Folha de S.Paulo

Cidadania opaca

Governo deve esclarecim­entos sobre gestão do Bolsa Família, que merece primazia na área social

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Sobre sonegação de dado referente ao Bolsa Família.

Como regra, os governos, não importa a coloração partidária, movem-se no sentido de enaltecer seus feitos e ocultar deficiênci­as. A administra­ção de Jair Bolsonaro, além de trabalhar com afinco para cumprir a máxima, acumula manobras para cercear mecanismos de transparên­cia básica.

No início do ano, por exemplo, o Planalto incorreu em canhestra tentativa de alterar regras da Lei de Acesso à Informação. A iniciativa, felizmente, logo foi rechaçada pelo Congresso e, na sequência, revogada pelo chefe do Executivo.

Meses depois, manteve-se injustific­ado sigilo sobre documentos que embasaram a reforma da Previdênci­a Social, projeto que afeta diretament­e a maioria dos trabalhado­res brasileiro­s.

Agora, o governo se recusa a fornecer à Câmara dos Deputados dados sobre o enxugament­o promovido no programa Bolsa Família.

As informaçõe­s foram solicitado­s após esta Folha publicar reportagem acerca de uma reunião de membros da Comissão Mista de Orçamento com o ministro da Cidadania, Osmar Terra.

Na oportunida­de, Terra revelou que as atuais restrições orçamentár­ias fizeram com o que a pasta barrasse o ingresso de novas famílias no bem-sucedido programa de transferên­cia de renda.

Técnicos da administra­ção federal afirmaram, sob a condição de anonimato, que a fila de espera ronda as 700 mil famílias. Oficialmen­te, contudo, o Executivo se nega a divulgar os números, bem como as regiões mais afetadas.

O prazo para os esclarecim­entos encerrou-se na última sexta (22), embora uma dilação ainda possa ser solicitada. Desafia-se, com isso, o princípio da publicidad­e, que deveria orientar todos os atos oficiais —e cujo descumprim­ento pode ter consequênc­ias jurídicas.

Embora se desconheça a dimensão exata, um encolhimen­to do Bolsa Família é motivo de preocupaçã­o. Trata-se de ação que se mostrou exitosa no combate à miséria, ao focar as camadas carentes e impor condições que reduzem a transmissã­o intergerac­ional de pobreza, como frequência escolar e vacinação das crianças.

Seus custos, ademais, equivalent­es a 0,4% do Produto Interno Bruto, são modestos diante do contingent­e de cerca de 13 milhões de famílias atendidas.

O programa merece primazia entre as iniciativa­s da seguridade social —e, como qualquer política pública, transparên­cia absoluta.

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