Folha de S.Paulo

Luciano Huck

PT precisa entender que, se não falar à centro-esquerda, vai ter quem fale

- Celso Rocha de Barros Servidor federal, é doutor em sociologia pela Universida­de de Oxford (Inglaterra) | dom. Elio Gaspari, Janio de Freitas | seg. Celso Rocha de Barros | ter. Joel Pinheiro da Fonseca | qua. Elio Gaspari, Conrado Hübner Mendes | qui. Fe

Tanto Luciano Huck quanto Joaquim Barbosa teriam vencido a eleição presidenci­al de 2018 se tivesse concorrido sem o outro na disputa. Se tem algo que foi provado pela eleição de Bolsonaro é que o eleitorado queria um outsider, e, se valeu Bolsonaro, teria valido qualquer um. Barbosa e Huck eram incomparav­elmente superiores a Bolsonaro. Todo mundo é.

Aqui é bom contar uma parte da história de 2018 que é pelo menos tão importante quanto o antipetism­o. A rejeição ao PT foi importante no segundo turno, mas lembrem-se: Bolsonaro quase venceu no primeiro, quando havia uma ampla gama de candidatos disponívei­s. Os analistas próximos ao PSDB precisam explicar por que Bolsonaro, e não Alckmin, Meirelles, Amoêdo ou Dias, se beneficiou do antipetism­o.

O governo Temer foi uma tentativa de recomposiç­ão do sistema político diante dos ataques da Lava Jato. Toda a direita moderada apoiou isso.

Para barrar os outsiders, os grandes partidos mudaram a regra de financiame­nto eleitoral, dificultan­do as pequenas candidatur­as. A centro-direita apostou tudo na hipótese de que 2018 seria uma eleição normal, em que estrutura partidária, dinheiro de campanha e tempo de TV seriam decisivos. Quando essa aposta se consolidou, a candidatur­a de Huck perdeu espaço.

Havia vozes dissidente­s. O governador tucano do Espírito Santo, Paulo Hartung, dizia que Alckmin seria um ótimo presidente, mas não era o que o eleitorado de 2018 queria. Hartung foi um dos principais defensores da candidatur­a Huck. Tanto FHC quanto Arminio Fraga tiveram, em algum momento, entusiasmo pela ideia.

Hartung e os defensores de Huck perderam a disputa interna. É tentador comparar esse erro tucano com o erro petista de não acompanhar Haddad em direção ao centro no segundo turno.

Huck será candidato em 2022. Não sabemos se terá sucesso. Talvez o eleitorado queira algo muito diferente do que quis em 2018, quando o apresentad­or teria sido eleito. Talvez não.

Temos uma discussão em curso sobre a viabilidad­e de uma candidatur­a de centro. Há muito ruído nessa conversa, porque Bolsonaro voltou a desmoraliz­ar o termo “direita”, que havia sido reabilitad­o nos anos finais dos governos petistas. João Doria, por exemplo, quer conquistar eleitores ao centro, mas busca sobretudo retomar o controle da direita pelos (comparativ­amente) moderados.

O perfil da candidatur­a de Huck deve ter várias semelhança­s com o da candidatur­a Doria. Mas já é possível notar uma diferença: ao contrário do governador de São Paulo,

que se elegeu em uma onda de antipetism­o, Huck também quer eleitores da centroesqu­erda.

Seus discursos sobre o combate à desigualda­de e a importânci­a de políticas sociais podem conquistar eleitores moderados do PT. Afinal, tem gente no partido que parece disposta a abdicar dos votos da centro-esquerda.

Seria bom se o eleitorado extucano voltasse a se organizar sob a liderança de um moderado, mas confesso que meu interesse na candidatur­a Huck é outro: o PT precisa entender que, se ele não quiser falar à centro-esquerda, vai ter gente falando. Pode ser Huck por um lado, ou o PSB pelo outro, pode ser Ciro, pode ser alguma outra coisa. Mas o espaço que venceu quatro eleições presidenci­ais seguidas não vai ficar vazio.

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