobre os demais suspeitos de envolvimento na morte de Marielle.
Paralelamente, o procurador-geral informou que remeterá para o Ministério Público Federal no Rio pedido feito pelo ministro da Justiça, Sergio Moro, para que se investiguem as circunstâncias em que o porteiro do condomínio de Bolsonaro citou o nome do presidente em depoimento à polícia do Rio.
Segundo Aras, há suspeitas de que tenha havido a intenção de prejudicar Bolsonaro.
“Por si só, a notícia de fato [com a menção a Bolsonaro, que chegou ao STF] já encerrava a solução do problema”, disse Aras nesta quarta. “[O arquivamento ocorreu] porque não tinha nenhuma hipótese [de investigação do presidente] a não ser a mera comunicação [ao STF].”
“O que existe agora é um problema novo, o factoide que gerou um crime contra o presidente”, disse.
Moro pediu a Aras que instaurasse inquérito para investigar os possíveis crimes de obstrução de Justiça, falso testemunho ou denunciação caluniosa, nesse caso tendo como vítima o presidente. Ana Luiza Albuquerque, Italo Nogueira, Reynaldo Turollo Jr., Thais Arbex e Camila Mattoso seria “absolutamente inadequado e contrário às instituições democráticas”.
Na versão de Bolsonaro, a conversa com Witzel teria ocorrido no Rio, mas na data apontada por ele ambos estavam em Brasília.
“No dia 9 de outubro, às 21 horas, eu estava no Clube Naval do Rio de Janeiro quando o governador Witzel chegou para mim e disse: o processo está no Supremo”, contou. “Que processo? O que eu tenho a ver? E o Witzel disse que o porteiro citou meu nome. Ele sabia do processo que estava em segredo de Justiça.”
A reportagem da Folha estava no evento em Brasília no dia 9 e presenciou o encontro entre Bolsonaro e Witzel. De uma distância de cerca de 100 metros, do lado de fora do salão, o gesticular deles deixou transparecer que os ânimos estavam exaltados.
Bolsonaro deixou o local minutos depois da conversa com o governador fluminense e, segundo relatos de pessoas presentes, o clima pesou com a chegada de Witzel.
Em 11 de outubro, uma sexta-feira, Witzel e Bolsonaro participaram de uma cerimônia em Itaguaí (RJ), onde fica o Clube Naval. Na ocasião, o presidente mandou um recado: “Trabalho para que, no futuro, quem porventura, de forma ética, moral e sem covardia, venha a assumir o destino da nação encontre a pátria numa situação muito melhor do que encontrei”.
O presidente pronunciou a passagem “de forma ética, moral e sem covardia” olhando para Witzel.
Na manhã da quarta-feira seguinte (16) o presidente teve audiência com os ministros do STF Alexandre de Moraes e Dias Toffoli. Na sequência, falou em separado com Gilmar Mendes.
Segundo a reportagem do Jornal Nacional, no dia seguinte ao encontro de Bolsonaro com Toffoli, o presidente da corte teria recebido integrantes do Ministério Público Federal do Rio de Janeiro para tratar da menção a Bolsonaro na apuração sobre a morte de Marielle.
Ainda naquela semana, antes de embarcar para a viagem à Ásia, Bolsonaro recebeu seu advogado Frederick Wassef e o procurador-geral da República, Augusto Aras.
O encontro com ambos ocorreu no sábado, 19, no Palácio do Alvorada, em compromissos que não foram registrados na agenda oficial da Presidência.
Se as acusações de Bolsonaro sobre Witzel se provassem reais, criminalistas apontam que caberia ao Ministério Público levar a denúncia ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), já que o governador tem foro especial.
A Assembleia Legislativa do Rio também poderia agir, alegando crime de responsabilidade, que pode ser a base para um impeachment.
E Bolsonaro, estaria cometendo crime de prevaricação ao não denunciar Witzel quando este supostamente lhe deu detalhes da investigação? As opiniões divergem, mas o entendimento geral de especialistas consultados pela Folha é que seria “forçação de barra”.
“Não caberia a prevaricação, porque ele não tem o dever de acusar um governador que sabe algo contra ele mesmo [Bolsonaro]. O direito de defesa prevalece sobre o direito estatal, revelar isso significaria autoacusação”, diz Sérgio Shecaira, professor de direito da USP e conselheiro do IBCCrim (Instituto Brasileiro de Ciências Criminais).