Campanha de Bolsonaro não declarou à Justiça 11 milhões de santinhos
O Rio de Janeiro, reduto político dos Bolsonaros, foi o responsável pela maior fatia, R$ 356 mil.
As notas fiscais mostram que três gráficas produziram para o PSL do Rio 9,8 milhões de santinhos, panfletos, adesivos e outros materiais que pediam votos conjuntamente para Bolsonaro, seu filho Flávio, eleito senador, e outros candidatos do PSL.
A prestação de contas da campanha do presidente não registra o recebimento dessas doações —os únicos diretórios dos quais Bolsonaro declara ter recebido material de campanha foram os de São Paulo e da Bahia.
Em São Paulo, a Gráfica Arte Visão Van Gogh cobrou R$ 10 mil para produzir 2.222 adesivos para a campanha de Bolsonaro e de seu filho Eduardo, candidato eleito à Câmara dos Deputados.
Nesse caso, a campanha de Bolsonaro declarou ter recebido do diretório paulista do PSL doação estimada em R$ 5.000 relativa à produção de metade desses adesivos. A campanha de Eduardo Bolsonaro declarou ter recebido doação estimada em R$ 5.000 relativa à outra metade.
A resolução de 2017 do TSE estabelece que cabe a quem arcou com o gasto comprovar a produção dos materiais, mas frisa que isso “não afasta a obrigatoriedade de serem registrados na prestação de contas dos doadores e na de seus beneficiários os valores das operações”.
Procurados, nem o Palácio do Planalto nem os cinco diretórios estaduais do PSL quiseram se manifestar.
Jair Bolsonaro e o PSL entraram nos últimos meses em uma crise, alastrada na esteira das denúncias sobre o esquema revelado pela Folha de candidaturas de laranjas nas eleições de 2018.
Diante do racha com a ala ligada ao presidente nacional da sigla, o deputado federal Luciano Bivar (PE), Bolsonaro anunciou neste mês sua saída do PSL. Na última quinta-feira (21), o presidente oficializou a criação de um novo partido, batizado de Aliança pelo Brasil.
A Folha consultou três especialistas na área eleitoral e os Tribunais Regionais Eleitorais dos cinco estados citados nesta reportagem, apresentando um caso hipotético similar ao do PSL.
“A ausência de declaração dos valores recebidos como doação estimável em dinheiro consubstancia irregularidade grave. No que tange ao partido, também ele deveria ter declarado a realização da doação estimável em dinheiro”, afirmou o advogado eleitoral Rafael Araripe Carneiros, o único que concordou em ter a sua posição publicada.
“Irregularidade como essa pode impactar no julgamento das contas de campanha, podendo levar até a desaprovação das contas, com a exigência de devolução dos valores irregularmente recebidos”, completou.
Em relação aos TREs, só o de Minas Gerais respondeu às perguntas, afirmando, no caso hipotético, que os gastos efetuados por partidos em benefício de candidato constituem doações estimáveis em dinheiro e que “tanto o partido quanto o candidato devem registrar nas respectivas prestações de contas as doações estimáveis efetuadas e recebidas”.
Caso não o façam, “há omissão de doação realizada pelo partido aos candidatos e há omissão de doação estimada recebida pelos candidatos”. Não houve resposta dos demais tribunais.
Reportagens da Folha mostraram, antes mesmo do resultado da eleição, que a campanha de Bolsonaro havia omitido uma série de informações na prestação de contas parcial que todos os candidatos têm que apresentar na primeira quinzena de setembro.
Além da prestação das contas de seus gastos eleitorais, os partidos são obrigados anualmente a apresentar declarações de seus gastos ordinários, ou seja, aqueles não diretamente vinculados a disputas eleitorais.
Nesse segundo caso, reportagem do site Vortex mostrou que o PSL bancou, sem declarar à Justiça Eleitoral como despesas de campanha, pelo menos R$ 915 mil de gastos com Bolsonaro na corrida presidencial.
Esse dinheiro, de acordo com a reportagem, foi repassado a cinco empresas que relataram ter trabalhado para a campanha dele.
A ausência de declaração dos valores recebidos como doação estimável em dinheiro consubstancia irregularidade grave. No que tange ao partido, também ele deveria ter declarado a realização da doação estimável em dinheiro
Rafael Araripe Carneiro
advogado eleitoral