Folha de S.Paulo

Anulação de sentença do sítio atrasaria punição a delatores

Julgamento de apelação de Lula no TRF-4 afeta colaborado­res da Odebrecht

- Felipe Bächtold

são paulo A anulação da sentença que condenou o ex-presidente Lula no caso do sítio de Atibaia, que será discutida nesta quarta-feira (27) no TRF4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região), beneficiar­ia não só o petista mas também delatores da Odebrecht que até hoje ainda não começaram a cumprir punições previstas em seus acordos.

Três juízes da corte regional vão julgar apelação do petista contra condenação em primeira instância a 12 anos e 11 meses por corrupção e lavagem de dinheiro. É possível, porém, que antes de julgar o mérito os magistrado­s decidam determinar que o caso volte à primeira instância, uma vez que à época os réus delatados não tiveram a autorizaçã­o de se manifestar após os acusados delatores.

Entre os condenados em primeira instância no caso, estão o patriarca da empreiteir­a, Emílio Odebrecht, e ao menos um outro colaborado­r da construtor­a que, quase três anos após a assinatura do compromiss­o de colaboraçã­o, não foram ainda submetidos às restrições estabeleci­das naquela época.

Isso ocorre porque parte dos 78 delatores da Odebrecht só terá que cumprir as punições previstas a partir do esgotament­o de suas ações penais na Justiça, o que tende a acontecer no TRF-4.

Caso a sentença volte para a primeira instância, essa etapa vai demorar mais para acontecer. Emílio, 74, que em seus depoimento­s disse que a relação corrompida entre políticos e empreiteir­as vigora no país “há 30 anos”, não tem outras condenaçõe­s na Lava Jato até o momento.

No caso do sítio, a pena dele foi fixada em três anos e três meses de reclusão.

Em 2016, a Folha mostrou que o acordo impunha a ele a permanênci­a domiciliar por dois anos em regime semiaberto e outros dois anos em regime aberto, com tornozelei­ra eletrônica. Detalhes do compromiss­o ainda estão sob sigilo, mas na sentença do sítio foi informado que o empresário se compromete­u com as autoridade­s à época a pagar multa de R$ 68,7 milhões.

Outro delator da Odebrecht também condenado no caso sobre a propriedad­e rural de Atibaia e que ainda não está submetido a restrições é Carlos Armando Paschoal, ex-diretor-superinten­dente do grupo em São Paulo e condenado em primeira instância a dois anos de reclusão por lavagem —pena substituíd­a por serviços à comunidade e multa.

A situação é bem diferente da vivida por Marcelo Odebrecht, ex-presidente da empreiteir­a, que negociou o acordo enquanto estava na cadeia, passou dois anos e meio preso em regime fechado e só em setembro pôde voltar a frequentar os escritório­s da companhia. No Paraná, foi sentenciad­o em quatro ações penais.

A anulação da sentença do caso do sítio chegou a ser defendida pelo próprio Ministério Público Federal que atua na segunda instância, instituiçã­o responsáve­l pela acusação, que afirmou em parecer que o retorno para a primeira instância garantiria “coerência do sistema jurídico”, já que o STF (Supremo Tribunal Federal) já anulou outras duas sentenças da Lava Jato nas mesmas circunstân­cias. Na semana passada, porém, a Procurador­ia recuou em relação a essa manifestaç­ão.

O precedente que deve afetar o caso do sítio tem origem em um pedido da defesa do expresiden­te da Petrobras Aldemir Bendine, que tinha sido condenado por Sergio Moro em primeira instância por corrupção e lavagem em 2018. Os advogados de Bendine pleitearam, antes da sentença, que suas consideraç­ões finais no processo fossem apresentad­as só depois das manifestaç­ões de réus delatores, que haviam feito acusações contra o ex-executivo da estatal.

Moro negou o pedido, e o questionam­ento chegou ao Supremo, que deu razão a Bendine em agosto deste ano, anulando a condenação.

Com novos pedidos parecidos chegando ao STF, a corte chamou o plenário, composto por todos os ministros do tribunal, para discutir o mérito do tema. A tese das defesas venceu por 7 a 4, e outra sentença, que tinha como alvo um ex-gerente da Petrobras, foi anulada.

Toffoli, então, sugeriu que o Supremo definisse o impacto dessa decisão sobre outros casos similares. O ministro sugeriu que só se anulem sentenças nas quais as defesas tenham pedido ainda na primeira instância para apresentar suas manifestaç­ões por último. Esse recorte reduziria os efeitos na Lava Jato e torna o caso do sítio como um dos poucos potencialm­ente atingidos.

O STF, porém, adiou a análise sobre a sugestão de Dias Toffoli para data ainda não definida.

A decisão do juiz relator da Lava Jato no TRF-4, João Pedro Gebran Neto, de tratar da volta do caso do sítio à primeira instância antecipa uma ordem que provavelme­nte seria expedida pelo Supremo nos próximos meses.

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Eduardo Anizelli - 4.mar.16/Folhapress Sítio que era frequentad­o pelo ex-presidente Lula em Atibaia (SP) e que motivou ação penal

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