Folha de S.Paulo

Flamengo x Corinthian­s: a diferença

Outra vez os rubro-negros parecem décadas à frente do alvinegro, em nova crise

- Juca Kfouri Jornalista, autor de “Confesso que Perdi”. É formado em ciências sociais pela USP

Em 1982, com o Flamengo campeão mundial no ano anterior e o Corinthian­s na Taça de Prata do Campeonato Brasileiro, disputando para chegar à Taça de Ouro no mesmo ano, o que conseguiu, a revista Placar fez a pergunta: Por que o Corinthian­s não é um Flamengo?

A resposta era óbvia, mas o Corinthian­s se superou ao buscá-la e criou a Democracia Corinthian­a.

Então, o diretor de futebol corintiano, Adílson Monteiro Alves, escreveu um bilhete para o diretor da publicação semanal: “Porque o Corinthian­s não quer ser o Flamengo”.

Touché! Reconheceu, com satisfação, o jornalista.

Trinta anos depois, a pergunta pôde ser, literalmen­te, refeita: Por que o Flamengo não é um Corinthian­s?

Sim, em 2012, o rubro-negro brigou para não cair para a segunda divisão do Campeonato Brasileiro e o Corinthian­s sagrou-se bicampeão mundial.

O Flamengo demorou sete anos para responder.

Sem bilhete, apenas com futebol exemplar.

Eis que, quase 40 anos depois da primeira indagação, novamente a questão está em pauta, diante da enorme distância entre os dois clubes mais populares do país, outra vez com vantagem dos cariocas, embora os paulistas vivam no estado menos pobre do Brasil.

Flamengo e Corinthian­s jogarão no próximo domingo (3) pela 30ª rodada do Campeonato Brasileiro, com o rubro-negro 22 pontos à frente antes da rodada 29.

Diferença que a história do confronto ainda não registra, pois em 136 jogos a superiorid­ade da Gávea é de apenas um jogo, 54 a 53, e há empate no torneio nacional, 24 a 24.

Mas o Flamengo com finanças saneadas pela gestão anterior marcha para estabelece­r supremacia aparenteme­nte sólida sobre o rival endividado e desnortead­o.

A comparação entre os dois times não permite dúvida: exceção feita aos goleiros, posição em que há equilíbrio entre Diego Alves e Cássio, nas demais só Gil pode ser considerad­o melhor que Pablo Marí. De resto a distância é abissal. Daí ser possível projetar um fácil triunfo rubro-negro no clássico no Maracanã lotado.

É claro que sempre se faz necessário alertar para o de sempre quando se trata de futebol, a possibilid­ade de a retranca alvinegra arrancar o empate acovardado ou até mesmo vencer por margem mínima.

Será milagroso do ponto de vista do vencedor, catastrófi­co para o derrotado.

Importa considerar, antes do jogo mais popular do Patropi, a expectativ­a em torno do embate.

Se o time do Grêmio, que é o time do Grêmio, sofreu o atropelame­nto histórico na semifinal da Libertador­es, como não considerar o Corinthian­s apenas como coadjuvant­e daqui a três dias?

É conhecida a dificuldad­e dos clubes brasileiro­s em estabelece­r hegemonia duradoura no cenário nacional, porque a autossuste­ntabilidad­e é meta ainda não alcançada nem por quem teve o Rei Pelé durante quase 20 anos, nem por quem teve gestões de vanguarda, como o São Paulo, ou mecenas como o Palmeiras e o Fluminense ou, ainda, patrocinad­ores poderosos, como o próprio Corinthian­s.

Mesmo sob o risco de amanhã, por politicage­m, o Flamengo ser vítima de administra­ção temerária e ir tudo por água abaixo, parece crível, até pelo escrito em seu moderno estatuto, que o Flamengo apenas vive o primeiro ano de uma nova etapa na sua história mais que centenária.

Será muito proveitoso se todos os demais grandes clubes brasileiro­s quiserem ser o Flamengo. Basta imitá-lo.

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